terça-feira, fevereiro 28, 2006

O “frango” e a gripe das aves

Confesso que não vi, na íntegra, o jogo entre o Benfica e o Porto mas, pelos bocadinhos que espreitei na televisão dos ricos, fiquei com a impressão que os jogadores estavam, todos eles, demasiado atormentados, o que não os deixou mostrar todo o seu potencial futebolístico, ou seja, não conseguiram “demonstrar o seu real valor”, como eles tanto gostam de dizer. E atormentados com o quê, perguntam os meus amigos?

Em primeiro lugar pareceu-me que ficaram aterrorizados com o público que enchia o estádio, ao perceber que toda aquela gente, todos aqueles especialistas de primeira água em matéria de futebol, que estavam sentados nas bancadas, gritavam desalmadamente “palhaços” e eles, atarefados como estavam em não comprometer as suas equipas, nunca conseguiram atinar se aqueles “elogios” lhes eram dirigidos porque tinham falhado um golo de baliza aberta, ou se aquela rapaziada foliona se estava apenas a divertir porque era domingo de Carnaval e, o melhor e o mais engraçado que pensaram fazer nesse momento, pelo menos antes de arrancar as cadeiras e atirá-las à policia ou para dentro do relvado, era o de berrar para a claque contrária que eles eram uns palhaços do caraças e uns grandessíssimos “filhos da p”.

Contudo, e sobretudo depois do golo do Benfica (tenho que confessar, uma vez mais, que sempre gostei do Baía, vá-se lá saber porquê…) pareceu-me que a preocupação dos jogadores já era de outra espécie. Vejam se seguem o meu raciocínio.

É verdade que o Robert atirou um balázio que mais parecia um míssil à baliza do Baía, mas, o que pareceu a toda a gente é que, para além do mérito do artista, aquele golo soube (por acaso a mim soube-me muito bem, mas isso é outra conversa) a frango.

E aí é que surge a minha teoria sobre a preocupação dos jogadores. Será que frango do Baía, já estava contaminado pela "gripe das aves" e, consequentemente, conseguiu abater sem apelo nem agravo o dragão? Ou será que os jogadores ficaram ainda mais apreensivos porque o frangalhão do Baía surgiu logo depois de se saber que foi confirmado um surto de gripe das aves em criações de frangos no Paquistão?

Por isso, quem me diz a mim que, a partir daí, os jogadores não foram levados a pensar que a expressão popular “cautelas e caldos de galinha nunca fizeram mal a ninguém” estava completamente em desuso, pelo menos no que diz respeito aos caldos de galinha?

E se assim foi, é compreensível que, estavando eles tão preocupados com as aves como estavam, como poderiam encarar o jogo de outro modo, que não fosse com todas as cautelas?

domingo, fevereiro 26, 2006

Buda

No meio de tanta polémica provocada pela publicação dos cartoons dinamarqueses, que tanto ofenderam os muçulmanos, em particular os muçulmanos extremistas, aposto que o título do texto de hoje vos poderá ter sugerido que eu iria falar exactamente sobre religiões e seus costumes. Mas não, enganaram-se redondamente, porque pelo menos por agora não vou tocar nesse assunto.

O que eu hoje pretendo comentar é uma outra coisa que, ao fim e ao cabo, se poderia confundir com a abordagem a uma outra religião, o budismo. Na verdade, vou falar de Buda mas não do budismo.

O termo Buda é um título e não um nome próprio. Significa “aquele que sabe” ou “aquele que despertou” e se aplica a alguém que atingiu um nível superior de entendimento sobre a plenitude da condição humana. O título foi dado a várias pessoas excepcionais, que atingiram um tal grau de elevação moral e espiritual que se transformaram em mestres de sabedoria. Porém, o mais fulgurante dos budas e também o real fundador do budismo, foi um ser que tinha uma personalidade excepcional, chamado Siddharta Gautama que nasceu na Índia por volta de 556 a.c.

E o tal nível superior de entendimento e a sua excepcionalidade, ficaram bem patentes em respostas e pensamentos geniais que, por isso mesmo, e de uma forma geral, atravessaram os tempos.

Eis um exemplo. Perguntaram uma vez a Buda:

“O que mais te surpreende na Humanidade?”
E ele respondeu “Os Homens”
E justificou: “Porque os Homens perdem a saúde para juntar dinheiro e depois perdem o dinheiro para recuperarem a saúde”.
Mas Buda continuou o seu pensamento, dizendo:
“Os Homens por pensarem tão ansiosamente no futuro, esquecem o presente de tal forma que acabam por não viver nem o presente nem o futuro”.
E concluiu desta forma:
“Os homens vivem como se nunca fossem morrer e morrem como se nunca tivessem vivido”.

São palavras extraordinariamente sábias que, no nosso dia a dia, nem sempre são recordadas. De facto, na correria que começámos e que não sabemos bem onde nos leva, esquecemo-nos tantas vezes daquilo que deveriam ser os nossos valores fundamentais. A começar pela Amizade e pelo Amor.

Por favor, não se esqueçam de VIVER!

quinta-feira, fevereiro 23, 2006

Assim, até eu chegava a horas …

Devo dizer que ao longo da minha vida profissional cheguei diversas vezes atrasado ao meu local de trabalho, mas, posso assegurar, que quando havia reuniões ou compromissos que envolvessem terceiros, só muito raramente isso aconteceu. Aliás, penso que poucas pessoas terão escapado a este “pecadilho”, sobretudo devido à complicação de trânsito que, todos sabemos, tem vindo a piorar significativamente nestes últimos anos.

Bom, mas dizia eu que algumas vezes cheguei tarde, não por que o quisesse, bem entendido, mas porque algum acontecimento me levou a isso. Sei lá, ter acordado um dia mais tarde, por exemplo, ou, se calhar ter que levar um dos meus filhos ao médico. O que nunca fiz, isso não, foi carregar no acelerador do meu carro e ir com o ponteiro até aos 200 à hora para ver se recuperava algum do atraso.


Eu não fiz, mas há por aí muito boa gente que o faz. Por exemplo o senhor deputado do PSD Ricardo Almeida, de 31 anos, já foi interceptado na auto-estrada a mais de 200 quilómetros por hora. Isto, claro, só por si, já é muito grave, principalmente em termos de segurança, mas o que eu considero ainda mais grave é que no longo historial de infracções graves e muito graves, o político já foi autuado quase duas dezenas de vezes mas, em quase todas, teve a “sorte” de ver os processos arquivados e nunca lhe foi retirada a carta de condução. Porque será? Estranho, não é?

O "deputado voador", como é conhecido nos meandros policiais, já foi autuado pela Brigada de Trânsito de Aveiro, Guarda, Leiria e Lisboa, pela PSP e pela GNR. Do seu "currículo" constam transgressões cometidas ao volante de, pelo menos, quatro carros distintos. Mas nenhum deles, por acaso, registado em seu próprio nome.

Quando interpelado pela comunicação social, Ricardo Almeida afirmou-se surpreendido com o "histórico" de infracções e disse não se lembrar de ter sido tantas vezes autuado. "Reconheço que, às vezes, ultrapasso os limites de velocidade, mas isso é porque sou um deputado que cumpre horários. Não sou como outros que não chegam a horas às reuniões".

É preciso descaramento. O senhor deputado da nação está nitidamente a gozar connosco e a fazer de nós parvos. Por isso, eu acho que não deveria ocupar por mais tempo o alto cargo para que foi eleito, pelo que, só lhe restará uma solução: DEMITA-SE!

Como se costuma dizer, os deputados devem dar o exemplo e cumprir as leis. Assim sendo, e com base na actuação do Sr. Almeida, todos nós passámos a conhecer a receita para não chegarmos atrasados. Não será sequer necessário que façamos o sacrifício de nos levantarmos mais cedo, basta que tenhamos uns carritos jeitosos e, prego a fundo. Num instante chegaremos a tempo aos nossos compromissos.

quarta-feira, fevereiro 22, 2006

Não me conformo



Agora que o Presidente Jorge Sampaio está de saída e que decidiu promover a frenética enxurrada de condecorações que está a levar a cabo e que contempla tudo o que mexe, desde aqueles que demonstraram verdadeiro valor e até deram alguma notoriedade ao país, até aos outros que provaram não ter qualquer préstimo especial e que se limitaram a fazer pela vidinha (e, nesse sentido, até o fizeram bem), confesso que ainda tive alguma esperança em vir a ser também agraciado com alguma condecoração.

Se durante os vinte anos anteriores em que Ramalho Eanes e Mário Soares foram presidentes, não esperei realmente que se lembrassem de mim porque, enfim, havia muitas personalidades que justamente mereciam muito mais do que eu ser reconhecidas, agora, que ao Presidente Sampaio restava muitíssima menos gente com qualidade, eu esperava – francamente – que tivesse chegado a minha vez.

Uma medalhita que fosse, uma comenda, porque não? Eu acho, aliás, que o título de “Comendador” não me assentaria nada mal, caramba!
“Como vai, senhor Comendador, que tenha um bom dia”.

E era uma condecoração merecida, eu acho. Nem que fosse por escrever textos tão interessantes neste blogue. Nem que fosse por eu ser simpatizante do Benfica, que ontem até ganhou ao actual campeão europeu.

Não me conformo, mas é que não me conformo mesmo …

terça-feira, fevereiro 21, 2006

A ética, de novo

Hoje volto a falar de ética. Pode parecer mania mas continuo a pensar que a ética é um dos valores que temos que preservar obrigatoriamente. Por certo, ninguém gostará de viver numa sociedade onde os valores fundamentais pouco ou nada contam e em que todos os meios são válidos para se atingirem os fins.
Apesar de constatar que, no dia a dia, muitas pessoas estão-se nas tintas para esses valores, tenho esperança (tenho mesmo a certeza) que o mesmo não acontece com os meus amigos.

E volto à ética porquê? Porque ontem, à entrada de um centro comercial, um funcionário de um banco abordou-me para tentar vender um cartão.

Como também pertenço ao ramo, recusei dizendo-lhe que, uma vez que pertencia à concorrência, não me parecia correcto. “E depois?”, perguntou. Respondi que não achava ético usar cartões de outra instituição bancária. Ao que ele argumentou, “Ora, ora, a ética é aquilo que nos dá mais lucro, a ética é usar o cartão que dá mais vantagens, o resto é conversa”.

Para mim o diálogo tinha terminado. O meu sorriso inicial desapareceu e voltei as costas ao meu interlocutor.

Mas o que mais me preocupa nestas atitudes é que as pessoas, individualmente ou por conta das empresas, pensam efectivamente que o que está em primeiro lugar é o dinheiro que se ganha, são os lucros próprios e imediatos. O resto é conversa, como disse o outro. Mas será que vale tudo?

Aquela demonstração de mercenarismo primário só não me deixou mais chocado porque, infelizmente, tenho-a encontrado por diversas vezes.

Encontrei, por exemplo, no relato que me fizeram de um administrador de uma companhia de seguros de saúde, numa reunião com todos os colaboradores da empresa, em que incitou os participantes a vender mais. “Muito mais”, disse, “temos que fazer muito mais dinheiro mesmo que seja à conta da saúde dos outros”. Ou seja, os outros que adoeçam à vontade, que o que interessa realmente é o negócio.

Encontrei, por exemplo, no meu grupo financeiro (e nos outros passa-se o mesmo) quando se começou a vender planos de poupança reforma a jovens que ainda frequentavam a universidade. Vender PPR’s a jovens que nem sequer tinham ainda começado a sua vida activa? Vendam-se cartões, vendam-se créditos à habitação, inventem-se produtos adequados aos mais novos mas, PPR’s?

O negócio antes de tudo, uma vez mais os fins a justificar os meios.

segunda-feira, fevereiro 20, 2006

Voltou a confiança

Quando até há pouco tempo, os políticos de todos os partidos, se fartavam de nos encher os ouvidos com tretas do género, que o que era preciso era que a economia crescesse e, para isso, para que ela voltasse a crescer, era necessário que a confiança regressasse, que os agentes económicos, de uma maneira geral e os investidores estrangeiros, em particular, voltassem a acreditar no nosso país, a maioria de nós encolhia os ombros e pensava “sim, está bem, isso já vocês disseram montanhas de vezes, e depois?” “Em que é que nós melhorámos nestes últimos anos, de que forma é que a economia nos veio beneficiar?” E voltávamos a encolher os ombros, uns de tristeza, outros (a maioria) de desencanto.

Para os mais entendidos, analisavam-se cenários e já se apostava quem seria o primeiro dos ministros a ser substituído, que seria certamente o da Economia, Manuel Pinho, e que ele iria deixar o governo, saindo pela porta mais pequena que houvesse lá no edifício.

Então não é que, de repente, qual mágico, o governo faz sair da cartola não um, mas vários pacotes de investimentos importantes, de muitos milhões de euros e que vão ter reflexos directos no aumento do emprego, nas exportações e na economia em geral?

É o caso da Microsoft que escolheu o nosso país para dar formação informática a cerca de 4500 desempregados do sector têxtil, de modo a que no final, o conhecimento e as certificações obtidas possam ser reconhecidas e aplicadas no mercado de trabalho.
Microsoft que também vai desenvolver um programa para técnicos de nível intermédio em empresas de tecnologias de informação, cujo finalidade é de que esses técnicos possam concluir os estudos a nível superior ou entrar no mercado de trabalho.

É o caso da Ikea que colocou em Portugal a sua base de produção para todo o mundo.

É o caso de um investimento que vem da Malásia, um projecto em hiper tecnologia.

Mas há mais, há outros investimentos importantes no turismo, nas energias renováveis, na petroquímica, na nova refinaria de Sines e no mega projecto turístico de Tróia.
Bem, mas de onde é que saiu tudo isto de repente?

Face a tanto projecto anunciado, parece haver agora condições para voltar a acreditar em dias melhores e para que a auto-estima nacional tenha, enfim, motivos para estar optimista. Parece que a confiança voltou. Vamos uma vez mais ter esperança e rezar para que não tenhamos mais a necessidade de voltar a encolher os ombros … agora, de desânimo.

quinta-feira, fevereiro 16, 2006

Gabriel Garcia Márquez

Podem nunca ter lido uma obra de Gabriel Garcia Márquez (o que é imperdoável) mas, decerto, todos ouviram já falar inúmeras vezes deste escritor colombiano, Prémio Nobel da Literatura em 1982, e da sua (talvez) mais célebre obra “Cem anos de Solidão”, onde consegue sintetizar e conjugar magistralmente a história, a natureza, os problemas sociais e políticos, a vida quotidiana, a morte, o amor, as forças sobrenaturais, o humor e o lirismo. Um grande romance de um grande autor.

Mas não é sobre a sua obra que me proponho, hoje, divagar.
Queria, antes, falar-vos de um texto que circulou pela Internet, supostamente a pretexto de uma hipotética “carta de despedida aos seus amigos” escrita por Márquez, que estaria a contas com um problema de saúde gravíssimo.

E o texto da carta é o seguinte:

“Se por um instante Deus se esquecesse de que sou uma marioneta de trapo e me oferecesse mais um pouco de vida, não diria tudo o que penso, mas pensaria tudo o que digo. Daria valor às coisas, não pelo que valem, mas pelo que significam. Dormiria pouco, sonharia mais, entendo que por cada minuto que fechamos os olhos, perdemos sessenta segundos de luz. Andaria quando os outros param, acordaria quando os outros dormem. Ouviria quando os outros falam, e como desfrutaria de um bom gelado de chocolate! Se Deus me oferecesse um pouco de vida, vestir-me-ia de forma simples, deixando a descoberto, não apenas o meu corpo, mas também a minha alma. Meu Deus, se eu tivesse um coração, escreveria o meu ódio sobre o gelo e esperava que nascesse o sol. Pintaria um sonho de Van Gogh sobre as estrelas e uma canção de Serrat seria a serenata que ofereceria à lua. Regaria as rosas com as minhas lágrimas para sentir a dor dos seus espinhos e o beijo encarnado das suas pétalas... Meu Deus, se eu tivesse um pouco de vida... Não deixaria passar um só dia sem dizer às pessoas de quem gosto, que gosto delas. Convenceria cada mulher ou homem que é o meu favorito e viveria apaixonado pelo amor. Aos homens provar-lhes-ia como estão equivocados ao pensar que deixam de se apaixonar quando envelhecem, sem saberem que envelhecem quando deixam de se apaixonar! A uma criança, dar-lhe-ia asas, mas teria que aprender a voar sozinha. Aos velhos, ensinar-lhes-ia que a morte não chega com a velhice, mas sim com o esquecimento. Tantas coisas aprendi com vocês, os homens... Aprendi que todo o mundo quer viver em cima da montanha, sem saber que a verdadeira felicidade está na forma de subir a encosta. Aprendi que quando um recém-nascido aperta com a sua pequena mão, pela primeira vez, o dedo do seu pai, o tem agarrado para sempre. Aprendi que um homem só tem direito a olhar outro de cima para baixo quando vai ajudá-lo a levantar-se. São tantas as coisas que pude aprender com vocês, mas não me hão-de servir realmente de muito, porque quando me guardarem dentro dessa maleta, infelizmente estarei a morrer...”

Amigos do escritor lamentam a repercussão desta “carta” e afirmam que Garcia Márquez não está em estado terminal e duvidam que a sua autoria seja do romancista. E justificam a sua posição, dizendo que “o primeiro motivo para negar que o texto fosse escrito por Márquez é a insistência na citação de Deus. Pelo que se sabe Garcia Márquez é um escritor de esquerda, simpatizante do marxismo, amigo de Fidel Castro, militante de causas sociais. Enfim, um humanista engajado, mas nem de longe o seu perfil lembra o de um religioso".

Sendo ou não verdade que a “carta” foi escrita por Gabriel Garcia Marquez, o facto é que, mesmo considerando alguma pieguice à mistura, há ali conceitos que me são muito caros. A começar por

“Não deixaria passar um só dia sem dizer às pessoas de quem gosto, que gosto delas”.

quarta-feira, fevereiro 15, 2006

O absurdo de quando as pessoas deixam de ter nome…

Logo a seguir à revolução de Abril de 1974, quando a maioria das empresas foram estatizadas, ouvia-se dizer com frequência que ninguém conhecia o patrão. Queria-se com isso dizer que o Estado era, de facto, o dono dessas empresas mas, como o Estado não tem rosto, ninguém sabia quem era o patrão, ninguém conseguia visualizar a sua cara. Claro que isto também servia como justificação para muitas outras coisas, mas adiante.

Actualmente como a questão da “falta dos rostos” já não nos preocupa tanto (o que não quer dizer que não estejamos muito preocupados com a falta de vergonha de algumas caras conhecidas), a nossa atenção está agora mais virada para os nomes das pessoas. Ou antes, para a falta desses nomes.

Isto porque é comum ouvir-se os empregados referirem-se ao Director de uma determinada empresa como “o Director” e raramente pronunciam o nome dessa pessoa. Fala-se antes no ”Director” ou no “Doutor”. Falam mais no cargo do que no indivíduo, por isso ele não é identificado e preferem classificá-lo simplesmente por doutor ou doutora, como se o título académico estivesse indexado ao Mário ou à Fernanda. Mas não, o doutor serve para os Mários, para as Fernandas, para os Franciscos, para os Eduardos e para todos os nomes que lhes dêem na cabeça. Simplificou-se o tratamento e não ocupamos os ficheiros de memória do nosso cérebro, com a identificação do nome, que toda a gente sabe que é, indiscutivelmente, “o doutor”. “Olha, o doutor mandou-te chamar” ou “o doutor deu instruções para …”

E a questão da omissão dos nomes é tão mais grave que é frequente ouvir nos noticiários das TV’s os locutores referirem-se a alguém sem lhes pronunciar o nome. Ainda nos últimos dias, a propósito da visita de Bill Gates a Portugal, o seu nome foi invariavelmente substituído por “o homem mais rico do mundo” ou “o patrão da Microsoft”

Absurdo, não é?

Outro aspecto que me faz ir aos arames é o tratamento indiferenciado entre os licenciados. Eu explico o que quero dizer. Suponhamos que um serviço tem meia dúzia de licenciados e é chefiado também por um licenciado.
Na maior parte das empresas que conheço, o que se passa é que todos se tratam pelos nomes, em geral pelo nome próprio, mas quando falam com o chefe/director/responsável dirigem-se-lhes de forma mais formal, porventura mais submissa, e aplicam-lhe o “Dr.”.

Poder-se-á dizer que é por uma questão de respeito, ou por causa da idade. Mas não. Quanto à idade, não deve ser, uma vez que, em muitos casos, o chefe é mais novo do que os seus colaboradores. Quanto ao respeito, bem, sempre achei que ele deveria ser biunívoco, isto é, deveria haver respeito de parte a parte, o que parece não acontecer. O que eu ouço normalmente é o chefe tratar o seu ajudante pelo nome próprio e, este, continuar a tratá-lo por “Dr.”. “Oh Joaquim, veja se amanhã me entrega o projecto já com as emendas que lhe pedi”. “Sim, Sr. Dr., pode ficar descansado, amanhã terá o projecto em ordem”.

E isto é já tão “normal” que até na televisão, é frequente assistirmos a cenas destas. Ainda há dias ouvi uma entrevista conduzida pela Drª. Judite de Sousa ao Dr. Francisco Louçã. E o que ouvimos? Apenas o habitual, a jornalista colocava as questões ao Dr. Louçã e ele respondia com toda a naturalidade “Olhe, Judite, o que eu penso …”

Absurdo, não é?

terça-feira, fevereiro 14, 2006

Como é que isto foi possível?

Quando em 1994 visitei Moçambique, assisti a um país completamente arruinado e destroçado por uma longa e feroz guerra civil, que acabara pouco antes. Por todo o lado viam-se sinais de uma pobreza imensa. Maputo, a capital, era bem o reflexo desse estado de coisas. As farmácias estavam vazias, os transportes funcionavam muito mal, a conservação das ruas e das casas era inexistente. A degradação era tanta, tanta e tal, que em muitos pontos da cidade viam-se valas abertas que serviam como esgotos. Moçambique era considerado, então, o país mais pobre do mundo.

Daí que, face ao que ia observando a cada momento, não tivesse ficado surpreendido quando me disseram que uma família tinha sido apanhada a viver num dos jazigos do cemitério local.
Num país sem condições, que viu chegar à capital milhares e milhares de refugiados de outras zonas, e que, naturalmente, não tinha para oferecer qualquer tipo de estruturas que servissem minimamente como casas, o facto de uma família ter ido viver para um cemitério, para mim isso não era uma surpresa, era um acto de imaginação necessário à sua subsistência.

Surpreso fiquei quando há pouco foi divulgado que em Portugal, em pleno século XXI, num país que está integrado na Europa dos ricos (embora sendo o mais pobre) num país que se diz, e que se quer desenvolvido, uma família viveu ao longo de mais de 20 anos num dos pisos subterrâneos do Hospital de Santa Maria.
E, por isso, não posso deixar de me interrogar como foi possível, no meu país, ao longo de tanto tempo, ter-se verificado uma completa ausência de controlo, que permitiu que um indivíduo chegasse a levar a mobília de quarto para aquelas catacumbas e dali fizesse o domicílio oficial da sua família.

Mas a incompetência chegou a um ponto tal nesse mesmo Hospital, que - pasme-se - foram utilizados alguns armazéns contíguos à casa mortuária, para guardar, também ao longo de vários anos, os produtos resultantes dos assaltos cometidos por vários grupos de meliantes.

Ninguém aceitará uma explicação para o sucedido, por melhor que ela seja. Como é que isto foi possível? A quem devem ser imputadas responsabilidades?

segunda-feira, fevereiro 13, 2006

Hoje, falemos de beijos

Não fora amanhã a comemoração do dia de S. Valentim e, se calhar, nem sequer me lembraria de falar no assunto. Mas a verdade é que, mesmo tendo em conta a comercialização despudorada que tomou conta da data, mesmo assim, sinto-me obrigado, neste dia dos namorados, a falar deles e do amor. E, ao falar de amor e de namorados, terei naturalmente que falar de beijos. Sim porque uma coisa não existe sem a outra, como sabemos.

E é tão bom falar de beijos, se bem que difícil, também. Pelo menos para mim, que sou um tanto ou quanto tímido.
Podemos dizer que há beijos fingidos e frios, há beijos ardentes, há beijos que são dados por obrigação e há os beijos super desejados.
Existem os provocantes, os sonoros, os secos e os molhados. Enfim, existem muitos tipos de beijos e milhares de formas de beijar.

Para muitos, um beijo pode ser uma vírgula mas, para alguns, apenas um ponto de interrogação. Para outros, ainda, uma exclamação.

E há beijos que se colocam nas duas faces, mas outros há, os mais snobes, apenas numa delas e, outros ainda, nos lábios. Temos, claro está, os beijos fraternos, os beijos de cortesia, os beijos de amizade e, naturalmente, os beijos apaixonados.

Aliás, no que diz respeito a beijos trocados entre apaixonados, quase se poderia escrever um manual. Isto porque, para além do mais, os beijos são a primeira estratégia da sedução.

Mas aqui para nós, que ninguém nos ouve, digam lá, há coisa melhor que um beijo? É que, para além de saber tão bem, o beijo faz muito bem à saúde. Um só beijo movimenta 29 músculos, sendo que 17 desses músculos são os da língua. Para além disso, queimamos calorias e libertamos uma hormona chamada serotonina que eleva o humor e produz uma sensação de bem-estar e felicidade. Vocês alguma vez pensaram que aquele bem-estar gostoso provocado pelo beijo era provocado pela serotonina? O raio da hormona desavergonhada…

Uma das mais belas definições de beijo que ouvi até hoje, foi dita, de uma forma extremamente romântica, pelo biólogo e escritor francês Jean Rostand
“Um beijo é um segredo que se diz na boca e não no ouvido”

Mas a verdadeira história do beijo, poucos a conhecerão e, generoso como sou, vou-vos dar o gosto de a divulgar. Segundo o grande historiador grego Plutarco, que viveu nos anos 45 a 125 da nossa era, os seres humanos começaram a beijar-se quando uma lei romana proibiu as mulheres de beberem vinho. Para se certificarem que as suas mulheres cumpriam de facto a lei, os maridos começaram a “testar” o hálito das esposas. Depois disso, surgiu uma nova lei, que tornou o beijo obrigatório entre os esposos, para que, desta maneira, fosse reforçada a fiscalização daquela lei.

Aliás, deve ser porque a lei se mantém ainda em vigor, passados estes anos todos, que as pessoas, e não só os esposos, se continuam a beijar. Estou em crer que deve ser apenas por isso!

Um beijo grande!

domingo, fevereiro 12, 2006

“Alimentem esta ideia”

No ano passado, quando entreguei a minha declaração de IRS na Repartição de Finanças (que vergonha ter que confessar que ainda não utilizo a net para entregar o IRS) o funcionário que me atendeu informou-me que se quisesse doar parte do IRS a certas instituições, isso iria sair do meu bolso. E com o ar mais compenetrado do mundo acrescentou “claro está que o Estado não iria ficar prejudicado, não é?”

Francamente eu não sabia se era assim ou não. Sabia apenas, que poucos dias antes recebera um mail a informar que os contribuintes que o desejassem podiam oferecer 0,5% do seu rendimento a uma instituição de solidariedade, sem ser penalizado.

De facto, eu recebera esse mail e julgara ter entendido perfeitamente o que ele me estava a transmitir. No entanto, aquele senhor que era técnico dos impostos e que até tinha um ar de quem sabia realmente o que estava a dizer, foi tão peremptório e tão convincente que me fez acreditar que, obviamente, “O Estado não poderia ser prejudicado…”

Pois este ano, para que não haja mais dúvidas, e para que não estejam convencidos que só os senhores das finanças é que sabem as leis todas, ficam desde já a saber – todos vós – que

Qualquer pessoa pode doar parte do seu IRS porque o Estado permite que 0,5% do IRS liquidado pode reverter a favor de uma instituição de solidariedade social.

Isto é, vamos pagar ao Estado o que temos para pagar e, depois, sem qualquer encargo adicional para nós, poderemos dizer ao mesmíssimo Estado que queremos que 0,5% daquilo que lhe pagámos deve ser transferido para uma Instituição de Solidariedade Social que nós iremos indicar.

NÃO PAGAREMOS MAIS POR O FAZER.
Para tal basta que no

Modelo 3 - Anexo H - Benefícios fiscais e deduções

No Quadro 9, campo 902 - Consignação de 0,5% do Imposto Liquidado

Escreva o nome da Instituição a quem pretende doar o seu donativo e fique tranquilo que o Estado transferirá essa verba para a Instituição que indicou.

Dito isto, e sabendo a admiração e o carinho que eu tenho pela obra dos Bancos Alimentares, permitam que eu lhes deixe a minha sugestão:
Encaminhem parte do seu IRS para os
Bancos Alimentares Contra a Fome
NIPC 504 335 642

Ajude os Bancos Alimentares com o seu IRS. Alimentem esta ideia

quinta-feira, fevereiro 09, 2006

Consultora precisa-se

Quando o caso começou a constar, os meus nervos agitaram-se e os meus dedos começaram a ter uma irritação tal que deslizaram pelo teclado doidinhos para contar a história.
A notícia foi publicada no “Independente” mas nos chamados “mentideros” já constava há algum tempo que ia estourar uma bronca.

Pois é, a Sr.ª. Eng.ª. Sofia Fava, que foi casada com o primeiro-ministro José Sócrates, foi contratada pelos CTT como consultora externa para participar num projecto denominado “Sistema de Informação Geográfica Postal”.

Ao que parece, e segundo fonte oficial dos CTT em declarações ao “Independente”, trata-se de um trabalho que visa racionalizar a distribuição de correspondências, cartografando as ruas das cidades e desenhando os roteiros dos carteiros de uma maneira lógica. Como se deduz, o objectivo principal é, naturalmente, prestar um melhor serviço aos clientes.

Até aqui tudo bem. Saudemos a medida e esperemos ansiosamente os resultados que, temos a certeza, irão beneficiar grandemente os utentes dos correios.

Mas, desculpem-me lá a desconfiança. A Administração dos CTT, que é presidida pelo socialista Luís Nazaré, foi contratar uma consultora que, por acaso, é a ex-mulher do actual primeiro-ministro, a mesmíssima pessoa que, também, por acaso, faz parte da comissão política do concelho de Lisboa do partido socialista, casualmente o partido que está no governo, e ainda por cima com maioria absoluta? Entenderam a coisa?

Eu explico melhor. O Dr. Luís Nazaré e o Eng. José Sócrates são amigos e também são amigos comuns e admiradores confessos do actual Comissário das Nações Unidas para os Refugiados, o Engº. António Guterres. E se Sócrates é amigo de há décadas de Guterres, já Nazaré chegou ao clã através da sua participação nos Estados Gerais para a Nova Maioria. A completar o quadro, resta dizer que Luís Nazaré foi nomeado presidente do conselho de administração dos CTT, após a vitória de José Sócrates nas legislativas de 2005. Perceberam agora? Ainda não?

Bem, então é necessário dizer que não está em causa a qualidade e as capacidades técnicas da Sr.ª. Engenheira, e tão pouco achamos que a Sr.ª. Engenheira deveria ter sido prejudicada na sua escolha pelo facto de ter sido casada com o Eng. Sócrates ou por fazer parte de uma estrutura do partido do governo. Nada disso.

O que achamos estranho é que tivesse havido a necessidade imperiosa de contratar uma consultora para participar num projecto de racionalização da distribuição de correspondências, quando, dentro da empresa, já existe um sistema informático que permite racionalizar todo o esquema de distribuição da correspondência da capital. Ou seja, vai arrancar um projecto onde certamente se vão gastar pipas de massa para se chegar a um produto que, afinal, a empresa já tem.

Agora que toda a gente já viu onde eu queria chegar e antes que os meus belos e escorreitos dedinhos fiquem completamente doidos de comichão, só quero lembrar que temos estado a falar de uma empresa pública, de mais uma empresa pública que vive à custa do dinheiro dos contribuintes. E daí perguntar: como é que uma empresa pública ainda tem o descaramento de fazer contratações do tipo “jobs for the girls” e, como é que esta mesma empresa se arroga o direito de não divulgar os salários e as mordomias que vai pagar aos novos contratados? Se calhar, porque as pessoas já se habituaram a isto e já ninguém se surpreende com tamanhos desmandos.

domingo, fevereiro 05, 2006

O ovo e a galinha

Sempre tive alguma dificuldade em resistir a um desafio. Penso que é uma questão de temperamento. Por isso, quando “porcos no espaço” lançou um grito de desespero, logo saltei a terreiro e, qual super-homem, lancei-me velozmente ao encontro de quem manifestava tanta inquietude.

Mas o grito lancinante que procurava desesperadamente uma resposta para a velha questão de se saber quem nasceu primeiro, se o ovo ou a galinha – tão velha, de resto, quanto a outra do copo meio cheio ou meio vazio – provocou-me um arrepio.

É que não faço a mínima ideia de quem apareceu primeiro. Mas, como acontece com a generalidade dos portugueses, isso não me impede de dissertar sobre o assunto.

Há séculos que as pessoas se encantam, se perturbam e se interrogam sobre esta questão mas, quanto a respostas, nenhumas. Apenas meras conjecturas e nada mais.

Cá para mim, o ovo foi o começo de tudo, muito embora eu não saiba como justificar esta minha opinião. Chamemos-lhe pressentimento, ou talvez lógica. Afinal como é que nascem as galinhas? Dos ovos, não é?

Por outras razões, aliás bem mais razoáveis, os cientistas do National Geografic também são de opinião de que o ovo nasceu primeiro que a galinha. E a sua justificação é simples. Dizem eles que os répteis já punham ovos muito tempo antes de existirem galinhas, e a primeira galinha nasceu de um ovo posto por uma ave que não era propriamente aquilo a que hoje chamamos uma galinha.

É claro que haverá por aí muita gente que não terá qualquer problema em afirmar precisamente o contrário. Dirão que se trata de uma tese perfeitamente estapafúrdia porque, quem se der ao trabalho de ficar de plantão num galinheiro, verá que só depois da galinha chegar é que vem o ovo.

E se calhar, são capazes de ter também razão. Mas eu ainda tenho uma história, quiçá uma lenda, que poderá servir como meu argumento de choque:
Ao que parece, quando Deus quis fazer o galo e a galinha, inesperadamente, o ovo antecipou-se. Como o plano previsto não fosse aquele, Deus pediu a uma pomba para chocar o tal ovo. A pomba, embora contrariada, anuiu e após alguns dias, nasceu um pintainho que, para a alegria geral e alívio de Deus, era uma galinha.

Como vêem, mais uma vez o ovo veio à frente da galinha.

Mas já que falamos de ovos e de galinhas, quero fazer-vos um aviso: “Não contem nunca com o ovo que está no cu da galinha”. É que, dizem, existiu realmente uma galinha que punha ovos de ouro. Mas a cobiça humana foi mais forte que a sensatez. A ambição foi a tal ponto que abriram a galinha e tentaram retirar todos os ovos de ouro que ela teria no seu interior. Só que os ovos ainda não estavam prontos e a galinha morreu. A partir desse momento, nenhuma outra galinha no mundo voltou a pôr ovos de ouro.