quarta-feira, janeiro 31, 2007

Apesar de tudo ... o abuso continua!


Ainda que sejam louváveis as medidas levadas a cabo pelo governo, no sentido de acabar com tantas desigualdades e privilégios que são, sem dúvida, uma das causas que provocam um fosso cada vez maior entre os que mais têm e a esmagadora maioria da população, ainda assim, continuam a verificar-se situações perfeitamente escandalosas.

As conclusões, agora conhecidas, de uma auditoria do Tribunal de Contas a quatro grandes empresas públicas (Águas de Portugal(AdP), Caixa Geral de Depósitos (CGD), Correios de Portugal (CTT) e Aeroportos de Portugal (ANA), demonstram que as remunerações dos presidentes dos Conselhos de Administração e dos respectivos vogais, estão mais de 200 por cento acima daquelas que foram fixadas pelo Conselho de Ministros. Eu repito, aqueles gestores ganham mais 200% do que aquilo a que têm direito e foi estipulado pelo Conselho de Ministros.

Mas, para além dos salários, os gestores públicos recebem também “despesas de representação” e “prémios de gestão” que fazem parte da chamada “remuneração global”. São também atribuídos “benefícios suplementares” tais como a possibilidade de adquirir as viaturas de serviço por um valor equivalente a 20 por cento do seu valor residual ao fim de três anos de utilização (benefício que terminou com a resolução 121/2005. Atenção, este benefício já terminou em 2005 e eles continuam a tê-lo), a atribuição de planos complementares de reforma pagos pela empresa e o pagamento de despesas de comunicação (telefones fixos e móveis).

Como quem não deve não teme, estes (ricos) gestores públicos, deveriam ter tido, pelo menos, o cuidado de ter entregue ao Tribunal Constitucional, como é exigido por lei, uma declaração dos rendimentos bem como a inventariação do seu património e cargos sociais exercidos, com indicação dos rendimentos brutos auferidos. Mas, calculem, só 42% desses gestores cumpriram essa obrigação. E os outros? Será que os faltosos tinham razões para não tornar públicos os seus rendimentos e o seu património?

Se as leis existem neste país, porque é que não são cumpridas? E não haverá, por acaso, um órgão que fiscalize estes actos e puna severamente os que não cumprem?

Afinal, onde está a tão apregoada transparência no desempenho de cargos públicos que, de resto, é legalmente imposto?
Perante tais abusos, não é de estranhar que o cidadão comum tenha muita dificuldade em acreditar nos "sinais" que, apesar de tudo, vão sendo dados.

terça-feira, janeiro 30, 2007

Escapadela Serrana



Provavelmente nem deram pela minha ausência durante alguns dias da semana passada.

De repente, apeteceu-me tirar uns dias de férias, mudar de ambiente, de ares, sair dos locais habituais e dar uma saltada até à Serra da Estrela.


Obviamente que não fui à Serra na esperança de comprar queijos e presuntos (e manteigas) deliciosos, que nós tão bem conhecemos, ao preço dos 19 euros indicado na placa. Mas quis voltar à neve e a sentir aquele frio seco e penetrante que nos fere os ossos quando não estamos suficientemente protegidos.

Foi uma escapadela que soube bem. Houve neve, houve frio com fartura e houve ainda tempo para, em Seia, conhecer o Museu do Pão, cuja visita recomendo vivamente, assim como o seu restaurante, muito agradável e onde se come muitíssimo bem.

De regresso, uma passagem por Piódão, uma das dez aldeias históricas de Portugal. Uma aldeia de xisto, tradição e de uma beleza indescritível.

segunda-feira, janeiro 29, 2007

A arte espectacular de Ron Mueck


Nunca tinha ouvido falar dele. Há dias recebi um mail com alguns dos seus trabalhos e fiquei absolutamente rendido ao realismo e à perfeição da sua obra.

Ron Mueck (pronuncia-se muique), australiano nascido em Melbourne em 1958, é aquilo que se chama um artista hiper-realista. E o que o diferencia dos demais hiper-realistas de nomeada, como os norte-americanos Duane Hanson e John de Andrea, é que as suas obras são enormes, ou muito pequenas, o que quebra com todos os referenciais de escala a que normalmente estamos habituados.

As peças são feitas em fibra de vidro, silicone, rezina acrílica e poliéster e têm todas um denominador comum, todas as suas esculturas se confundem com a realidade. Chega a ser difícil distinguir se estamos perante uma escultura, ou não, porque a cor, a textura, as imperfeições da pele, as rugas, detalhes como as unhas, as veias, as sobrancelhas e os cabelos, estão todos ali, tal é a perfeição.

Uma curiosidade. Ron Mueck é genro da nossa grande pintora Paula Rego. E foi precisamente Paula Rego que lhe pediu que esculpisse para ela um Pinnochio para lhe servir de modelo para uma tela que ela pretendia pintar. Curiosamente, foi Pinnochio que abriu o caminho da fama e da fortuna para Mueck.

Enquanto não temos a possibilidade de admirar a sua obra nos nossos museus, nem de nos deslocarmo-nos à National Gallery ou à Tate Gallery de Londres, ao Hirshhorn de Washington, ao Modern Art Museum de Fort Worth, ao Modern Art de San Francisco, à National Gallery of Canadá em Ottawa ou à National Gallery of Austrália em Camberra, por onde tem distribuído a sua arte, apreciemos algumas fotografias das peças que mais me entusiasmaram.



Parabéns a Você - Uma rectificação necessária


Foi talvez a emoção de aniversariar, ou talvez mesmo o peso das tantas velas no bolo que já nem tive fôlego para as apagar, talvez, quem sabe, o inebriante borbulhar do espumante que me impediram de reproduzir na íntegra a belíssima poesia de João de Deus, que dediquei a mim próprio no dia em que fiz anos.

Agora, já mais calmo, penso que lhes devo a versão integral de “Dia de Anos”, não antes porém, de reiterar, tal como o fiz no passado dia 28 de Dezembro, os votos de “PARABÉNS A MIM”!

Então, aqui vai:

DIA DE ANOS

Com que então caiu na asneira
de fazer na quinta-feira
vinte e seis anos ... Que tolo!
Ainda se os desfizesse
Mas fazê-los não parece
de quem tem muito miolo.

Não sei quem foi que me disse
que fez a mesma tolice
aqui no ano passado ...
No que vem agora aposto
Como lhe tomou o gosto
que faz o mesmo, coitado!

Não faça tal ... porque os anos
que nos trazem? Desenganos
que fazem a gente velho.
Faça outra coisa ... que, em suma,
não fazer coisa nenhuma,
também lhe não aconselho.
Mas anos ... não caia nessa!
Olhe que a gente começa
às vezes por brincadeira
mas depois, se se habitua
já não tem vontade sua
e fá-los, queira ou não queira!

segunda-feira, janeiro 22, 2007

Boquiaberto


Ainda não recuperado do espanto e da indignação com que fiquei depois de conhecer a posição daqueles dois cónegos perante o aborto, de que vos falei ontem e já estou, de novo, em estado de choque.

E fiquei assim ao saber que cem mil jovens, de mais de 800 escolas públicas, com idades compreendidas entre os 11 e os 18 anos, foram questionados, entre muitas outras coisas, sobre se os pais (pais homens, claro está), “ou substitutos”, batiam, insultavam ou se obrigavam a fazer vida sexual com ele contra a vontade dela.

Eu sei que o inquérito pretendia avaliar se nas casas desses alunos havia situações de tensão familiar que pudessem vir a provocar violência doméstica. Percebo a preocupação. Louvo as iniciativas que tendam a acabar com esse problema terrível. Mas ...

Mas, como é que se pergunta a uma criança de 12 anos, por exemplo, se o pai (ou o substituto) obriga a mãe a ter relações sexuais? É um perfeito disparate! A pergunta em si mesma, é de uma falta de ética atroz. Mas fazer este tipo de perguntas a crianças que, regra geral, não têm acesso à vida íntima dos pais, nem têm que ter, é descabida, gratuita, despropositada e de uma enorme falta de bom senso.

Párocos e Argumentos


Tenho, naturalmente, assistido com muita atenção aos argumentos aduzidos pelos movimentos que estão a favor ou contra a despenalização do aborto e que vão ser referendados no próximo dia 11 de Fevereiro.

Para já, devo dizer que, na minha opinião, não faz muito sentido que se faça um referendo sobre esta matéria (se calhar os referendos não fazem mesmo sentido). Afinal, se nós votámos e demos um mandato de confiança aos nossos representantes para governarem o país em todas as situações, porque razão é que vamos ser chamados a opinar sobre uma matéria que deveria ser o Governo e a Assembleia a decidirem? Tal como o fizeram, por exemplo, os governos de Espanha, França e Holanda.
Mas isso é uma outra questão!

Como disse, tenho acompanhado toda esta feira que se montou, onde se cruzam as diversas opiniões e onde se gasta, também, muito dinheiro que seria melhor empregue noutras coisas, mas, o que me surpreende, é que depois de já ter vivido todos estes anos, julgava que já haveria pouca coisa que me conseguisse surpreender. Enganei-me!

Por exemplo, pensava que nunca ouviria um padre argumentar de forma tão canhestra como o fez o pároco de Castelo de Vide, Tarcísio Alves, que defendeu (ameaçou) que:

«quem comete um aborto tem sobre si a excomunhão da Igreja e exclui-se da comunidade cristã automaticamente. A prática da Interrupção Voluntária da Gravidez impede o acesso aos sacramentos e ao funeral religioso”.

Dirão que se trata, apenas, de mais um argumento a favor do “não” ... mas não. O padre Tarcísio Alves que escreve, também, no boletim paroquial, incita os fiéis a votarem “não” e faz uma campanha influenciando “o seu rebanho” com as consequências canónicas do aborto (que nem todos compreenderão, por certo), o que está impedido por lei de o fazer. Enquanto cidadão, pode ter e dar a sua opinião à vontade, mas como pároco é-lhe negada essa possibilidade. Aliás, a lei proíbe expressamente campanhas nas missas e os sacerdotes que apelarem directamente ao voto incorrem numa pena de prisão até dois anos.


Outro pároco que achou por bem dar testemunho público sobre o que pensa sobre este tema, o Reitor do Santuário de Fátima, disse que “prefere o aborto clandestino ao legal”. E explica: Se um marido engana a mulher é diferente ser no estrangeiro ou à sua frente”.

Perceberam a lógica deste argumento? Provavelmente, o senhor reitor pretendeu dizer “Olhos que não vêem ...”.



Independentemente do que cada um possa pensar sobre a questão da Interrupção Voluntária da Gravidez e a forma como vai votar no Referendo, tendo em conta os seus aspectos mais íntimos, nomeadamente, religiosos e éticos, o que é importante é que se saiba apresentar os argumentos de forma séria e honesta. E, com toda a sinceridade, não me parece que os párocos referidos o tenham feito.

quinta-feira, janeiro 18, 2007

“Livre pensar é só pensar”


Millôr Fernandes, para além de presença constante no jornalismo, escreveu e traduziu mais de cem peças de teatro, fez roteiros de filmes, letras de música, expôs pinturas e ainda encontrou tempo para escrever dezenas de livros. Uma obra que, por força da própria profusão, esteve, até há pouco, dispersa por aí.

Os Portugueses começaram a tomar contacto e a conhecer um pouco mais de Millôr Fernandes quando o autor teve uma colaboração assídua no extinto Diário Popular. Se a memória não me atraiçoa, todas as quartas feiras era publicada uma página com desenhos e frases de Millor. Traços e palavras ao serviço do pensamento inteligente e bem-humorado. Como é o exemplo da frase que dá título à crónica de hoje e que, de certa forma, me acompanhou durante a vida, mesmo nos tempos em que pensar não só não era livre como era até perigoso.

Cada pessoa é única, mas algumas pessoas são mais únicas do que as outras e Millôr Fernandes é uma delas. Não há ninguém como ele na história da arte brasileira. Não por causa da sua genialidade como cartoonista ou das suas qualidades como artista plástico, mas graças à maneira como consegue combinar as duas coisas no mesmo trabalho. Millôr não oscila entre o lado sério e o engraçado como fazem alguns. Ambos os aspectos são intrínsecos a todas as imagens que encantam e divertem a quem tem o privilégio de o ler.


Para exemplificar o humor inteligente de Millôr, trago-vos um texto deste homem genial.


“O Socorro”


Ele foi cavando, foi cavando, cavando, pois sua profissão - coveiro - era cavar. Mas, de repente, na distracção do ofício que amava, percebeu que cavara de mais. Tentou sair da cova e não conseguiu. Levantou o olhar para cima e viu que, sozinho, não conseguiria sair. Gritou. Ninguém atendeu. Gritou mais forte. Ninguém veio. Enlouqueceu de gritar, cansou de esbravejar, desistiu com a noite. Sentou-se no fundo da cova, desesperado. A noite chegou, subiu, fez-se o silêncio das horas tardas. Bateu o frio da madrugada e, na noite escura, não se ouvia mais um som humano, embora o cemitério estivesse cheio dos pipilos e coaxares naturais dos matos. Só pouco depois da meia-noite é que lá vieram uns passos. Deitado no fundo da cova o coveiro gritou. Os passos se aproximaram. Uma cabeça ébria apareceu lá em cima, perguntou o que havia: “O que é que há?”
O coveiro então gritou, desesperado: «Tire-me daqui, por favor. Estou com um frio terrível!». «Mas coitado!» - condoeu-se o bêbado. - «Tem toda razão de estar com frio. Alguém tirou a terra toda de cima de você, meu pobre mortinho!». E, pegando na pá, encheu-a de terra e pôs-se a cobri-lo cuidadosamente.


Moral: Nos momentos graves, é preciso verificar muito bem para quem se apela.

quarta-feira, janeiro 17, 2007

Uma história de vida


Há dias mão amiga fez-me chegar um mail que contava uma história. Infelizmente igual a tantas outras que conhecemos e que, cada vez mais, se vão multiplicando. De qualquer forma, o modo como ela é contada sensibilizou-me bastante.

Todos nos apercebemos que a nossa sociedade está doente, que existem grandes e cada vez mais acentuadas assimetrias entre as diversas camadas da população, e que estabelecem, claramente, formas muito desiguais de viver.

Como disse, é uma história banal, mas que nos faz reflectir sobre a realidade cruel das dificuldades da vida e da falta de oportunidades com que se confrontam muitas e muitas pessoas.

A amiga que me enviou o mail, “deu-me” duas opções:

- ou eu teria que enviar esta mensagem aos meus amigos e amigas;

- ou, simplesmente, fingia que a não tinha lido, que a história não me tinha interessado e “tocado” e o melhor seria apagá-la.

A verdade é que me senti abalado ao lê-la e, por isso, achei que o melhor seria publicá-la aqui no blog, na esperança de poder partilhar esta história de vida com mais gente. Vale a pena ler:


“Entrei apressado e com muita fome no restaurante. Escolhi uma mesa bem afastada do movimento, porque queria aproveitar os poucos minutos que dispunha naquele dia, para comer e acertar alguns bugs de programação num sistema que estava a desenvolver, além de planear a minha viagem de férias, coisa que há tempos que não sei o que são.

Pedi um filete de salmão com alcaparras em manteiga, uma salada e um sumo de laranja, afinal de contas, fome é fome, mas regime é regime, não é?

Abri o meu portátil e apanhei um susto com aquela voz baixinha atrás de mim:

- Senhor, não tem umas moedinhas?

- Não tenho, menino.

- Só uma moedinha para comprar um pão.

- Está bem, eu compro um.

Para variar, a minha caixa de entrada está cheia de e-mail. Fico distraído a ver poesias, as formatações lindas, rindo com as piadas malucas. Ah! Essa música leva-me até Londres e às boas lembranças de tempos áureos.

- Senhor, peça para colocar margarina e queijo.

Percebo nessa altura que o menino tinha ficado ali.

- Ok. Vou pedir, mas depois deixas-me trabalhar, estou muito ocupado, está bem?

Chega a minha refeição e com ela o meu mal-estar. Faço o pedido do menino, e o empregado pergunta-me se quero que mande o menino ir embora. O peso na consciência, impede-me de o dizer. Digo que está tudo bem. Deixe-o ficar. Que traga o pão e, mais uma refeição decente para ele.

Então sentou-se à minha frente e perguntou:

- Senhor, o que está fazer?

- Estou a ler uns e-mail.

- O que são e-mail?

- São mensagens electrónicas mandadas por pessoas via Internet (sabia que ele não ia entender nada, mas, a título de livrar-me de questionários desses):

- É como se fosse uma carta, só que via Internet.

- Senhor, você tem Internet?

- Tenho sim, é essencial no mundo de hoje.

- O que é Internet ?

- É um local no computador, onde podemos ver e ouvir muitas coisas, notícias, músicas, conhecer pessoas, ler, escrever, sonhar, trabalhar, aprender. Tem de tudo no mundo virtual.

- E o que é virtual?

Resolvo dar uma explicação simplificada, sabendo com certeza que ele pouco vai entender e deixar-me-ia almoçar, sem culpas.

- Virtual é um local que imaginamos, algo que não podemos tocar, apanhar, pegar... é lá que criamos um monte de coisas que gostaríamos de fazer. Criamos as nossas fantasias, transformamos o mundo em quase como queríamos que fosse.

- Que bom isso. Gostei!

- Menino, entendeste o significado da palavra virtual?

- Sim, também vivo neste mundo virtual.

- Tens computador?! - Exclamo eu!!!

- Não, mas o meu mundo também é vivido dessa maneira...Virtual. A minha mãe fica todo dia fora, chega muito tarde, quase não a vejo, enquanto eu fico a cuidar do meu irmão pequeno que vive a chorar de fome e eu dou-lhe água para ele pensar que é sopa, a minha irmã mais velha sai todo dia também, diz que vai vender o corpo, mas não entendo, porque ela volta sempre com o corpo, o meu pai está na cadeia há muito tempo, mas imagino sempre a nossa família toda junta em casa, muita comida, muitos brinquedos de natal e eu a estudar na escola para vir a ser um médico um dia. Isto é virtual não é senhor???

Fechei o portátil, mas não fui a tempo de impedir que as lágrimas caíssem sobre o teclado. Esperei que o menino acabasse de literalmente "devorar" o prato dele, paguei, e dei-lhe o troco, que me retribuiu com um dos mais belos e sinceros sorrisos que já recebi na vida e com um "Brigado senhor, você é muito simpático!".

Ali, naquele instante, tive a maior prova do virtualismo insensato em que vivemos todos os dias, enquanto a realidade cruel nos rodeia de verdade e fazemos de conta que não percebemos!”


É uma história forte, não acham? Seria bom pararmos por uns momentos para reflectir...

terça-feira, janeiro 16, 2007

Conversemos...


Uma das coisas que mais gosto de fazer e que, ao mesmo tempo, mais me entristece, porque quase já não existe, é ter “uma boa conversa”. As pessoas deixaram de conversar, deixaram de se encontrar e de organizar tertúlias onde tantas vezes se discutia arte, música, política e até desporto. E deixaram-se disso porquê? Porque hoje se vive em correria permanente, em stress contínuo, não há tempo para se estar com as pessoas, e isso, impossibilita a comunicação. E, se não temos tempo para estar com os outros, lá se vão a gentileza, a disponibilidade e a imaginação que uma boa conversa pressupõe.

E depois há televisão, os computadores, os MP3 e os telemóveis que, por uso desmedido, não ajudam em nada, o encontro entre as pessoas. Ao contrário, deixam-nos “pregados” aos respectivos aparelhos, isolados de tudo e de todos.

A dificuldade em comunicar está a generalizar-se.
As pessoas apenas têm nada para dizer às outras pessoas.

E quem fala mal ou não fala mesmo, normalmente escreve mal. Facto que se agravou com a introdução de uma escrita cifrada introduzida pelas novas gerações, com o uso “quase doentio” dos telemóveis. “Escrever”, neste caso, claro que é uma força de expressão. Se bem que os especialistas na matéria garantem que os telemóveis inventaram uma nova linguagem e, até, uma nova literatura. Querem um exemplo de uma mensagem que eu recebi?

“esta msg n é p akeles de kem me lembrei, mas sim p akeles k nunca pretendo eskecer”

Perante isto, quem sou eu para discordar?

Contudo, gostava de saber que linguagem é essa que se exprime de forma tão rude, quase sempre por recurso a pressupostas piadas ou a pensamentos de figuras célebres? Onde estão as ideias próprias, como são transmitidos os sentimentos e os afectos? E quanto à escrita, estamos falados. Eu sei que há que poupar o espaço e o tempo porque as mensagens a enviar são às dezenas. Mas, meus amigos, há limites para tudo. Porque, afinal, a escrever também estamos a conversar.

E termino, evocando dois pensamentos indianos, cheios de sabedoria, que vêm reforçar a minha teoria de que uma das melhores coisas da vida é “uma boa conversa”.

“Casa-te com alguém que goste de conversar”; e

“Quando envelheceres, a habilidade no conversar será mais importante do que qualquer outra coisa”.

segunda-feira, janeiro 15, 2007

Competente e esquecido...


O tempo do PREC já lá vai há muito. Nessa época, era frequente assistirmos à nomeação para cargos de administração, de pessoas que apenas se sabia serem do círculo de amizades de quem tinha o poder nessa altura ou, pior ainda, de pessoas que eram militantes do partido do governo. Critérios como competência, profissionalismo, honestidade e formação adequada para os cargos, não eram sequer considerados.

Poder-se-ia ser levado a pensar que no Portugal de hoje, país que pertence à União Europeia, que faz parte do clube fundador do euro, que está no grupo dos mais evoluídos do mundo (embora nós, os cidadãos, não sintamos isso nos bolsos e, como país, estejamos à beira de apenas poder ser comparáveis com os dois últimos países que entraram em Janeiro para a Europa dos 27), poder-se-ia pensar, dizia, que hoje em Portugal haveria o bom senso de aproveitar os melhores talentos e se escolheria apenas os mais capazes para gerir as empresas e o país. Puro engano! Ainda hoje, e ainda por motivos políticos, continuam-se a esquecer aqueles que mais sabem, os que estão melhor preparados e os que já deram provas suficientes de serem competentes nas mais diversas áreas.

O nome de Arménio Matias não dirá grande coisa à maioria das pessoas, mas a verdade é que este senhor já foi administrador da CP (entre 1985 e 1990), administrador da Teledifusão de Portugal (telecomunicações), administrador do Metro do Porto, do Metro do Mondego e da Rave (Rede Ferroviária de Alta Velocidade), onde foi, aliás, um dos responsáveis pelo desenho da rede de alta velocidade.

Desde que saiu da administração da Rave, em meados de 2001, e voltou à CP, os sucessivos conselhos de gerência da empresa não lhe atribuíram qualquer função ou tarefa, muito embora Arménio Matias tivesse comunicado, por diversas vezes, que aceitaria qualquer função que lhe fosse atribuída.

O facto é que Arménio Matias, um dos quadros mais conhecidos do sector ferroviário, durante cinco anos e meio limitou-se a participar em três reuniões de quadros da empresa e nada mais lhe foi dado para fazer. "Estive rigorosamente sem fazer nada", afirmou.

É legítimo que se pergunte. Será que Matias já não correspondia às expectativas de quem comandava a CP, ou que ele estava desactualizado ou desmotivado? Bem, se fosse isso, porque é que não o reformaram?

Não, nada disso deve ter acontecido. Eu penso que simplesmente se esqueceram dele (?) e, por isso, deixaram-no sem funções durante tanto tempo, desaproveitando todo o seu saber, mas não se esquecendo, porém, de lhe pagarem 100 mil euros por ano, mais telemóvel, mais automóvel e secretária.

Este é mais um caso de má gestão de uma empresa de capitais públicos. Um entre tantos outros. Um que veio a público, apenas porque Arménio Matias decidiu contar a sua história num blog que criou especificamente para o efeito, e onde afirma que o seu não é caso único e que há mais quadros qualificados na prateleira, enquanto as sucessivas administrações da CP vão contratando outras pessoas no exterior.

Por estas e por outras, é que eu continuo a perguntar “Quando é que, finalmente, as administrações das empresas e dos institutos públicos começam a ser responsabilizadas pelos seus actos de má gestão, que, em certas situações, poderiam até passar pela responsabilidade civil e/ou criminal dos próprios administradores?”. Quando é que vai haver coragem para isso?

domingo, janeiro 14, 2007

Tradições


Apesar de pertencermos à União Europeia, de onde emanam as directrizes que orientam, regem e submetem todos os Estados que a ela aderiram, continuo sinceramente a acreditar que há coisas em que muito dificilmente os povos deixarão de manter vontades próprias. Nomeadamente as que têm a ver com o festejo de certas tradições de muitos anos, algumas delas arreigadas a usos e costumes que foram transmitidos de pais para filhos, ao longo de sucessivas gerações.

Tradições, dizia, que devem, ou deveriam, continuar. Mas todas elas? Obviamente que não ...

Neste fim-de-semana fiquei deveras chocado ao ler uma notícia sobre uma dessas tais tradições, que um qualquer decreto, directiva ou lei, vinda de Bruxelas, de Estraburgo ou ali mesmo de S. Bento, devia por um ponto final e, se possível, imediatamente.

Dizia a notícia que numa aldeia do concelho de Mirandela, as crianças a partir dos dois anos são incentivadas pela família a fumar durante os dois dias de celebração da Festa dos Reis. Os pequenos fumam o maior número possível de cigarros e os adultos gravam as “proezas” em vídeo para as poderem recordar a vida inteira.

E esta incrível e impune façanha é feita em nome da preservação de uma tradição centenária que ninguém sabe explicar como nasceu e de onde surgiu.
É absolutamente irreal como a ignorância e a falta de bom senso das famílias e a inexplicável ausência das autoridades que deveriam assegurar e proteger as nossas crianças, permitam que em pleno século XXI se continue a perpetuar uma “tradição” que, por tão selvagem, seria mais fácil de a encontrarmos num qualquer país (dos mais atrasados) do terceiro mundo.

quinta-feira, janeiro 11, 2007

Uma questão de músculos


Provavelmente porque não sou jurista, não consigo entender as razões que levam a Associação Sindical de Juízes a defender que não se pode falar de violência doméstica em casais homossexuais, em virtude de não haver “superioridade física”.

Penso, no entanto, que não será necessário ser formado em leis para rebater tão abstruso argumento.

Primeiro, porque nos casais heterossexuais pode não haver a tal “superioridade física” a que a Associação Sindical de Juízes alude . Basta imaginar que ambos têm uma compleição física equivalente e que, em matéria de forças, um não suplanta o outro.

Segundo, porque nos casais homossexuais também existem situações em que um dos elementos é claramente superior, em termos físicos, ao outro.

Terceiro, porque as leis devem ser aplicadas a todos, sem distinção e independentemente da côr, da religião ou da opção sexual de cada um.

Quarto, e por aqui me fico porque não será difícil arranjar mais argumentos, porque a violência doméstica não se confina à agressão física, a uma tareia dada pelo mais forte ao mais fraco.

A violência doméstica passa igualmente pelos maus tratos psicológicos, pela agressão verbal, pela humilhação e por tantas outras formas que nada têm a ver com a “superioridade física” de um dos elementos do casal.
É por isso que, se afinal tudo se resume a uma questão de músculos, sou capaz de concordar com o Daniel de Oliveira quando ele, sobre esta matéria, se interroga “E que tal um braço-de-ferro antes da sentença?”

quarta-feira, janeiro 10, 2007

Então em que ficamos?


Quando o Ministro da Economia, Manuel Pinho, decidiu nomear Vítor Santos para presidir à Entidade Reguladora do Sector Eléctrico (ERSE), de que já era, aliás, vogal do Conselho de Administração, o líder do PSD, Marques Mendes, contestou a indigitação de Vítor Santos.

Quando Manuel Pinho pretendeu nomear José Carvalho Neto, para vogal deste mesmo conselho, Marques Mendes, ignorando que José Carvalho Neto é um especialista em gás, e que até já fazia parte dos quadros da própria ERSE, voltou a contestar só porque o indigitado era assessor do próprio Ministro e afirmou que a confirmar-se a nomeação de Carvalho Neto, “acaba a regulação e começa a obediência”. Mendes acrescentou, ainda, que este quadro demonstra que “o Governo perdeu a vergonha”.

Perante esta posição tão acalorada do líder da oposição, o Ministro Pinho, homem inteligente, reconsiderou a sua opção e, para demonstrar que estava de boa fé neste processo, retrocedeu na posição anteriormente assumida e “apeou” José Carvalho Neto para optar por um outro nome, este ligado ao PSD, e nomeou José Braz para vogal da ERSE.

Braz que foi um antigo secretário de estado de Braga de Macedo num governo de Cavaco Silva é amigo de longa data de Manuel Pinho a quem, por acaso, um dia, o nomeou para Director-Geral do Tesouro.

E agora, Dr. Marques Mendes, vai ou não protestar? Continua a achar que o governo perdeu a vergonha ou porque José Braz lhe é próximo politicamente, o equilíbrio de forças ficou mais compostosinho e portanto vai ficar calado?
Não se tratará antes, pergunto eu, de um pagamento de favores, uma vez que Manuel Pinho foi nomeado para um cargo por José Braz e, agora, é este que é nomeado para um outro cargo por Manuel Pinho? É que os dois estiveram juntos no FMI durante a década de 80 e são amigos do peito.

Nestas coisas da política, há razões que a razão desconhece ... e que à população faz muita confusão.

terça-feira, janeiro 09, 2007

Por esta é que eu não esperava!


Quando li a notícia nos jornais, a primeira coisa que fiz foi correr a uma farmácia para comprar Xanax, porque já sabia que ia começar a ter grandes insónias.

Então não é que os jogadores profissionais de futebol ameaçaram fazer greve, o que quer dizer que, todos nós, corremos o altíssimo risco de ficar sem ver futebol à sexta, ao sábado, ao domingo e, às vezes, até à segunda-feira?

Temos a experiência que chegue para sabemos que podemos aguentar com os aumentos da electricidade, com os dos transportes, podem-nos até reduzir os salários, mas, por favor, não nos deixem sem futebol.

Mas, perguntarão, porque é que os jogadores profissionais vão fazer greve, afinal, com o que é que eles estão insatisfeitos?

Apenas e só porque o Governo decidiu acabar com o regime transitório que permitia aos agentes desportivos profissionais pagar impostos sobre uns escassos 60% dos seus rendimentos e que, agora, vão começar a pagar, já a partir deste ano, IRS sobre todos os rendimentos auferidos. O que significa, que os futebolistas profissionais passam a ser tratados como todos os outros contribuintes, isto é, começam a pagar impostos sobre todos os seus rendimentos (salários, prémios de jogo ou direitos de imagem).

Claro está que o Sindicato dos Jogadores Profissionais já fez saber que não se conforma com o fim do regime fiscal até aqui em vigor, que era mais favorável para os jogadores. Alegam que se trata de uma profissão de desgaste rápido e, como tal, justifica-se que haja um regime de excepção.

Nada mais justo. Aliás, acho mesmo que se os jogadores profissionais de futebol se juntarem aos mineiros, aos pescadores, aos atletas profissionais de outras modalidades, aos modelos, aos cirurgiões, aos criativos publicitários e a todos os que sejam considerados como tendo uma profissão de desgaste rápido, têm uma grande possibilidade de levar de vencida o vosso propósito.

Já agora, acolham no vosso protesto, os milhões de pensionistas e reformados que auferem pensões e reformas insuficientes para pagar o aluguer da casa, a farmácia e para enganar a fome e os milhares de desempregados (de curta ou de longa duração, jovens ou menos jovens) que não conseguem arranjar emprego que lhes pague as contas e lhes acalente uma perspectiva de vida digna. E não se esqueçam de chamar, também, os milhares de jovens que são explorados com salários baixíssimos, pagos em recibos verdes e que não têm direito sequer a subsídios de almoço, de férias, de Natal, nem de desemprego, que é para onde muitos vão parar e de onde é difícil sair, esta sim, uma das profissões de mais rápido desgaste.


Ainda há dias ouvi dizer a um responsável de um dos organismos que gere o futebol que as pessoas têm a tendência para olhar só para os jogadores de proa e pensar que todos os jogadores têm ganhos equivalentes a eles. E acrescentou que, segundo dados estatísticos, em 2004 os jogadores da primeira liga nacional ganhavam em média 5.000 euros por mês.

Desde 2004 até agora, a situação evoluiu. Se é certo que o ordenado mínimo dos jogadores da I Liga é de 1.400 euros, o salário médio ronda os 10.000 euros. O que significa que, em termos de salários médios, houve um aumento para o dobro em menos de dois anos. Gostava de saber quantas actividades é que tiveram tamanho aumento.

Mesmo considerando os vencimentos de 2004, se eu tivesse tido a oportunidade de entrevistar o tal dirigente, ter-lhe-ia perguntado se não considerava que esses míseros 5.000 euros eram substancialmente mais elevados que o salário mínimo de 385,90 euros, pagos a milhares de trabalhadores em 2006? Ou será que o trabalho de um jogador de futebol é muito mais importante e digno que a tarefa desempenhada por qualquer outro trabalhador de outra qualquer actividade?

Há quem afirme que há jogadores que ganham mais num ano do que 80% dos portugueses em toda a sua vida de trabalho. Não sei se isso corresponde à verdade, mas se nos pusermos a fazer contas, verificaremos facilmente que um trabalhador que auferira o salário mínimo nacional, necessita de trabalhar um ano inteiro para ganhar o mesmo que um jogador médio da primeira liga (dos tais que ganhavam 5.000 euros) ganha num único mês. É obra!

Mas o que é curioso (ou triste) no meio de toda esta obscenidade, é que este regime especial para os jogadores de futebol já deveria ter terminado há muito, mas os sucessivos governos optaram por não actualizar a tributação.
Há, ainda, uma outra curiosidade bastante original neste processo. É que, ao contrário do que acontece normalmente, a anunciada greve não vai ser feita contra uma entidade patronal mas contra uma medida legislativa do governo...

segunda-feira, janeiro 08, 2007

É tempo de recuperar!


Depois dos excessos cometidos nestas últimas semanas, com as comezainas próprias da época, será bom pensar em retomar a boa forma física e tentar perder aqueles quilitos a mais provocados pelos fritos, chocolates e todas aquelas tentações a que não conseguimos resistir.

Longe vai o tempo em que se dizia que “gordura era formosura”, ou que “os gordos são sempre os mais bem dispostos”. Os conceitos mudaram, mas, hoje, esta coisa de se estar mais ou menos gordinho, tem que se lhe diga.

Boa parte da população, sobretudo as pessoas que têm um nível cultural e académico mais alto, estão hoje conscientes que determinado tipo de alimentação e de vida nos conduzirão a uma obesidade certa e a todos os problemas a ela associados.


A comprovar o que acabo de escrever, olhe-se para um estudo efectuado por uma equipa de investigadores franceses que descobriu que existe uma relação directa entre o excesso de peso e a perda de memória. O trabalho que foi realizado com homens e mulheres dos 32 aos 62 anos concluiu, também, que há uma ligação entre a obesidade e as doenças senis, especialmente nos idosos, mas que engloba já um leque bastante alargado de população mais jovem e, aparentemente, mais saudável.

Outros cientistas, estes americanos, chegaram a conclusões idênticas, também chamaram a atenção para os malefícios da obesidade em geral mas, no entanto, fizeram, uma revelação inesperada:

os homens pesados saiem mais facilmente ilesos de acidentes de viação”.

Afirmam estes cientistas americanos que o pneu de gordura (a chamada barriga de cerveja) dos homens pode funcionar como um airbag anatómico que ajuda a absorver o impacto do choque. Mas atenção, isto só se aplica aos homens porque, nas mulheres, a gordura tem tendência para se alojar noutras áreas do corpo, que não na barriga.


Não se iludam, porém, os meus amigos, nem arranjem desculpas para conservar a barriguinha, na esperança de que ela vos possa trazer alguma vantagem.

Não, na verdade o que necessitamos mesmo é de estarmos bem fisicamente e, para isso, é necessário que tenhamos um pouco mais de cuidado com o que comemos (não deixem de comer mas façam uma alimentação variada e tenham atenção aos excessos) e que façamos exercício regularmente.
Não é um sacrifício demasiado pesado, pois não?

domingo, janeiro 07, 2007

Portugal vale a pena


Nada melhor para começar um novo ano do que dar lugar – e com um certo destaque - a uma boa dose de optimismo (pelo menos ao optimismo possível) e esquecer, por uns momentos que seja, as enormes dificuldades que todos nós vamos sentindo. Sabemos que o dia-a-dia não é nada fácil e que o garrote fiscal e o aumento das taxas de juro apertam cada vez mais, deixando sufocadas a maioria das famílias portuguesas.

Contudo, e apesar de tudo, peço-vos que tentemos esquecer a montanha de problemas que se abatem sobre os nossos ombros e vamos pensar positivo nem que seja só pelo dia de hoje.

Aliás, e se repararem bem, nem tudo é mau neste nosso país e ainda há muita coisa capaz de nos deixar orgulhosos. Em suma, continuamos a acreditar nas potencialidades do país e dos portugueses e de que Portugal vale a pena.

Desde há muito que se discute a questão da falta de produtividade das nossas empresas e, consequentemente, de quem é a culpa, se do modelo de organização das empresas se da falta de empenho e de preparação dos trabalhadores.
Nós próprios, já abordámos este assunto por diversas vezes neste espaço e opinei, então, que o baixo nível de produtividade deve-se, sobretudo, ao fraco nível de planeamento e organização das empresas e à sua insuficiente gestão operacional. Mas deve-se, também, à falta de liderança e de supervisão e aos sistemas de controlo que, muitas vezes, são desadequados. Haverá também, certamente, alguma falta de motivação dos nossos trabalhadores mas a realidade é que os conhecidos casos de sucesso de pequenas e médias empresas vão-se alastrando e a nossa conhecida postura de cepticismo vai-se dissipando, a pouco e pouco e acreditando que o nosso país tem condições para produzir mais e melhor e tornar-se credível por esse mundo fora.
Aliás, em artigos publicados em vários jornais e revistas, o conhecido economista Nicolau Santos lembrava alguns desses sucessos que nos deviam deixar orgulhosos. Vejam só:
- Portugal tem uma das mais baixas taxas de mortalidade de recém-nascidos do mundo, melhor que a média da União Europeia.
- Quando necessitam de “software” de gestão ferroviário, o metro de Londres e os caminhos-de-ferro da Holanda, Noruega, Finlândia e Dinamarca, procuram empresas portuguesas;
- Em situações críticas dos respectivos sistemas, a Nasa e a Agência Espacial recorrem frequentamente à tecnologia portuguesa;
- Empresas como a Sansonite, a Nokia, a Mercedes Benz e a Porches procuram o “design” e a engenharia da indústria portuguesa de moldes;
- Há 26 milhóes de americanos que dormem em lençois portugueses;
- Portugal lidera as exportações europeias de têxteis-lar e é o terceiro maior exportador do mundo;
- Criamos e exportamos para vários países, fatos inteligentes para bombeiros, que retardam a acção do fogo ou que são anti-bactérias, ou que desenvolvem propriedades terapêuticas e hidratantes;
- Portugal lidera a tecnologia do calçado e é o terceiro exportador europeu. Noventa milhões de pessoas em todo o mundo calçam sapatos portugueses;
- Foram técnicos portugueses que inventaram e desenvolveram os cartões pré-pagos para telemóveis;
- O nosso país lidera a oferta de tecnologia para “call centers”;
- Somos o país onde tem sede uma empresa que é líder mundial de tecnologia de transformadores;
- Somos também o país que é líder mundial na produção de feltros para chapéus. Robert De Niro, por exemplo, usa chapéus portugueses;
- Na criação e gestão de centros comerciais também somos o líder europeu.

A lista de sucessos é tão exaustiva que temo maçar-vos com tantas áreas em que as nossas empresas são realmente boas a nível europeu e mundial. Mas porque estamos habituados a sermos um povo demasiado deprimido, porque estatisticamente temos sempre os piores indicadores da Europa em todas as áreas, porque nos queixamos que vivemos num país que não acompanha o progresso e que em cada ano se atrasa mais em relação à Europa, ainda lhes quero dar conta de mais umas quantas actividades em que somos igualmente bons.

Dominamos 75% do mercado mundial de identificação pessoal; temos empresas que estão classificadas entre dos dez maiores grupos mundiais de louças de porcelana; estamos na primeira linha dos países que trabalham no campo da saúde, quer na luta contra doenças para as quais não se conhece ainda a cura, quer na preservação de células estaminais para a medicina regenerativa; temos dos melhores vinhos mundiais; temos uma máquina de emissão de passaportes electrónicos única no mundo, que lê nove pontos da pessoa em 90 segundos, tira a foto em positivo e até acerta pormenores como o desvio do olhar; personalidades mundiais vestem-se e calçam-se com produtos feitos em Portugal; inventamos jogos para telemóveis e vendemo-los para mais de meia centena de mercados; inventámos um sistema biométrico de pagamentos nas bombas de gasolina e uma bilha de gás muito leve que já ganhou vários prémios internacionais; temos um dos melhores sistemas de Multibanco a nível mundial, onde se fazem operações que não é possível fazer na Alemanha ou na Inglaterra; estamos avançadíssimos na investigação da produção de energia através das ondas do mar; temos uma empresa que analisa o ADN de plantas e animais e envia os resultados para os clientes de toda a Europa por via informática.
Para terminar, recordar-lhes, ainda, que inventámos e desenvolvemos um sistema muito cómodo de passar nas portagens das auto-estradas, que vamos lançar um medicamento anti-epiléptico no mercado mundial, que somos líder mundial na produção de rolhas de cortiça e que se está a construir ou já construiu um conjunto de projectos hoteleiros de excelente qualidade um pouco por todo o mundo.

Então, o que me dizem? Para um país, onde nós portugueses, andamos a queixarmo-no de tudo e de todos, que temos medo dos chineses e dos espanhois, que tememos que possamos desaparecer do mapa, o panorama não parece ser tão mau como isso.
Tanto mais que, tudo o que leu acima, foi feito por empresas fundadas por portugueses, desenvolvidas por portugueses, dirigidas por portugueses, com sede em Portugal, que funcionam com técnicos e trabalhadores portugueses.
Já para não falar nas grandes empresas multinacionais instaladas no País, mas dirigidas por portugueses, trabalhando com técnicos portugueses, que há anos e anos obtêm grande sucesso junto das casas mãe, nos países de origem.

Está na altura de olharmos para o que de muito bom temos feito, e não só no que diz respeito à actividade futebolística, de nos orgulharmos com isso e de nos sentirmos motivados para novas iniciativas de sucesso. De, enfim, mostrar ao mundo que somos um país moderno, líderes de uma série de actividades vencedoras, de bons trabalhadores e não, como é hábito, de exibir o que não corre bem, acompanhado, invariavelmente, por fotografias de um povo envelhecido, triste e incapaz.

Para os portugueses, 2006 foi um ano duro e 2007 não o será menos. Vamos continuar a sentir imensas dificuldades por mais alguns anos, seguramente. Mas acredito que com exemplos de sucesso como aqueles que referimos, e outros que se seguirão, Portugal e os portugueses poderão ter um porvir mais risonho num futuro não muito distante.
Esta a mensagem de optimismo que vos quiz expressar, neste começo do novo ano de 2007. E se, mesmo assim, não conseguirem ter uma atitude optimista, então, pelo menos, e como disse, nem que seja só pelo dia de hoje, vejam se conseguem ser, ao menos “optimistas cépticos”, como diz a canção.