terça-feira, novembro 29, 2005

A Idade dos Porquês

A brasileira Adriana Calcanhoto tem no seu reportório um poema intitulado “oito anos”. A canção é muito engraçada e os versos retratam bem a curiosidade própria dos miúdos dessa idade.

Quem tem ou já teve crianças nessas idades, sabe que eles tudo questionam e a toda a hora, e sabe bem como é difícil dar resposta à maioria das perguntas, pelo menos respostas coerentes e que façam algum sentido.

Por vezes, os miúdos lembram-se de perguntar as coisas mais estranhas (ou mais simples), deixando os adultos embaraçados, quantas vezes confusos, e porque se calhar nunca tinham pensado naquelas questões, acabam por responder com um “Não sei”, quando muito com um “Sei lá”.

Vejam só, e digam-me se tenho razão:

“Porquê você é Flamengo e meu pai Botafogo?
O que significa impávido colosso?
Porquê os ossos doem enquanto a gente dorme?
Porquê os dentes caem?
Por onde os filhos saem?

Porquê os dedos murcham, quando estou no banho?
Porquê as ruas enchem, quando está chovendo?
Quanto é mil trilhões vezes infinito?
Quem é Jesus Cristo?
Onde estão meus primos?

Porquê o fogo queima?
Porquê a lua é branca?
Porquê a terra roda?
Porquê deitar agora?
Porquê as cobras matam?
Porquê o vidro embassa?
Porquê você se pinta?
Porquê o tempo passa?

Porque é que a gente espirra?
Porque é que as unhas crescem?
Porque é que o sangue corre?
Porque é que a gente morre?

Do que é feita a nuvem?
Do que é feita a neve?
Como é que se escreve reveillon”

Quando ouço a Adriana cantar imagino as crianças a fazer perguntas. E, tal como elas, ponho-me a pensar “Porque é que as unhas crescem?” E, tal como elas, também me dá vontade de perguntar:

“Porque é tão grande o fosso entre ricos e pobres?
Porque é que, às vezes, o amor dói?
Porque é que não valorizamos o que temos?
Porque é que a gente mal nasce começa a morrer?
Porque é que depois de chegar, temos que partir?
Porque é que os jogadores de futebol cospem tanto?
Porquê não dizemos amo a quem gostamos?
Porquê o tempo passa?”

domingo, novembro 27, 2005

Licenciados e desemprego

Na última semana os jornais noticiaram que o desemprego em Portugal atingiu em Setembro último, o nível mais alto desde 1998, chegando aos 7,7% e afectando qualquer coisa como 430 mil portugueses.
Segundo alguns especialistas, o aumento do desemprego era inevitável. Talvez pela conjuntura internacional, talvez por culpa da globalização, talvez pela incapacidade dos sucessivos governos em desenhar planos de desenvolvimento que pudessem inverter a situação. E será que, também, por falta de formação?
Acredito que todas essas hipóteses tenham contribuído para o descalabro que se afigura muito preocupante mas, relativamente à educação, é bom dizer que Portugal tem sido dos países onde mais se investe na educação em termos de PIB, nomeadamente no ensino superior. Então, se é gasto tanto dinheiro na educação e se, cada vez mais, saem tantos licenciados das universidades, porque é que se continua a falar tanto na falta de preparação dos portugueses e porque é que uma boa percentagem desses desempregados é ocupada exactamente por licenciados?

Bem, eu tenho uma teoria sobre o assunto. É que, para mim, no actual sistema educativo, ser licenciado não representa um atestado de competência, mas uma mera credencial em como um indivíduo frequentou o ensino durante uns quantos anos e cumpriu certas formalidades legais. Ou, como dizia o Professor Adriano Moreira nas suas aulas: “a licenciatura é apenas a licença para aprender”.

Na verdade, os jovens de hoje, do ponto de vista da sua preparação académica, são claramente mais credenciados do que eram os jovens de gerações anteriores. No entanto, regista-se uma grande discrepância entre as competências transmitidas pelas escolas e universidades e aquilo que é exigido pelas empresas. Isto porque o sistema não consegue ajustar os programas escolares às exigências do mercado de trabalho e da sociedade.

Em Portugal o Estado não impõe uma "educação obrigatória" mas uma escolaridade obrigatória, que é uma coisa bem diferente.
O que o Estado certifica é que um jovem cumpriu um determinado número de anos de escolaridade e não que ele possui um certo número de competências relevantes. Este sistema não produz competências, produz formalidades. E, claro está, que os empregadores não estão mesmo nada interessados em pagar um salário a quem provou ter frequentado a escola durante uns anos. O que os empregadores procuram são competências, ou seja, dito de outro modo, querem quem esteja preparado para trabalhar.

Da mesma forma no ensino superior, aquilo que o Estado atesta a um jovem recém-licenciado é que ele possui uma licenciatura, isto é, que ele cumpriu um certo número de formalidades, tais como ter uma escolaridade de quatro ou cinco anos numa universidade oficialmente reconhecida, durante umas tantas semanas por ano, com tantas horas por semana, que frequentou um certo programa de cadeiras numa certa área do saber.

Quanto aos programas e quanto às cadeiras neles incluídos, muito haveria certamente para dizer e, se calhar, para dizer mal. Ou, pelo menos, para colocar muitas dúvidas quanto ao interesse real de algumas das matérias que fazem parte dos programas dos cursos do ensino superior.
Mas, enfim, estamos a falar dos cursos que temos e, o certo é que todos esses programas e cadeiras são aprovados por um Ministério, dito da Educação, e avalizados por uns senhores professores, que nunca serão avaliados pelo seu "julgamento", ainda que possa não ter sido o melhor. Afinal, professores/burocratas que possuem uma visão tremendamente estática da vida e da sociedade, do mundo real, enfim.

Resumindo, ter uma licenciatura não é sinónimo de ter competência, por muito que isto custe a muitos licenciados. Ter licenciatura, do meu ponto de vista, para além do cartão de visita que isso representa, é possuir uma ferramenta que poderá proporcionar uma melhor compreensão e um melhor aproveitamento das tarefas que o licenciado vai ter que executar no futuro.
Daí que, muitos dos licenciados, só venham a ser competentes depois de algum tempo de trabalho. Não, apenas, por terem um curso, mas porque - com a ajuda desse curso e com as suas capacidades próprias - se tornaram realmente competentes.

E o que é que pensarão os empregadores? Que lhes basta terem um candidato com um curso superior, uma ou duas pós-graduações, um mestrado, talvez até um doutoramento? Afinal, isso prova o quê? Que o candidato ao emprego é muito bom e que vai ser uma mais valia para a empresa? Não, para os empregadores o que todas aquelas certificações provam não é que o candidato sabe trabalhar de facto, mas que, tão simplesmente, teve jeito para estudar.

sexta-feira, novembro 25, 2005

Bocas …

1 -
Título de primeira página do Jornal de Notícias de há uns dias
TGV de Lisboa a Madrid e Porto com atraso de quatro anos
Isto só em Portugal! Como é possível que um comboio, ainda por cima de alta velocidade, se atrase tanto mesmo antes de ser construído?

2
Notícia de última hora
Um dos nossos deputados contraiu gripe das aves. De acordo com os procedimentos universalmente aceites, vai ter que se abater todo o bando!

quarta-feira, novembro 23, 2005

Manhã de Outono


A manhã de Outono estava soalheira e amena, muito embora o vento suave fizesse lembrar que o Inverno se aproximava. E, não fora o trânsito intenso que passava sem cessar, quase se podia dizer que aquela era uma bela manhã.
As árvores centenárias que ladeavam a rua comprida, iam-se despindo lentamente de folhas que caíam nos passeios, formando pequenos tufos verde/amarelados.

Enquanto contemplava aquela beleza bucólica, um varredor ia apanhando as folhas do chão e deitava-as no seu carrinho de lixo. Vagarosamente repetia os gestos que prometiam eternizar-se.

O varredor avançava ao longo da rua e as folhas continuavam a cair. E, uma a uma, voltavam a tecer tapetes na calçada.

É ingrato o trabalho dos varredores nesta época, não acham?

terça-feira, novembro 22, 2005

“Milagres”

Ainda mal tinha completado o texto publicado ontem, em que falava sobre o Banco Alimentar Contra a Fome de Lisboa e fui surpreendido por um artigo publicado no Expresso de sábado passado, intitulado “O Milagre das Peras”.

Já toda a gente ouviu falar no “Milagre das Rosas” ou no “Milagre da Multiplicação dos Pães” mas no “Milagre das Peras”, que milagre é esse que nunca ninguém ouviu falar?
Muito simplesmente o milagre de se poder transformar 275 toneladas de peras em vias de se estragarem, em compotas para serem distribuídas a famílias carenciadas pelo Banco Alimentar Contra a Fome de Lisboa (BACF).
A coisa parece fácil mas, todos sabemos, que não é tão simples assim. Eu diria mesmo que só a forte e determinada iniciativa da presidente do BACFL e da Federação dos Bancos Alimentares contra a Fome, Isabel Jonet, foi essencial para que o milagre acontecesse.
E a receita utilizada para se fazer esta compota “resumiu-se” a estes ingrediente: as peras foram cedidas pelo INGA, a DAI cedeu parte do açúcar, a Calimenta procedeu à transformação, a Sotancro ofereceu os frascos e a Luís Simões assegurou o transporte. Simples, não acham?
Donde, graças à iniciativa da Isabel Jonet e das diversas boas vontades referidas, desta milagrosa receita resultaram 188 mil frascos que encheram 95 paletes de compota.

E agora, uma vez apanhado o jeito, os milagres não vão ficar por aqui. Há outras ideias do género que já estão a andar, nomeadamente o “milagre do tomate” e o “milagre do peixe”.
No primeiro caso, o BACF conta com a ajuda da Compal (para a transformação) e da Tetra Park (para as embalagens) para transformar 120 toneladas de tomate fresco em 50 toneladas de polpa de tomate.
Quanto ao projecto do peixe, a Federação dos Bancos Alimentares contra a Fome juntamente com o BACF de Setúbal, com a colaboração da Doca Pesca e com a adesão entusiástica dos pescadores, vai congelar 3800 toneladas de peixe que iria ser “devolvido ao mar”. Com este peixe é possível alimentar 100 mil pessoas, com 200 gramas de peixe, todos os dias do ano.

Pois é, ficamos de rastos quando ouvimos falar na forma como se pode evitar o desperdício. E há tanto desperdício por aí.

De uma maneira geral os “milagres” não se questionam, é uma questão de fé.

Mas há milagres que têm que ser ajudados ... perceberam? Volto a lembrar que se realiza já no próximo fim-de-semana, dias 26 e 27 de Novembro a recolha de alimentos do Banco Alimentar Contra a Fome de Lisboa. Colaborem.

segunda-feira, novembro 21, 2005

Dar sim, mas …

Todos nós somos abordados constantemente por alegados membros de “associações de protecção a qualquer coisa”, de “ligas nacionais e humanitárias de …”, de “bombeiros voluntários de…”, de “organizações a favor de…”, enfim, das mais diversas áreas de assistência e solidariedade para pedir a nossa ajuda para uma determinada causa, seja em dinheiro, em géneros ou na compra de um qualquer objecto ou coisa.
E, muito embora, muitas dessas instituições sejam reconhecidamente da mais absoluta confiança, o facto é que, de forma quase inconsciente, muitas vezes somos levados a pensar se o nosso contributo se destina efectivamente à organização que o solicita ou se, pelo contrário, vai reverter para outros fins não identificados, nomeadamente para o proveito de trapaceiros que se sustentam à custa da boa fé das pessoas.
Não duvido que, na maioria dos casos, as razões invocadas sejam as mais justas e as mais credíveis mas, o assalto continuado ao comum do cidadão, começa a ser um exagero.
Ainda há dias num semáforo, uma Corporação de Bombeiros Voluntários não sei das quantas (ainda por cima de uma terra que fica a mais de 50 km da capital) me pediu para os ajudar. Depois, quando cheguei ao supermercado, pediram-me para comprar um boneco a favor de uma instituição de assistência social. Ao sair, junto ao parque de estacionamento, pediram-me uma contribuição para a luta contra já não sei o quê.
Tudo isto, quase no mesmo sítio e num curtíssimo espaço de tempo.
Naquele momento, juro que cheguei a pensar que se a pedinchice continuasse àquele ritmo, não me restaria outra hipótese do que montar a minha própria banca para promover uma recolha de fundos a favor de … mim.
Mas a verdadeira questão é esta. É que, para além do facto dos portugueses não terem – ainda que o quisessem – a possibilidade de contribuir para todas as causas que consideram justas, existe um outro problema. Na maioria dos casos não se conhecem essas instituições nem fazemos ideia da sua obra.

Essa questão não se coloca relativamente à instituição de que vos vou falar hoje – O Banco Alimentar Contra a Fome de Lisboa. Uma instituição reconhecida como “Instituição de Superior Interesse Social”.
Trata-se de uma organização bem estruturada e da máxima confiança, que luta contra o desperdício alimentar para minorar as carências alimentares de pessoas comprovadamente necessitadas.
Com a colaboração de uma lista numerosa de empresas doadoras de produtos e de serviços, com a generosidade de muitos particulares e com a dedicação de um grupo de voluntários e funcionários, o Banco Alimentar Contra a Fome de Lisboa (BACF) recebe os alimentos dos doadores e distribui-os às Instituições Beneficiárias.
E para que tenham uma ideia da dimensão da acção do BACF de Lisboa, referirei que em 2004 foram recolhidos 6.750.249.71 de quilos de produtos, os quais foram distribuídos por 258 Instituições, envolvendo um total de 54.210 pessoas assistidas. Tudo isto com instituições que mantêm um acordo com o BACF.
Relativamente às instituições que ainda se encontram em lista de espera, o BACF não as esqueceu e, mesmo a essas, entregou 309 toneladas de alimentos. É obra!
Mas para responder àquela dúvida que se coloca, tantas vezes, a quem dá - se os alimentos vão mesmo parar às pessoas que precisam - direi o seguinte:
O BACF acompanha em permanência as diversas instituições de solidariedade social com três objectivos principais:
- assegurar que os produtos sejam efectivamente entregues a quem deles necessita;
- evitar os desperdícios;
- e, naturalmente, inviabilizar as utilizações indevidas.
Deste modo o BACF recebe os alimentos dos doadores, distribui-os e assegura-se que eles chegam ao seu verdadeiro destino, ou seja, às pessoas carenciadas.
E, se alguma vez, se detecta algum procedimento inadequado por parte de alguém de qualquer Instituição, o BACF suspende imediatamente o fornecimento de alimentos.
Por tudo isto, o BACF é uma organização que merece toda a nossa confiança.

Porém, o Banco Alimentar Contra a Fome de Lisboa só pode dar aquilo que recebe. E recebe durante todo o ano das empresas doadoras a maior parte dos alimentos que redistribui, quer ao nível dos chamados produtos frescos, quer dos não perecíveis.
A restante ajuda chega através das doações efectuadas pelos particulares – por nós consumidores – nas duas recolhas em Abril e em Novembro de cada ano – efectuadas em diversos supermercados e hipermercados da zona de Lisboa.
E é muito reconfortante constatar que, nestas recolhas anuais, as pessoas, apesar das dificuldades sentidas, estão de ano para ano mais participativas e mais solidárias. Sente-se que existe a consciência de que “Há quem viva muito pior do que nós”

Dito isto, quero convidar-vos a participar na próxima recolha de alimentos que se realizará nos próximos dias 26 e 27 de Novembro – portanto, já no próximo fim-de-semana.
Vamos estar juntos por uma boa causa. Tenho a certeza que se vão sentir muito mais felizes por estarem envolvidos neste grande movimento de ajudar a quem necessita mais.

domingo, novembro 20, 2005

As ruas do nosso Estado (ou estado das nossas ruas)

Com excepção do fatídico momento em que um dos pneus do nosso carro cai redondamente num buraco, já se deram bem conta do estado miserável em que se encontram os pavimentos da generalidade das nossas ruas?

São ruas cheias de buracos e com falta de alcatrão. São ruas com rasgões profundos provocados por obras diversas, que as atravessam em toda a sua largura e que, ainda por cima, estão todos muito mal remendados. São ruas com alcatrão a transbordar sobre os passeios ou, não caso raro, com os lancis demasiados altos e sobranceiros ao alcatrão. São ruas feitas de paralelepípedos, a maior parte das vezes impróprias para a circulação automóvel.
São, enfim, as ruas onde nunca encontramos a conjugação perfeita, a harmonia desejável entre os pavimentos e as diversas caixas de esgotos, de electricidade, dos telefones ou do que quer que seja. Ou as caixas estão mais altas do que os pavimentos ou estes estão acima das caixas. Nunca quem efectua estes trabalhos, consegue colocar os dois ao memo plano.

E quem é que são os verdadeiros prejudicados com esta situação? Para já, os próprios carros que ficam cheios de ruídos, com direcções desalinhadas, que ficam com os tampões amolgados, ou sem eles, que batem após os despistes provocados por alguns buracos mais manhosos. Depois, são prejudicados os proprietários dos carros que têm que pagar chorudas contas das oficinas.

É que, cá pelo burgo, esventrar as ruas para os mais diversos trabalhos é um acto rotineiro. O que já é raro, é ver fechar as mesmas ruas duma forma correcta, ou seja, proceder à sua repavimentação e não, tão-somente remendá-las, como, isso sim, parece ser rotineiro.

Mas a rapaziada já se habituou de tal forma a este estado de coisas que, no dia a dia, limitamo-nos a resmungar e pronto, no fundo já não damos muita importância ao assunto. E só reagimos quando, um dia (quase sempre de noite e com chuva) o nosso querido carrinho se lembra de cair redondamente num buraco.

quinta-feira, novembro 17, 2005

A Bandeira do Santana, uma vez mais

Sem que seja necessário tirar uma vírgula ao que escrevi em 19 de Setembro sobre a bandeira portuguesa, “plantada” por Santana Lopes no alto do Parque Eduardo VII, em Lisboa, terei forçosamente de acrescentar mais alguma coisa à história, que só agora veio a público, para a completar … por agora.

E esse aditamento tem a ver com a visita que um miúdo, o Tomás Carvalho, de nove anos, efectuou a Madrid com os pais e com a forma com que ele ficou impressionado perante a grandeza da bandeira de Espanha, erguida na Plaza Colón.
No regresso, decidiu escrever uma carta ao Presidente da República a sugerir que fosse colocada uma bandeira de Portugal na cidade de Lisboa. Jorge Sampaio respondeu a Tomás Carvalho, agradecendo a sugestão e dizendo que ia pôr a ideia à consideração do Presidente da Câmara Municipal de Lisboa.

Bem, o resto já se sabe. O Presidente da Autarquia (não sei se foi Santana ou Carmona) concordou com a sugestão do Tomás e a nossa bandeira (inaugurada por Santana Lopes, aí não restam dúvidas) lá está, garbosa e a ondular ao vento.

quarta-feira, novembro 16, 2005

O seu a seu dono

Antes de mais, e para que não subsistam dúvidas quanto à isenção das minhas opiniões, devo dizer que não tenho uma simpatia por aí além pela Teresa Ricou, a conhecida “mulher-palhaço”.
E se me perguntarem porque razão é que eu não simpatizo com a senhora (que até nem conheço, a não ser dos meios de comunicação social), digo-vos com toda a franqueza que não faço a mínima ideia. Deve ser uma questão de pele ou, talvez, por ser uma mulher palhaço, que é uma actividade pela qual eu tenho o maior respeito mas com que nunca tive uma grande afinidade.
Declarado o princípio, há que dizer que trabalho é trabalho e conhaque é conhaque, pelo que, muito embora eu não simpatize com a Teresa Ricou não significa isso que não lhe reconheça um enorme mérito no trabalho que vem desenvolvendo há anos.
Na verdade, esse trabalho da mulher-palhaço não é muito conhecido. Ou antes, quando se ouve falar na Teresa Ricou e no seu Chapitô, pensa-se, de uma forma geral, numa escola de arte, vocacionada sobretudo para o circo, mas essa ideia representa uma parte muito limitada da actividade daquela escola.
A escola artística “O Chapitô” é, de facto, uma escola de arte mas é, também, um local que desenvolve há 25 anos em Lisboa, um trabalho de Acção Social destinado a integrar na sociedade as crianças e os jovens em situação de risco, através de actividades artísticas.
Mais, o Chapitô (onde já trabalham 120 pessoas) é uma associação privada sem fins lucrativos, criada em 1981, que presta um serviço cultural, social e educativo, ao cruzar o ensino e o divertimento com a intervenção social, através das artes e do espectáculo.
Também na área da Acção Social, o Chapitô está actualmente a construir uma residência aberta para jovens maiores de idade e que vivem em situações de risco.
Assim, e pelo conjunto da sua obra, a escola artística Chapitô, na pessoa da sua fundadora, recebeu recentemente no Parlamento Europeu em Bruxelas, o prémio europeu "Rosa de Prata", atribuído anualmente pela organização não-governamental Solidar, como reconhecimento pelo seu serviço na área social. Os prémios "Rosa de Prata", destinam-se a reconhecer pessoas ou organizações que trabalhem junto da sociedade civil para criar um mundo mais justo.

E justo, é exactamente a palavra adequada para definir o meu sentimento quanto à atribuição deste galardão. Em Portugal, onde o Estado não consegue dar resposta a muitas das carências mais básicas de tantas e tantas pessoas, o papel das instituições não-governamentais é absolutamente fundamental no apoio da população mais fragilizada. Instituições como é o caso do Chapitô.

Parabéns, pois, à Teresa Ricou pela sua obra em prol das crianças e dos jovens em situação de risco.
Pode-se simpatizar, ou não, com a Teresa mas temos que reconhecer que é uma mulher notável. O seu a seu dono.

terça-feira, novembro 15, 2005

Mais um caso …

No parque industrial português existe uma empresa pública chamada Urbindústria que tem apenas 3 funcionários e uma actividade muito pouco significativa. Tão pouco significativa que, segundo a lei, faz parte das empresas públicas classificadas no Tipo C.
Para além dos tais 3 empregados, a empresa tem 2 administradores. Como se trata de uma empresa do Tipo C, esses administradores deveriam ganhar, naturalmente, como administradores de empresas do Tipo C. E ganham? Não, eles ganham como administradores de empresas do Tipo A. O seu presidente (Hermínio Carreira) recebe 4.753 euros por mês, acrescido de 1.663 euros de despesas de representação e a vogal (Ivone Ferreira) recebe 4.204 euros mensais mais 1.621 euros de despesas de representação. Isto, para além de carros da empresa para uso pessoal, cartão de crédito sabe-se lá de quanto e PPR’s de valor não revelado.
Mas, para que a tão grande azáfama de gerir uma empresa com tantos empregados (3) e de uma tamanha actividade (muito reduzida) tivesse uma retribuição que, minimamente, fosse compensadora, o Estado decidiu atribuir um suplemento de 844 euros mensais aos dois elementos do Conselho de Administração da Urbindústria. E porquê? Porque eles são, também, administradores da Siderurgia Nacional – Empresa de Serviços SA (SNES), uma empresa que até 2001 esteve integrada no grupo das maiores empresas públicas mas que, agora, está ao mesmíssimo nível da Urbindústria. Isto é, quase não tem actividade.

Portanto, o Sr. Presidente e a Srª. Vogal por tão árdua tarefa de gerir uma empresa praticamente paralisada e que não suporta sequer os custos de funcionamento (tal como a SNES), recebem 14 vezes no ano pequenos salários mensais de 7.260 euros e 6.309 euros, respectivamente.

Ainda por cima, e apesar da Urbindústria ter terminado o ano de 2004 com um resultado negativo, cujo défice foi duas vezes superior ao do ano anterior, o Sr. Hermínio e a D. Ivone tiveram ainda direito a um prémio de gestão (que premiou os magníficos resultados obtidos, já se vê) de 15 mil euros e de 13.500 euros.

Mais um caso de empresas públicas em que o dinheiro dos contribuintes está a ser desbaratado. É demais!

segunda-feira, novembro 14, 2005

Ode ao futebol

Confesso que a minha “cultura futebolística” não passa lá muito pela leitura dos jornais desportivos. Raramente os leio. Por sorte, num dos últimos dias, ao folhear o Jornal Record, dei de caras, num espaço de opinião assinado pelo Jorge Gabriel, com um poema que tentava encontrar há anos.

Trata-se da “Ode ao futebol”, escrita pelo poeta Tossan e que, um dia, tive a felicidade de ouvir dizer - pelo próprio poeta - no saudoso programa televisivo “Zip-Zip”, do Carlos Cruz, Raul Solnado e Fialho Gouveia.

Acho o poema muito bem escrito e divertido. Por isso o transcrevo, esperando que os meus amigos – mesmo os que não gostam de futebol – o apreciem devidamente:

“Rectângulo verde, meio de sombra meio de sol
Vinte e dois em cuecas jogando futebol
Correndo, saltando, ziguezagueando ao som dum apito
Um homem magrito, também em cuecas
E mais dois carecas com uma bandeira
De cá para lá, de lá para cá
Bola ao centro, bola fora.
Fora o árbitro!
E a multidão, lá do peão
Gritava, berrava, gesticulava
E a bola coitada, rolava no verde
Rolava no pé, de cabeça em cabeça
A bola não perde, um minuto sequer
Zumbindo no ar como um besoiro,
Toda redonda, toda bonita
Vestida de coiro.
O árbitro corre, o árbitro apita
O público grita
Gooooolllllooooo!
Bola nas redes
Laranjadas, pirolitos,
Asneiras, palavrões
Damas frenéticas, gordas esqueléticas
esganiçadas aos gritos.
Todos à uma, todos ao um
Ao árbitro roubam o apito
Entra a guarda, entra a polícia
Os cavalos a correr, os senhores a esconder
Uma cabeça aqui, um pé acolá
Ancas, coxas, pernas, pé,
Cabeças no chão, cabeças de cavalo,
Cavalos sem cabeça, com os pés no ar
Fez-se em montão multidão.
E uma dama excitada, que era casada
Com um marinheiro distraído,
No meio da bancada que estava à cunha,
Tirou-lhe um olho, com a própria unha!
À unha, à unha!
Ânimos ao alto!
E no fim, perdeu-se o campeonato!”

domingo, novembro 13, 2005

Comemorações

Ao ver espalhados pela cidade, montanhas de cartazes a anunciar a celebração dos 250 anos do terramoto de Lisboa de 1755, confesso que fiquei um tanto ou quanto abazurdido.
O quê, pensei, esta gente quer fazer a celebração de um terramoto? Querem comemorar uma das maiores catástrofes que aconteceram em Lisboa? Esta gente está doida, ou quê? Se calhar, a seguir, até são capazes de quererem comemorar o incêndio do Chiado. Ou até as grandes cheias de Lisboa de 1969. Não, não acredito...

Mas antes que passasse a escrito a minha surpresa, quiçá a minha indignação, tratei de consultar o dicionário para saber quais os diversos significados da palavra comemoração.
E o dicionário “respondeu-me” que o termo pode querer dizer:

- acção de comemorar
- celebração
- recordação
- memória
- lembrança
- preceito em homenagem ou memória de pessoa ilustre ou de facto histórico
importante

Bom, fiquei muito mais descansado. Os promotores da celebração tinham empregue a palavra correctamente. Não pretendiam comemorar (no sentido de celebrar) o terramoto, pretendiam, antes, comemorar (lembrar) a tragédia.

Ainda assim, e para o meu gosto, preferiria que nos anúncios a um evento deste tipo, usassem a palavra memória (quando muito recordação) dos 250 anos do terramoto de Lisboa. Porque, meus amigos, para mim celebração é festa, é alegria.

Como se sabe, a língua portuguesa, para além de traiçoeira, é muito rica e as palavras a usar têm que ser aplicadas criteriosamente.

quinta-feira, novembro 10, 2005

Entre as canções e a política


Nada melhor para uma pessoa que regressa ao país, depois de uns dias de férias lá por fora, do que ler num jornal que uma entrevista de uma conhecida cantora pop (Shakira) dada a um canal de televisão cá do burgo, teve audiências muito superiores à de uma outra entrevista dada – à mesma hora - por um dos candidatos à Presidência da República (Mário Soares) a um canal de televisão concorrente. Nada menos de 32,8% contra 22,9% de audiência média.

Desculpem lá, mas acham isto normal? Eu sei que todos nós estamos um bocado fartos dos políticos e das “tretas” que na maioria das vezes nos tentam impingir. Mas será que os portugueses já se desinteressaram definitivamente da política e preferem ouvir meia dúzia de coisas ditas por uma cantora (por melhor e mais interessante que ela seja) a ouvir o que um dos candidatos à mais alta figura do Estado tem para dizer? Será que o nosso futuro nos interessa tão pouco?

Não sei, mas, no mínimo, acho preocupante …

quarta-feira, novembro 09, 2005

E o Rio de Janeiro continua lindo

Oi!

Tal como prometi, estou de volta depois de umas pequenas férias.

Como os meus amigos (inteligentes e perspicazes como sempre) já perceberam pelo título desta crónica e, também, pelo Oi! com que vos saudei, estive no Brasil, mais propriamente no Rio de Janeiro.
Desta vez num Rio de Janeiro diferente daquele que a maioria das pessoas, e eu próprio, normalmente imagina quando se pensa na Cidade Maravilhosa. De facto, quando se fala do Rio de Janeiro, pensa-se em sol, em calor e em mar. Pois o Rio que eu visitei agora não teve nada disso. Ao contrário, teve muita chuva, muita trovoada e um pouquinho de frio, sobretudo à noite.
Como me disse um motorista de táxi, “o Rio de Janeiro com chuva mais parece um cemitério”.
Bom, mas exageros à parte e mesmo tendo em conta as condições adversas do tempo, a verdade é que o Rio de Janeiro continua lindo. E se é certo que não houve um único dia em que o Cristo Redentor se mostrasse perfeitamente descoberto de nuvens, a ponto de nos deixar admirar as magníficas vistas que se costumam observar do alto do seu Corcovado, ainda assim, vale sempre a pena visitar o Rio. Oh, se vale …

É que a cidade maravilhosa não tem este título por acaso. É um lugar de rara beleza, de muitos rostos e muitos ritmos. O Rio de Janeiro é quase um estilo de vida, de gente alegre e de atractivos naturais e culturais. É a terra do futebol mas também da música. Da música de Tom Jobim, de Vinicius, de Caetano, de Betânia, de João Gilberto e de tantos outros. Da música que está presente no andar insinuante das mulheres e que está patente na forma e no jeitinho de falar dos seus habitantes.

Cidade Maravilhosa, cheia de encantos mil …”, os versos iniciais da conhecidíssima canção de André Filho, convidam a conhecer o Pão de Açúcar, o Corcovado, a Baía da Guanabara, o Maracanã, a Floresta da Tijuca, a Catedral, os Arcos de Santa Teresa e, naturalmente, todas as praias, cujos os nomes nos fazem sonhar com o doce sabor das ondas e das brisas, Copacabana, Ipanema e o Leblon. É, de facto obrigatório conhecer e admirar, sempre, estes lugares, com bom ou mau tempo.

Mas, tanta e tanta beleza não impede, porém, de constatar que o Rio é, também, uma cidade de profundas assimetrias, de tremenda exclusão social e de favelas de onde emana uma violência assustadora e incontrolável.

Pois apesar desses contrastes, das más condições de vida da maioria da população e da violência, sente-se que esta é a capital da beleza e da sensualidade. É o lugar onde encontramos um povo que nos contagia com a sua simpatia e que nos deixa a sensação, quando partimos, de termos já saudades e de quererermos voltar. E, ao partir, essa melancolia faz-nos trautear canções como “Menino do Rio” ou “Garota de Ipanema”.

Gosto de quem gosta deste céu, desse mar, dessa gente feliz…” como dizia a canção...

Mesmo com muita chuva e sem sol, o Rio de Janeiro continua lindo.