segunda-feira, julho 31, 2006

“Oh da guarda!”

Para além de muita paciência e enorme perseverança vai ser necessária muita coragem para que o governo consiga pôr nos eixos as miríades de situações que faz com que este país esteja na situação deplorável em que se encontra.

Soube-se agora o resultado de um estudo efectuado pela empresa de consultoria Deloitte, que o nível médio de absentismo dos 136,5 mil funcionários municipais deste país, ou seja 2,9% da população activa, é de 22 dias úteis. Isto é, meus amigos, cada empregado municipal falta, em média, um mês de trabalho por ano.

O que me leva a perguntar: não há legislação que estabeleça penalizações para quem tanto falta? Não existem chefias que disciplinem esta indisciplina? Quem tem mão nisto tudo?

Pelos vistos ninguém. O facto é admitido pelo próprio Presidente da Associação Nacional de Municípios, Fernando Ruas, ao dizer que é um problema que "ultrapassa" os autarcas.

Bem vistas as coisas, se calhar sou eu que estou a exagerar. Afinal, a média de faltas por empregado, não vai além de um reles mês de trabalho em cada ano. Nem sei bem porque é que eu, contribuinte que pago os impostos a tempo e horas, estou a falar disto.

Como dizia um colega meu, se a culpa não é de ninguém, então, o culpado sou eu ...

domingo, julho 30, 2006

Maria João Pires, porquê?


Não sei o que dizer. Pior ainda, não sei o que pensar depois de saber que a nossa mais internacional e premiada pianista abandona o nosso país e vai viver para o Brasil.
Maria João Pires anunciou que vai instalar-se definitivamente no Brasil e desistir do Centro para o Estudo das Artes de Belgais, próximo de Castelo Branco, instalado numa quinta que comprou há sete anos.

"Sofri fisicamente todos aqueles anos em que me dediquei ao projecto e tentei fazer tudo, e não consegui... no fundo, não consegui mais do que um começo", lamentou-se.

“Em Portugal,” afirmou, "estava a ser vítima de uma verdadeira tortura". "Parto para me salvar um pouco dos malefícios que Portugal me estava a fazer", explicou a pianista, considerando que “comprar casa no Brasil - país onde ia "respirar - é um momento de coragem".

Sabe-se, aliás, que pretende construir em Salvador da Baía um novo projecto semelhante a Belgais, que está vocacionado para a apresentação de concertos de música clássica, workshops, residências e formação de crianças das escolas da região.

Sem adiantar pormenores, sabe-se que esta resolução drástica deve ter a ver com a falta de financiamentos a Belgais, de que se queixava há muito.

Em resposta, a Ministra da Cultura, Isabel Pires de Lima, contestou a alegada falta de subsídios para Belgais, dizendo mesmo que desde o início do projecto o erário público já tinha dispendido um milhão, oitocentos e vinte mil euros a que se juntaram os subsídios vindos da Comunidade Europeia. A Ministra disse que considerava as queixas injustas e que Maria João Pires estava a ser ingrata com Portugal.

Em comunicado à imprensa publicado posteriormente, MJP disse que “Belgais não fechou nem vai fechar. Não tenciono abandonar aquilo que eu própria criei. Vou continuar a trabalhar e a colaborar no projecto Belgais, mesmo sem gostar do país”.

Sabemos que Maria João Pires é uma pianista conceituada e conhecida internacionalmente, sendo convidada com regularidade para tocar nas melhores salas de concerto de todo o mundo.

Sabemos que ela foi a fundadora e principal dinamizadora do Centro de Belgais para o Estudo das Artes, uma obra de cariz pedagógico, cultural e social de grande importância para a região.

O que não sabemos é que razões concretas a levaram a tomar esta decisão. Maria João Pires deveria ter sido mais clara nas suas afirmações e deveria ter esclarecido cabalmente porque é que estava a ser vítima de uma verdadeira tortura, quais os malefícios que Portugal lhe estava a provocar e porque é que já não gosta do seu país. As frases duras que proferiu, poderão ser uma expressão do seu estado de alma, mas, para os portugueses, nada esclareceram.

E o que pensarão os intelectuais de outros países que seguem de perto a carreira internacional da pianista? Que somos um povo que se dá ao luxo de detestar a arte e que despreza e maltrata os seus artistas? Não, não somos nada disso. Por isso gostaríamos que nos dissessem a verdade toda.

Depois de José Saramago ter preferido o "exílio" na ilha de Lanzarote, é agora a vez de Portugal e dos portugueses verem partir a distinguida com o Prémio Pessoa de 1989, Maria João Pires, uma personalidade da nossa cultura e uma pianista cujo virtuosismo musical ninguém discute.

Só queremos saber o que aconteceu ...

quinta-feira, julho 27, 2006

Daí, lavo as minhas mãos


Quando há dias vos falei em assessores e vos abri a minha (i)alma ao confessar-vos que, na minha meninice, sonhara ser jogador de hóquei em patins e revisor dos comboios, logo perceberam que, eu tinha tido uma esmeradíssima educação. Tive, de facto, um enorme privilégio em ter recebido valores e saberes fundamentais que nortearam toda a minha vida. De tal forma que, ainda que eu o desejasse, ainda que as circunstâncias da vida me fossem madrastas, ainda assim, eu nunca me poderia vir a transformar num grunho, se é que sabem do que é que eu estou a falar. Pode ser que um dia vos fale sobre os grunhos.

Desde cedo aprendi a ter boas maneiras. Por exemplo, a comer de boca fechada, a ter as unhas cuidadas e limpas, a não bocejar, ou sendo impossível impedi-lo, a colocar a mão na frente da boca. Desde cedo aprendi tantas, mas tantas coisas, coisas daquelas que só uma esmerada educação ensina, que seria fastidioso enumerá-las. Aliás, nem isso me ficaria bem, porque a boa educação assim o determina.

Quase todas as regras, as de etiqueta e as outras, eram muito rigorosas e o seu cumprimento era controlado ao milímetro de forma exigente quer pelos pais (a quem eu chamava respeitosamente de “mami” e “papi”, e ao que eles me respondiam invariávelmente de “menino”), quer pela governanta, quer pelo mordomo, quer ainda pelas diversas preceptoras contratadas para me ensinarem as mais diversas matérias.
Lavar as mãos sempre fez parte desse ensino e das minhas obrigações. Era uma regra de higiene absolutamente fundamental, que tinha que cumprir por diversas vezes ao longo do dia “por causa dos micróbios”, como dizia a “mami”.

E porque sempre foi um gesto obrigatório e fundamental, foi com grande espanto que li há dias num jornal, num dos jornais ditos de referência, que “os médicos vão aprender a lavar as mãos”. Os médicos? – interroguei-me. Depois de adultos e com cursos superiores é que vão aprender a lavar as mãos?

É que, ao que parece, o Ministério da Saúde quer ensinar os profissionais de saúde a lavar as mãos, uma vez que estas são um dos principais veículos de transmissão das infecções de que são vítimas oito em cada cem doentes internados nos hospitais portugueses.

A vida é, por vezes, cruel. Interna-se uma pessoa num hospital para se curar de uma qualquer doença e, quando menos se espera, fica boa dessa doença e zás, apanha uma infecção dos diabos, só porque os profissionais que lhes deviam tratar da saúde, não tiveram (não souberam ter) os devidos cuidados ao lavar as mãos. Lá está, se os médicos, desde pequenitos, tivessem tido uma esmerada educação, como a minha que foi na Suiça, hoje saberiam como lavar correctamente as mãos e os tais oito doentes das estatísticas, passavam ao lado da infecção.

Percebem agora porque é que se diz frequentemente que certas coisas só acontecem no nosso país?

quarta-feira, julho 26, 2006

A guerra no Médio Oriente


A julgar pela minha ausência de uma semana, poder-se-ia pensar que, nesta altura, eu já “estaria a banhos” algures num país exótico e quente, mas a verdade é que só um maçador problema informático, daqueles que não se resolvem com o simples desligar e voltar a ligar, me fez estar uns dias afastado deste espaço e da vossa companhia.
E volto a tempo, num tempo em que o Médio Oriente se agita com novos horrores de uma guerra que dura há anos, cujos contornos temos alguma dificuldade em avaliar, não sabendo sequer o que se passa, de facto, no terreno e correndo até o risco de misturar religião com política e estados com grupos religiosos.
Não temos sequer capacidade para interpretar as notícias que nos chegam a cada segundo. A situação é muito confusa e, sobretudo triste perante tanta destruição, tantos mortos, feridos e desalojados.
E volto a tempo, repito, porque gostaria de partilhar convosco um texto (excelente como sempre) do Professor Boaventura Sousa Santos sobre este drama, texto que será publicado amanhã, dia 27, na Revista Visão.
É mais um aspecto, mais uma opinião sobre este o assunto que, ao contrário do que muitos julgam, não diz respeito, apenas, aos povos daquela região, mas a todos nós.

“Carta a Frank

Escrevo-te esta carta com o coração apertado. Deixo a análise fria para a razão cínica que domina o comentário político ocidental. És um dos intelectuais judeus israelitas – como te costumas classificar para não esquecer que um quinto dos cidadãos de Israel são árabes – mais progressistas que conheço. Aceitei com gosto o convite que me fizeste para participar no Congresso que estás a organizar na Universidade de Telavive. Sensibilizou-me sobretudo o entusiasmo com que acolheste a minha sugestão de realizarmos algumas sessões do Congresso em Ramalah. Escrevo-te hoje para te dizer que, em consciência, não poderei participar no congresso. Defendo, como sabes, que Israel tem direito a existir como país livre e democrático, o mesmo direito que defendo para o povo palestiniano. “Esqueço” com alguma má consciência que a Resolução 181 da ONU, de 1947, decidiu a partilha da Palestina entre um Estado judaico (55% do território) e um Estado palestiniano (44%) e uma zona internacional (os lugares santos: Jerusalém e Belém) para que os europeus expiassem o crime hediondo que tinham cometido contra o povo judaico. “Esqueço” também que, logo em 1948, a parcela do Estado árabe diminuiu quando 700.000 palestinianos foram expulsos das suas terras e casas (levando consigo as chaves que muitos ainda conservam) e continuou a diminuir nas décadas seguintes, não sendo hoje mais de 20% do território.
Ao longo dos anos tenho vindo a acumular dúvidas de que Israel aceite, de facto, a solução dos dois Estados: a proliferação dos colonatos, a construção de infra-estruturas (estradas, redes de água e de electricidade), retalhando o território palestiniano para servir os colonatos, os check points e, finalmente, a construção do Muro de Sharon a partir de 2002 (desenhado para roubar mais território aos palestinianos, os privar do acesso à água e, de facto, os meter num vasto campo de concentração). As dúvidas estão agora dissipadas depois dos mais recentes ataques na faixa de Gaza e da invasão do Líbano. E agora tudo faz sentido. A invasão e destruição do Líbano em 1982 ocorreu no momento em que Arafat dava sinais de querer iniciar negociações, tal como a de agora ocorre pouco depois do Hamas e da Fatah terem acordado em propor negociações. Tal como então, foram forjados os pretextos para a guerra. Para além de haver milhares de palestinianos raptados por Israel (incluindo ministros de um governo democraticamente eleito), quantas vezes no passado se negociou a troca de prisioneiros?
Meu Caro Frank, o teu país não quer a paz, quer a guerra porque não quer dois Estados. Quer a destruição do povo palestiniano ou, o que é o mesmo, quer reduzi-lo a grupos dispersos de servos politicamente desarticulados, vagueando como apátridas desenraizados em quadrículos de terreno bem vigiados. Para isso dá-se ao luxo de destruir, pela segunda vez, um país inteiro e cometer impunemente crimes de guerra contra populações civis. Depois do Líbano, seguir-se-á a Síria e o Irão. E depois, fatalmente, virar-se-á o feitiço contra o feiticeiro e será a vez do teu Israel. Por agora, o teu país é o novo Estado pária, exímio em terrorismo de Estado, apoiado por um imenso lobby comunicacional – que sufocantemente domina os jornais do meu país – com a bênção dos neoconservadores de Washington e a vergonhosa passividade a União Europeia. Sei que partilhas muito do que penso e espero que compreendas que a minha solidariedade para com a tua luta passa pelo boicote ao teu país. Não é uma decisão fácil. Mas crê-me que, ao pisar a terra de Israel, sentiria o sangue das crianças de Gaza e do Líbano (um terço das vítimas) enlamear os meus passos e embargar-me a voz”.

terça-feira, julho 18, 2006

Quem te manda, a ti, sapateiro …

Para além do que se vai aprendendo durante a vida, todos nós temos capacidades congénitas que podem, ou não, vir a ser desenvolvidas com o tempo.

Há pessoas que têm um dom natural para o canto, outras que têm um jeito enorme para fazer pequenos arranjos em casa. Mas, todos reconhecem, não se pode forçar quem quer que seja a ter uma determinada aptidão, se essa pessoa não tiver as tais capacidades inatas.

E um bom exemplo disso foi o que se passou com um japonês que tentou assaltar um banco. O homem entrou numa filial do Banco Saitama Resona, na cidade de Kumagaya, com a intenção de roubar e dirigiu-se ao funcionário da caixa a quem perguntou “tem alguma ideia de como posso roubar o banco?”.

Um outro empregado que se apercebeu do que se estava a passar, ao encaminhar o suposto ladrão para a porta, notou que, do bolso do “assaltante” saiu uma pequena faca que, ao cair, o feriu acidentalmente numa perna.

Moral da história: Nem todos nascem para serem ladrões!

Ou, como diz o nosso povo “Quem te manda a ti, sapateiro, tocar rabecão”.

segunda-feira, julho 17, 2006

Assessores


Desde há muitos anos que a minha vocação, a minha “queda”, se quiserem, era ser assessor de qualquer coisa. Sempre tive um fascínio por aquela actividade, que se me perguntarem em que é que consiste, que tipo de trabalho é aquele, eu na verdade não faço a mínima ideia. O que sei é que, desde pequenino sempre quiz ser assessor. Bem, de pequenino talvez não, porque nessa altura a “profissão” de “assessor” ainda não tinha sido inventada. Eram tempos em que tudo se fazia de uma outra forma. Deixem-me ver se consigo explicar melhor. Quando havia necessidade de se tomar uma medida ou de se proceder a uma alteração, que podia até ser de fundo, reuniam-se meia dúzia de pessoas de diversas especificações e metiam as mãos à obra, que é como quem diz, tinha que se fazer, vamos a isto. Claro está que, tal como não havia ainda assessores, também ainda não tinham sido descobertos os “projectos”, nem tão pouco, os “grupos de trabalho. Mas adiante.

Para ser franco, o que eu em pequenino queria ser era jogador de hóquei em patins ou revisor dos comboios. Só muitos anos depois, provavelmente quando descobri que não seria nem uma coisa nem outra, é que me virei para a tal carreira de assessor. Comecei a perceber que era uma coisa com futuro, que poderia vir a ser alguém e que, sobretudo, poderia ganhar uma pipa de massa, ser conhecido e, portanto, mais requisitado, mas sempre como assessor.

Entretanto, os “grupos de trabalho” foram nascendo como cogumelos e, simultâneamente, não houve uma única empresa, um único departamento, um único serviço que não apresentasse projectos. Todo o mundo tinha projectos para ir para a frente, embora nalguns deles não se conhecesse bem quais as finalidades a atingir. E descobriu-se então que os projectos e os grupos de trabalho só poderiam funcionar se tivessem assessores a assessorar os tais grupos de trabalho para o desenvolvimento desses mesmos projectos.

A partir de certa altura, comecei, então, a trabalhar com os assessores. Eu estava lá (no grupo de trabalho, é claro) porque era um especialista em ..., e estavam lá mais uns quantos especialistas em ..., tudo gente da empresa, escolhidos a dedo porque sabiam daquelas matérias e, não tenho dúvidas que seriam bem capazes de levar os tais projectos a bom termo, a funcionarem mesmo. Mas estavam lá, também, obviamente, os assessores que iam apontando tudo o que dizíamos e que faziam as actas das reuniões onde eram discutidos assuntos que eles, assessores, não faziam ideia nenhuma do que se tratava. Mas eles impunham-se porque faziam umas bonitas apresentações em power point e conseguiam convencer os patrões com os gráficos que apresentavam, que o andamento do projecto ia bem, ou mal, ou não ia. E ganhavam bem para fazer isso.

Como disse, eu tinha um fraquinho pelo papel do assessor, muito embora eu soubesse pelos dicionários que consultava, que assessores não eram mais do que assistentes, adjuntos, auxiliares ou ajudantes, nunca os mentores, ou os líderes. Mas que querem, eles relacionavam-se bem com as administrações e, porque me dava bem com alguns deles, sabia que tinham remunerações bem interessantes.

Mas a vida é assim, nem sempre nos faz as vontades e eu nunca cheguei a ser assessor, tal como não fui jogador de hóquei em patins nem revisor dos comboios.

Se tenho seguido essa minha vocação, a de assessor, talvez hoje eu fizesse parte dos 64 assessores do Presidente Carmona Rodrigues, quem sabe se o assessor especial que tem a função de organizar os “Portos de Honra”. Mas se não fosse do presidente, poderia ser um dos 193 assessores-executivos dos vereadores com pelouros. Aliás, qualquer vereador da CML, independentemente do pelouro que tenha atribuído, tem entre 20 e 30 assessores para os orientar, o que realmente faz pensar que competências é que serão necessárias para se atingir um lugar na Câmara se, depois, é necessário ter um exército de adjuntos para os assessorar. São coisas como estas que, por mais que me esforce, nunca consigo perceber...

domingo, julho 16, 2006

Férias ... mas só para alguns

De uma forma geral, a segunda quinzena de Julho é uma altura óptima para se fazer uma pausa nas rotinas mais ou menos cansativas que nos atingem a todos e para rumar a outras paragens, se possível. Mas isso, infelizmente, não é para todos.

Segundo uma sondagem feita pelo DN/TSF/Marktest, 41% dos inquiridos não vão de férias neste ano de 2006. Dos que ainda tem alguma capacidade para fazer férias, 38,9% não fará mais do que 15 dias de férias sem sair de Portugal, e com um orçamento que não lhes permitirá gastar mais de 500 euros. Apenas 6% dos inquiridos vai repartir as suas férias pelo país e pelo estrangeiro e apenas 5% passarão férias no estrangeiro.
De facto, a coisa não está nada fácil.

Eu bem sei que antigamente não se faziam férias, não havia sequer esse hábito, a vida era direccionada para o trabalho e apenas para isso. Isto, claro está, para a enormíssima maioria da população. Mas com a alteração dos costumes e com uma melhoria acentuada da qualidade de vida das sociedades, as férias começaram a democratizar-se, a tornar-se um hábito e, mais do que isso, a ser uma necessidade para recarregar baterias que permitam aguentar mais um ano de trabalho.

Mas a crise, de há uns anos para cá, instalou-se de tal forma que, como vimos, nem todos têm a possibilidade de gozar uns dias de férias que seja. E é tremendamente injusto que as pessoas que trabalham um ano inteiro não possam disfrutar de um merecido descanso, do corpo e do espírito, ainda que por uns dias.
Como é injusto para os que estando a trabalhar a recibos verdes (pelo menos para alguns) lhes concedam férias mas não lhes dêem o respectivo subsídio.
Como é injusto que os reformados, embora tendo direito ao subsídio de férias, ele seja tão pequeno que mal dê para pagar os atrasados da farmácia e, às vezes, os da mercearia da esquina.
Para já não falar dos desempregados, cuja angústia e desespero bem mereciam uma pausa de reconfortante descanso.
Ao fim e ao cabo, e resumindo, uns quantos milhões de portugueses não vão de férias porque não têem dinheiro. E ponto.

Apesar de tudo, alguns portugueses ainda conseguiram juntar uns cobres para ir uns dias com a família até à praia. E, naturalmente, são legítimas as expectativas que foram criando ao longo do ano para gozar em pleno esses dias de férias.

Assim, alguns, terão imaginado poder dormir até tarde. E é claro que vão poder dormir ... desde que se entenda por tarde aí as oito da manhã. Porque, se tiverem filhos pequenos, seguramente que eles vão acordar cheios de energia e nada preocupados com a barulheira que vão fazer àquela hora da “madrugada”. Se não tiverem filhos, então poderá acontecer que um dos membros do casal insista que não há nada melhor nas férias do que ver o nascer do sol e ir à padaria comprar pão acabado de cozer. Se levarem a mãe ou a sogra, contem que vão ouvir vezes sem conta aquela estafada frase “já são horas decentes para se levantarem”, já que a preguiça nunca foi uma das qualidades mais apreciadas por elas.

Alguns outros, terão talvez sonhado “nas férias ninguém pense que vou cozinhar, vou mas é jantar fora todos os dias”. Claro que a intenção era excelente, porque verdade, verdadinha, quem é que, realmente, está na disposição de passar uma semana ou duas das suas queridas e tão ansiadas férias à volta dos tachos e do fogão a preparar os mesmíssimos pratos que costumam confeccionar em casa? Não, vamos mas é jantar fora, mesmo que tenhamos de esperar umas horas para sermos atendidos no restaurante. A ideia era boa, naturalmente, mas, ao fim de uns dias, e com as despesas a dispararem, não há outra alternativa que voltar para o fogão e deitar mão, pelo menos, à sardinhada ou à caldeirada que eles tanto tinham pensado ir comer lá fora.

Outra excelente ideia, congeminada por alguns, era a de desligarem o telemóvel durante todo o tempo que estivessem fora. Puro engano. Ao fim de dois dias a ouvir a sogra, as primas e os vizinhos da praia, estão já ansiosos para que a porcaria do telemóvel toque, seja lá porque pretexto for.

E porque a vida do dia-a-dia é demasiado rotineira e sedentária, não há quem não pense em aproveitar as férias para fazer exercício, andar a pé ou de bicicleta, por exemplo. A ideia é fantástica e totalmente exequível, pelo menos até começarem a pensar porque é que, afinal, teriam inventado o carro e o ar condicionado. A partir daí, não tarda que, arrumem os ténis, pendurem as bicicletas e se sentem descansadamente numa esplanada à beira mar, a beber um café, a ler o jornal e a olhar “discretamente” para quem passa.

quinta-feira, julho 13, 2006

O carro do Jeremias


Com os sucessivos aumentos da gasolina (ainda no último sábado a Galp aumentou um cêntimo na gasolina e no gasóleo e a Repsol aumentou o preço dos combustíveis em dois cêntimos) e com as enormíssimas dificuldades porque passam os “jeremias” deste país (todos nós, afinal), achei que merecíamos este poema escrito por um poeta popular quase desconhecido, de seu nome Manuel de Almeida

O carro do Jeremias não está pago
Nem anda todos os dias
Porque o pobre do Jeremias
Não ganha para ter carro.

Mas se o carro estivesse pago
E se andasse todos os dias,
Logo a gente percebia
Que o pedante do Jeremias
Ganhava p’ra ter carro.

Não tem sorte e tem má sina,
O pobre do Jeremias,
Porque o carro não se mexe
Sem que ele ponha gasolina.

E para ele ter gasolina
Para fazer o carro andar,
Não tem dinheiro p’ra comprar
Coitado do Jeremias!

quarta-feira, julho 12, 2006

Porque é que não deveriam pagar IRS?


Quase toda a gente reconhece que os rapazes da selecção nacional de futebol foram esforçados, jogaram, ao que parece, o futebol mais criativo do Mundial, conseguiram uma classificação bastante honrosa e, penso, que não se podem queixar da recompensa que lhes foi atribuída. Foram apaparicados por milhões de portugueses, por autarquias que fizeram questão de os receber que nem príncipes, foram até considerados herois antes mesmo da competição começar e, não menos importante, tiveram a satisfação e o orgulho de vestirem a camisola nacional em representação do seu país.

E por todo o empenho demonstrado, foi-lhes atribuído um prémio em dinheiro que, ao que parece, andará à volta dos 50 mil euros. Poucos profissionais terão tido alguma vez na vida a oportunidade de estarem um mês instalados em bons hotéis, a comer do bom e do melhor à conta do orçamento e, ainda por cima, ganharem cinquenta mil, isto, é claro, para além de continuaram a receber os respectivos ordenados dos seus clubes.

Mas, ainda assim, não nos iludamos. É certo que os rapazes estiveram bem, conseguiram um prestigiante quarto lugar na competição mas, na verdade, não atingiram o objectivo principal que era o de serem campeões. E nisto, meus amigos, temos que ser rigorosos e realistas. Numa competição só existe um ganhador, os outros são apenas os que perderam. Costuma-se até dizer que o vice-campeão (que é uma coisa que não existe oficialmente), o segundo classificado de uma competição é, apenas, o primeiro dos últimos. Em todo o caso, a selecção portuguesa, para além de se ter quedado pela quarta posição, conseguiu, na generalidade, uma boa prestação. O que não evitou, no entanto, que na tabela oficial da FIFA descessem de sétimo para oitavo lugar.

Como resumo da campanha, podemos então dizer que tivemos um grupo de jogadores de futebol, que foi apaparicado, vitoriado, endeusado e muito bem pago. Só que, a Federação que os representa, pretende agora que esses mesmos jogadores fiquem isentos do pagamento de IRS relativo ao que ganharam durante o tempo em que estiveram ao serviço da selecção.

Era só o que faltava. Não posso estar mais em desacordo, nem que eles tivessem ganho a estatueta do Mundial. Todos sabemos que qualquer trabalhador que tenha auferido um qualquer prémio pecuniário, paga IRS. Se essa isenção agora sugerida pela Federação fosse aprovada, o que me custa muito a acreditar, tratar-se-ia de mais uma valente discriminação e injustiça em relação aos demais trabalhadores.

Trata-se, pois, de uma questão de bom senso, sobretudo numa altura em que o país passa por enormes dificuldades, bem conhecidas e sentidas por todos e a quem os sucessivos governos não se cansam de pedir grandes sacrifícios. É absolutamente imoral e chocante que a Federação avance com uma proposta deste tipo, que, ainda por cima, iria criar mais uma situação de privilégio numa classe de profissionais que, já de si, é altamente privilegiada.

Se isso for aprovado tratar-se-á de mais uma afronta e uma ofensa a todos os portugueses, e seguramente àqueles mesmos portugueses que andaram durante um mês inteiro de braços no ar, a dar vivas e mais vivas aos que, agora, querem saltar fora e não pagar os impostos a que são obrigados.

segunda-feira, julho 10, 2006

Opções

Quando se soube, através da comunicação social, que o quarto homem mais rico do mundo, segundo a revista “Forbes”, o Sr. Ingvard Kamprad, o fundador do IKEA, era uma pessoa que hesitava muito antes de fazer qualquer despesa, o mínimo que a opinião pública terá pensado é que o homem era um forreta dos diabos. E, quando se soube que o Sr. Kamprad numa visita rápida que fez a Portugal, ficou instalado numa modesta pensão da Praça da Alegria e, ainda por cima, se deslocou à sua loja de Alfragide de táxi mas que, no regresso, recusou este “luxo” e se deslocou a pé até à Decatlhon, onde esperou pacientemente pela carreira 14 da Carris para o trazer de volta até à sua pensão da Praça da Alegria, aí, a mesma opinião pública já não disse que o homem era forreta, mas que ele era um grandessíssimo unhas de fome, um avarento à séria. Então, um tipo que é tão rico, que até é capaz de não saber o dinheiro que tem, e que em vez de ficar no Ritz que, por acaso, é mais perto da loja que ia visitar, vai dormir a numa pensão de quinta categoria? E uma vez mais a opinião pública foi categórica e decidiu que o homem não merece sequer ter a fortuna que tem.

Mas a questão não é tão linear. É claro, que se fosse comigo, naturalmente que ficaria não no Ritz mas no Meridien, porque simpatizo mais com este hotel e, obviamente, que seria transportado, na ida e na volta por um confortável carro de aluguer, quando muito, por um dos carros da admnistração da IKEA em Portugal.

Mas como eu não sou o Sr. Ingvard Kamprad tento fazer um esforço para compreender porque razão é que um homem que tem todo aquele dinheiro, nunca fica em hotéis com mais de três estrelas e que viaja sempre em classe económica. E a explicação mais aceitável que encontro para o facto, tem a ver, por um lado, com a sua vontade de pretender viver com toda a simplicidade e, por outro, em não querer ostentar o seu dinheiro. Está no seu pleníssimo direito e são opções de vida que devemos respeitar, muito embora possamos discordar delas.

Já agora conto-lhes uma outra história, de uma pessoa com quem trabalhei e que, ao fim e ao cabo, tinha uma opção de vida algo semelhante à do Sr. Kamprad.
A pessoa em causa era o meu director coodenador. Era solteiro, tinha hábitos modestos, vestia com sobriedade e, para além de gostar de viajar, não se lhe conheciam luxos dignos desse nome. Apenas um, gostava de ter os topos de gama de tudo o que fosse electrónico. Como se entende, ganhava muito bem, porque para além do cargo dentro da instituição financeira era, simultaneâmente, presidente de uma outra empresa do grupo.
Pois apesar do desafogo financeiro que todos sabíamos ter, os seus almoços habituais, praticamente em todos os dias do ano, não iam além de uma sandes de atum, de um quarto de água e de uma salada de frutas. E comia diariamente este menú, não porque era barato mas porque era o necessário e o suficiente para ele. Almocei muitas vezes na sua companhia e sentia que ele comia realmente com prazer aquela parca refeição, demasiadamente monótona e incrivelmente baratucha para quem não tinha que contar os tostões no dia-a-dia.

Não se tratava de uma questão de avareza, apenas uma opção.

domingo, julho 09, 2006

Declarações

Consta que Rui Rio, Presidente da Câmara Municipal do Porto, para além da grandessíssima guerra que trava há anos contra o Futebol Club do Porto e, principalmente, contra Pinto da Costa, consta, dizia, que o Senhor Presidente é também dado a tiques de autoridade e tendências censórias, que é coisa que eu julgava banida desde o tempo da outra senhora.

E se, na questão da contenda com Pinto da Costa até sou capaz de estar de acordo com o Dr. Rui Rio, porque também eu nunca gostei da promiscuidade entre o futebol e a política que, não raras vezes, trazem a público situações de tráfico de influências e de corrupção, já quanto à questão da censura, aí o assunto é completamente diferente.

Ao que parece, Rui Rio exige declarações escritas de fidelidade política às entidades que a sua Câmara subsidia. Ou seja, ou me és inteiramente fiel na linha política que determino ou então estás tramado e não levas nem um cêntimo. Estão a ver a coisa?

O que me fez lembrar o que se passava no tempo do Estado Novo, quando Salazar obrigava os candidatos a empregados públicos a assinar um documento – a célebre declaração 27003 – em que os candidatos afirmavam por sua honra não professarem quaisquer ideais comunistas, nem quaisquer outras doutrinas contrárias aos interesses do Estado. E se a declaração não fosse assinada (ainda que o pretendente ao emprego fosse um comunista convicto) não havia emprego para ningém.

Oh Dr. Rui Rio, e eu que pensava que, pelo menos nesta matéria, agora os tempos eram outros ...

quarta-feira, julho 05, 2006

Anunciar é preciso


Supostamente todos deveríamos saber que a Santa Casa da Misericórdia é uma instituição que, há muitos anos, presta apoio a pessoas carenciadas, em diversas áreas, nomeadamente na acção social e na saúde.

Mas para quem não soubesse mesmo ou para quem andasse demasiado distraído, a própria Santa Casa lembrou-se agora, quero dizer, fez questão de recordar a todos, a sua acção benemérita. E assim, vá de invadir com publicidade tudo quanto fosse jornal, revista, canal de televisão, outdoor e mupis. Publicidade, claro está, que custou ao erário público, mesmo beneficiando de descontos especiais, muito, muito dinheiro.

E o anúncio veio dizer-nos o quê? Nada, pelo menos nada de importante que justificasse o dispêndio de tão grossa maquia. A Santa Casa da Misericórdia com o lançamento desta campanha institucional apenas pretende assinalar os 508 anos de vida e, para isso, fez um investimento de 2 milhões de euros.

Investimento, foi o que eu disse? Perdão, eu rectifico, a Santa Casa teve o descaramento de gastar 2 milhões de euros com a campanha. Assim é que está correcto.

Ainda se fosse para anunciar novos e mais atractivos jogos que pudessem entusiasmar os apostadores a jogar com mais dinheiro, que seria canalizado posteriormente para consolidar as acções em curso ou promover outras acções de âmbito social, até se compreenderia. Mas não, nada de extraordinário ou de incomum aconteceu. A não ser a comemoração dos 508 anos da instituição e a demonstração mais do que provável, da vaidade pessoal do seu provedor, o socialista Dr. Rui Cunha.

Por este andar, espera-se que para o ano a Santa Casa faça outra campanha para comemorar nessa altura os 509 aninhos da instituição e novamente à custa dos dinheiros públicos.

Resumindo, se é dinheiro da malta, então, é gastar vilanagem!

terça-feira, julho 04, 2006

Pérolas


Para além dos mais ou menos clássicos erros de ortografia, infelizmente tão corriqueiros nas nossas revistas e jornais, vêm com frequência a público outro tipo de “erros” que poderiam até divertir-nos se o caso não fosse tão grave. E nem sequer é necessário estar com muita atenção para darmos com algumas das calinadas lidas e ouvidas na comunicação social. Como as que se seguem:

"Os sete artistas compõem um trio de talento”
"O acidente provocou uma forte comoção em toda a região, onde o veículo era bem conhecido"
"O aumento do desemprego foi de 0% o mês passado"
"Ferido no joelho, ele perdeu a cabeça"
"O acidente fez um total de um morto e três desaparecidos. Teme-se que não haja vitimas"
"O acidente foi no tristemente célebre Rectângulo das Bermudas"
"Quatro hectares de trigo foram queimados. Em principio trata-se de um incêndio"
"Os nossos leitores nos desculparão por este erro indesculpável"
"A vítima foi estrangulada a golpes de faca"
"Esta nova terapia traz esperança a todos aqueles que morrem de cancro a cada ano."
"Ela contraiu a doença na época em que ainda estava viva."
"À chegada da policia, o cadáver encontrava-se rigorosamente imóvel."

O que mais me aflige não são as “pérolas” em si mesmas (que nem “gralhas” chegam a ser), escritas ou lidas por estagiários mal preparados, mal pagos e, na maioria das vezes, desmotivados e sem perspectivas. Eles não são os verdadeiros culpados do que está a acontecer. O que me preocupa seriamente é que essa rapaziada não é seguida, não é orientada, não é ensinada por uma estrutura e uma hierarquia que, supostamente deveriam existir e constituir a referência do saber e da experiência. Mas, pelos vistos, elas não existem ou, se existem, estão-se perfeitamente nas tintas para tudo isto.

domingo, julho 02, 2006

Portugal, Portugal


Como aqui tenho referido, toda a euforia, aliás compreensível, que rodeia a boa prestação da nossa selecção no campeonato do mundo de futebol, tem-nos, de certo modo, pelo menos a alguns, feito esquecer tudo o resto que vai acontecendo no país e no mundo, isto é, tudo aquilo que vai para além dos jogos, dos jogadores, das classificações, das análises dos especialistas da modalidade e, naturalmente, do nosso orgulho de portugueses face aos resultados alcançados.

É natural, portanto, que nos lembremos bem de quase todas as incidências do jogo que disputámos ontem com a Inglaterra, do sofrimento que tivémos durante mais de 120 minutos, das três grandes penalidades defendidas pelo nosso Ricardo (um feito, de facto, extraordinário) e pela explosão de alegria no final do jogo de todos os que estavam no campo e no banco, equipa técnica, jogadores e dirigentes.

E com tantas emoções à flôr da pele, passou-nos quase despercebida a demissão do Ministro dos Negócios Estrangeiros, Professor Freitas do Amaral. No fim dos infindáveis telejornais em que se ouviram até à exaustão todos os herois que se classificaram para as meias finais do Mundial, lá foi dada a notícia que o professor Freitas do Amaral se demitira do governo por motivos imperiosos de saúde que o vão sujeitar a uma intervenção cirúrgica já amanhã.

Neste caso existiram motivos mais do que justificáveis para que José Sócrates procedesse a esta mini-remodelação. Mas se, por acaso, o primeiro-ministro decidisse nesta altura, e aproveitando o “barulho das luzes”, remodelar mais profundamente a equipa governamental, e fala-se insistentemente de vários ministros que até estão na calha para serem substituídos, quem é que daria por isso? Sobretudo em nomes que são menos conhecidos do grande público, provavelmente só depois do dia 9, quando o Mundial fechar as portas, é que os portugueses se dariam conta que certas pastas ministeriais eram tituladas por uns senhores de que nunca tinham ouvido falar.