terça-feira, fevereiro 27, 2007

Uma estratégia


Nunca entendi lá muito bem como é que as pessoas conseguem comer um croissant, acompanhado, por exemplo, por um garoto ou um café. Porque, a verdade é que o croissant, por pequeno que seja, ainda leva tempo a comer e o café, por muito cheio que esteja, arrefece muito rapidamente. E, para mim, café só quente. Exactamente por isso é que me faz confusão como é que um indivíduo depois de comer o bolo a seco, ainda tem a coragem suficiente para beber um café que está completamente frio. Ou seja, parece haver bolo a mais para um café tão pequeno.

Muito embora, para mim, fizesse mais sentido acompanhar o croissant com um galão quentinho, seguido, quando muito, de uma bica a escaldar, o certo é que, uma vez por outra, também alinho nesse tipo de incongruências e sigo essa prática de comer um croissant acompanhado de um café.

Mas para que o café não venha frio, adoptei uma táctica que é a de pedir, pausadamente e por esta ordem, um croissant e um café, convencido de que quem estava a servir-me, iria seguir escrupulosamente, o meu pedido, dando-me em primeiro lugar o croissant e só depois o café. Assim, e enquanto atacava uma boa parte do bolo, o empregado tirava a bica e quando ela chegasse junto de mim ainda vinha razoavelmente quente.

Com o tempo, comecei a verificar que, muito embora pedisse sempre “um croissant e um café”, o café chegava invariavelmente antes do bolo, pelo que, não tinha outro remédio senão beber uma segunda bica, essa sim, que vinha quente.

Quando me convenci que a ordem do pedido se processava na cabeça dos empregados pelo última coisa pedida, isto é, um croissant e um café, logo vamos já tirar o café e a seguir vou buscar o bolo, mudei de estratégia e comecei a pedir “um café e um croissant”.

Tudo indicava que o empregado me poria em cima do balcão em primeiro lugar o croissant e que o café viria depois. Puro engano o meu. A lógica que me parecia ser a mais correcta, ruiu como um baralho de cartas. O café continuou a vir em primeiro lugar e só depois o croissant.

Desse por onde desse, o café vinha sempre em primeiro lugar.

Vencido embora, não me deixei abater e tentei uma nova estratégia que, até agora, tem dado bons resultados. Deixei de pedir um café e um croissant e comecei a pedir “um café escaldado e uma miniatura de pastel de nata”.

Assim, eu já sei que o café vem na frente, como sempre, mas como vem a ferver, eu tenho o tempo suficiente para engolir a miniatura do nata e ainda de ir a tempo de beber a bica bem quente.

Como se costuma dizer, “quem não tem cão, caça com gato”!

Lengalengas


Hoje lembrei-me de vos fazer uma pergunta difícil. Por acaso, sabem o que é uma lengalenga? Se calhar o nome não vos é estranho, mas a maioria de nós, não faz a mínima ideia do que é isso.

Mesmo para aqueles que conhecem o termo, não existe um consenso quanto à sua definição. Enquanto que, segundo o dicionário, uma lengalenga é uma narração fastidiosa e extensa, para outros, lengalengas são jogos de palavras com rimas e ritmos surpreendentes, que registam uma espécie de cumplicidade entre adultos e crianças e onde a diversidade do sentido das palavras e das frases fazem, por vezes, de textos divertidos, quebra-cabeças sem saída.

Vejam, pois, um exemplo de uma lengalenga:

Pomba, laranja,
Lima, limão,
Café, cacau,
Pimenta, colorau

Tropecei na roseira,
Quebrei-lhe um galho,
Segura-me o braço,
Se não, eu caio!


Outra lengalenga:


Pato, parreco, caiu ao rio,
Foi para casa a tremer de frio,
Foi ao doutor, deu-lhe uma dor,
Foi ao tendal, foi-se-lhe o mal!

Mais uma:


Somos sete em geração:
O primeiro é pateta,
O segundo é anão,
O terceiro é careca,
O quarto é surdo-mudo,
O quinto é desdentado,
O sexto é barrigudo,
O sétimo é chanfrado.

Destes sete que nós somos,
Ainda sou o mais perfeito,
Se não fosse ser marreca,
tinha sido o mais direito!



Ainda outra lengalenga, aliás, das que mais gosto:


O tempo perguntou ao tempo,
Quanto tempo o tempo tem.
O tempo respondeu ao tempo,
Que o tempo tem todo o tempo,
Quanto tempo o tempo tem!

domingo, fevereiro 25, 2007

Falta de tempo


Carta de Fernando Pessoa a Armando Côrtes-Rodrigues (poeta e prosador açoreano –1891/1971), datada de 19 de Setembro de 1915.


Meu caro Côrtes-Rodrigues

Felizmente para mim tenho tido bastante que fazer. Sobra-me tempo apenas, portanto, para estas linhas. Escrevo-lhe para lhe dizer que não lhe não posso escrever: é mais um paradoxo do muito e sempre seu

Fernando Pessoa

quinta-feira, fevereiro 22, 2007

Um esclarecimento


Não posso deixar de dar uma resposta a um comentário que foi feito ao texto publicado ontem, sob o título Santa Ignorância!

Meu Caro Ignorante, felizmente que TODOS somos bastante ignorantes em muitas matérias, o que, de certa forma, nos dá um gozo especial em irmos aprendendo sempre um pouco mais durante a vida toda.

Mas se, por um lado, nunca apontaria o dedo a um ignorante que mostrasse vontade de conhecer um pouco mais, por outro ficaria um deveras abespinhado se essa pessoa se mostrasse um pouco arrogante. O que me pareceu ser o seu caso, ao tentar branquear um compositor que foi de facto grande e que, se calhar, não teve mais reconhecimento público porque o Estado Novo não o deixou. Ainda assim, se procurar bem na net, acabará por recolher informação abundante sobre Jorge Peixinho.

Para quem nem sequer sonhava que houve um compositor e músico chamado Peixinho, não valerá a pena mencionar outros nomes, nacionais ou estrangeiros, com quem ele aprendeu e tocou. Nomes bem conhecidos por quem se interessa por música erudita.

Bastará, portanto, que lhe diga que Jorge Peixinho terminou em 1958 o Curso Superior de Piano no Conservatório Nacional. Como bolseiro da Fundação Gulbenkian, aperfeiçoou-se em Composição em Roma entre 1959 e 1961. Frequentou na década de1960, os cursos internacionais de composição de Darmstadt, onde participou em obras colectivas orientadas por Stockhausen. Em Lisboa, Peixinho divulgou, com grande escândalo, a música de John Cage (1961, 1964) e dirigiu cursos de música contemporânea. Em 1970, fundou o influente Grupo de Música Contemporânea de Lisboa, que dirigiu até à sua morte, tendo-se apresentado com ele em diversos países da Europa e da América do Sul.

Jorge Peixinho recebeu vários prémios nacionais de composição:

O Prémio do Conservatório Nacional em 1958,
o Sassetti em 1959,
o da Casa da Imprensa em 1972,
o Gulbenkian em 1974,
o da S.P.A. em 1976 (duas categorias),
o do Conselho Português da Música em 1984,
o da S.P.A. em 1985 (categoria de música de câmara) e, finalmente,
o Prémio Joly Braga Santos em 1988.

Foi professor no Conservatório de Música do Porto (1965-1966) e na Escola de Música do Conservatório Nacional em Lisboa (1985-1995).

Quanto à sua obra, cuja criação esteve sempre sujeita à censura do regime anterior, a sua peça mais emblemática teve o nome de CDE. Jorge Peixinho escolheu a sigla CDE, não apenas pelas óbvias motivações políticas, mas, também, segundo as suas palavras, "identificando-a musicalmente à designação das notas na terminologia germânica: (DÓ= C) (RÉ= D) (MI= E)", sendo nessa identificação que reside "o princípio estrutural sobre o qual assenta toda a organização formal". De notar que, todos os especialistas, consideraram esta composição inteligente e criativa

Mas as suas preocupações de carácter político manifestou-as igualmente noutras composições em que também provou que a mais inteligente música instrumental consegue evidenciar essas mesmas preocupações. É esse o caso de:

Quatro Peças Para Setembro Vermelho (1972),

Morrer Em Santiago (1973),

A Aurora do Socialismo,
e "Madrigale Capriccioso" (1975),

Elegia a Amílcar Cabral (1973),

E a banda sonora que compôs para o filme Brandos Costumes, de Alberto Seixas Santos (1972).

Como vê, Jorge Peixinho é, indubitavelmente, um compositor contemporâneo e tenho pena que as escolas, as televisões e os meios de comunicação em geral, não divulguem este português que foi, de facto, notável.

Espero que tenha conseguido responder às suas interrogações.

quarta-feira, fevereiro 21, 2007

Santa Ignorância!

Num programa que o segundo canal transmitiu há pouco tempo, discutia-se, basicamente, a qualidade da música que se faz em Portugal e as razões que levam as rádios a emitir, ou não, a música e os músicos portugueses nas suas antenas.

Eram convidados Manuel Moura dos Santos, Emanuel e uma senhora que deve ter um cargo qualquer importante na antena 3, e que eu não consegui fixar o nome.

Detive-me por lá um bom bocado porque cada um dos convidados fazia parte de mundos musicais completamente diferentes e a conversa estava muito animada.

Todos eles esgrimiam os seus argumentos, até que, Manuel Moura dos Santos, naquele seu estilo truculento e mal disposto, contestando uma afirmação da tal senhora, e olhando-a fixamente nos olhos, disse em tom sério “... e claro está que não estou a referir-me apenas à música do peixinho...”

A assistência tomou a afirmação como uma graça, deve ter pensado que ele se estava a referir ao “glu-glu” que os peixinhos fazem debaixo de água e ouviu-se uma estrondosa gargalhada que contagiou toda a gente. Todos menos Manuel Moura dos Santos que, num tom ainda mais sério, se possível, dirigiu-se à plateia para afirmar com alguma dureza “Estou, obviamente, a falar da música de Jorge Peixinho, um grande compositor português contemporâneo”.

A plateia emudeceu de repente e, creiam, foi muito confrangedor assistir a este puxão de orelhas em directo a uma assistência completamente ignorante sobre um dos músicos mais importantes do século vinte.

Repito, foi angustiante assistir a tanta ignorância junta, a tanta falta de cultura musical, patenteada por pessoas de várias gerações.
E para aqueles que estão menos familiarizados com a chamada “música séria”, (embora toda ela seja séria) os seus compositores e intérpretes, deixem-me recordar-lhes que, para além de muitos outros méritos, Jorge Peixinho (1940-1995), foi um dos mais importantes compositores portugueses, mas foi, também, pianista, crítico musical, conferencista e ensaísta.



Saloiice mental

Quem leu a minha última crónica sobre a palestra proferida por Leila Navarro e teve ainda a coragem de voltar ao blogue para ler a de hoje, poderá ser tentado a pensar que, entre uma e outra, existe alguma contradição da minha parte.

Na primeira, falava-vos de alguém cujo trabalho consiste em levantar o moral das pessoas, incitando-as a fazerem alguma coisa por elas próprias, a valorizarem o seu potencial, a serem felizes na vida e no trabalho e, no fundo, a respeitarem-se a si próprias.

Hoje, por contraponto, pretendo salientar precisamente uma das piores coisas que há em nós portugueses, a saloiice mental. Aquela mesma saloiice que nos leva a pagar para ir assistir a uma conferência organizada pelo “The Economist Intelligence Unit”, em que alguém supostamente muito conceituado no meio, vem dizer umas quantas baboseiras de como deveríamos governar o nosso país para chegarmos a ter, rapidamente, uma economia muito superior à dos países nórdicos.

É o raio da nossa subserviência sempre atenta ao que vem de fora, o nosso velho costume de nos pormos de cócoras a venerar os estrangeiros que, de certeza, sabem sempre mais do que nós, qualquer que seja o assunto. É, no fundo, o resultado de anos e anos, isolados em torno de nós próprios. Mas esse tempo já lá vai e hoje somos outros completamente diferentes dos do passado. Com todas as dificuldades, com todas as hesitações, é certo, mas capazes de sermos tão bons como os demais.

Quanto à Srª. Ania Thiemann, a tal especialista que veio do estrangeiro para nos dizer que com a rapaziada que temos cá não vamos longe, e que não aconselharia Portugal como destino de investimento, dá vontade de lhe dizer o seguinte:
- apesar do The Economist ter previsto que as nossas exportações cresceriam apenas 3,7%, elas cresceram 9%.
- Apesar da Srª. Ania Thiemann ter previsto que o nosso crescimento económico seria de 0,7% ele situa-se perto dos 1,4%, mais ou menos o dobro.
- O nosso défice ficou abaixo dos 4,6%, coisa que Ania Thiemann sempre duvidou e disse-o pubicamente.

Só mais uma coisa. A Srª. Ania Thiemann afirmou para quem quis ouvir que o governo não fez as reformas que deveria ter feito (na sua opinião) logo no primeiro ano de governação.

Mas, Srª. Thiemann, afinal quem é que tem razão? A senhora, ou o Banco Mundial que considerou Portugal “top reformer of the year”?

Saloios, saloios é o que somos. Saloios até para ouvir – veneradamente e de olhos em bico – os tais “peritos” que nos vêem dizer coisas que já sabemos e que, ao fim e ao cabo, cometem erros de previsão tão descarados.

Ao que parece, a saloiice não tem cura!



domingo, fevereiro 18, 2007

"Nada muda se eu não mudar"


Há duas semanas convidaram-me para assistir a uma palestra sobre auto-motivação, ou motivacional, como queiram designar, proferida por alguém de quem eu, confesso a minha ignorância, nunca tinha ouvido falar, Leila Navarro.

Vim a saber depois que Leila Navarro é uma das mais conceituadas oradoras do Brasil, eleita por três vezes para o prémio “Top of Mind” pelos profissionais de recursos humanos do seu país.

Quando entrei para o auditório do Centro de Congressos de Lisboa, onde estavam largas centenas de pessoas, pensava ir assistir a “mais um daqueles monólogos chatos” conduzidos, normalmente, por especialistas que mais não fazem do que debitar toda uma série de conceitos que se prolongam durante horas e horas e fazem com que a assistência - mais ou menos sonolenta - não necessite sequer de, à noite, ter que tomar mais um comprimido para dormir.

Enganei-me completamente. Leila é brasileira, tem aquele jeito alegre e descontraído de que nós tanto gostamos nos brasileiros e é a oradora menos formal, menos “low profile” que imaginar se possa.

Leila é exuberante, frenética, esfuziante e assistir a uma das suas palestras é, no mínimo, uma experiência estonteante que nos deixa a pensar durante umas horas. Num ritmo acelerado, consegue ir intercalando histórias pessoais com assuntos que apelam ao melhor que temos em nós e que, por alguma razão, mantemos adormecido. E para isso, vai repetindo, recorrentemente, que “nada acontece por acaso” e que "nada muda se eu não mudar".

Pelo meio, cria uma interacção viva com a plateia, através de jogos que nos “empurram” para temas como a inclusão e a solidariedade, vai contando divertidíssimas histórias que põem toda a assistência a rir, mas histórias que vão, mais adiante, fazer realçar novos apelos para a nossa motivação, para a nossa entrega e para a necessidade de querermos mesmo ser felizes na profissão e, sobretudo na vida.


No tecto do seu quarto, Leila diz ter escrito em letras garrafais a frase: “Hoje tomei uma decisão, vou ser feliz assim mesmo”. “É a primeira coisa que vejo quando abro os olhos”, confessa. “E, no espelho do meu banheiro, escrevi outra frase que é: “Olá poderosa, você é a mulher que eu quero ser”, conta, divertida, durante a palestra.

“Nós nascemos para ser felizes. Mas para isso é preciso ter objectivos, sonhos, metas e participar na vida”, acrescenta.


Claro que estas mensagens são muito importantes, nomeadamente para os mais jovens. Mas mesmo para os que já têm alguns anos, e já conhecem os conceitos e as teorias avançadas por Leila daquela forma tão engraçada, mesmo para esses, essas fórmulas podem ser o tal empurrão que muitas vezes falta aos mais desmotivados que necessitam que haja uma reviravolta na sua vida...

Uma frase que se ouviu algumas vezes naquele auditório foi

É urgente retirar de vez das nossas cabeças aquilo que há séculos nos vêem ensinando "errar é humano" quando, o que deveríamos interiorizar, é "acertar é humano".


Quando se faz uma primeira avaliação à palestra e à postura em palco de Leila Navarro, poder-se-á ter a tentação de considerar que tivemos a assistir a um espectáculo de uma comediante muito engraçada e de múltiplos talentos. Contudo, só talvez à primeira avaliação.

Mas, quando reflectimos um pouco mais no que vimos e ouvimos durante quase duas horas, não podemos deixar de reconhecer que de uma forma leve, simpática e alegre, foram ali ditas coisas muito importantes que nos poderão ajudar, e muito, na nossa vida profissional e pessoal. E daí que Leila seja convidada frequentemente para fazer palestras em muitas empresas, dentro e fora do Brasil.


Penso que para nós portugueses, que continuamos a ser um povo meio acinzentado e triste, que sentimos demasiadas vezes que “andamos mais ou menos”, ou que, no máximo “vamos andando”, é necessário que, de vez em quando, apareça alguém a recordar que estamos vivos e que nos puxe pela nossa auto-estima, pelo nosso brio, que, tantas e tantas vezes, anda muito lá por baixo.




quinta-feira, fevereiro 15, 2007

Continua sem se ver a luz ao fundo do túnel ...


Se bem se recordam, ainda há bem pouco tempo aqui falei de um tal Arménio Matias que já foi administrador da CP e da Rave, (que pertence ao grupo CP), e que por lá andava sem qualquer tarefa atribuída, apesar de ser reconhecidamente um quadro competente, mas continuando, obviamente, a receber o seu chorudo vencimento.


Já há mais tempo, tinha também referido os desmandos cometidos por Braamcamp Sobral quando era presidente da Refer e da Rave, desmandos esses que o levaram e à sua equipa, a serem exonerados por motivos justificados, após uma auditoria efectuada pela Inspecção Geral de Finanças.


Face a isso, o Estado mudou a administração e colocou lá outra, presidida agora por Luís Pardal. Mas as baralhadas e os compadrios não cessaram.


Será bom recordar que, tanto a Refer como a Rave, são duas empresas públicas do universo empresarial da CP. Empresas que são sustentadas com o dinheiro dos contribuintes que gostariam de ver, pelo menos, transparência e rigor nas decisões e acções levadas a cabo pelos seus responsáveis. Mas não, o que se vai constatando é que apesar dos prejuízos que todos anos são sendo cada vez maiores, a protecção aos amigos continua e os tais desmandos que já eram o dia-a-dia da administração anterior, passaram agora a fazer parte dos usos e costumes da actual administração.


E tanto assim é que, no Correio da Manhã de hoje, vem noticiado que Manuel Lopes Marques, ex-director-geral de exploração e conservação da Refer – Rede Ferroviária Nacional, recebeu em Junho de 2006 uma indemnização de 210 mil euros para sair daquela empresa e, dois meses depois, em Outubro, ingressou como assessor do conselho de administração na Rave – Rede Ferroviária de Alta Velocidade, com um salário mensal de 5050 euros, para além de outras mordomias.


Isto é, anda-se da Refer para a Rave e da Rave para a CP e, se não der muito nas vistas, volta-se para a Rave ou para a Refer, tanto faz. Pela experiência, sabemos que todos estes saltinhos, de empresa para empresa, custa ao erário público, muitos milhares de euros. E nós vamos continuando a perguntar “Até Quando?”.


quarta-feira, fevereiro 14, 2007

España, por supuesto ...


Agora que já foi resolvida a questão da despenalização do aborto e que já conseguimos subir para o mesmo patamar dos outros países mais liberais da Europa, estamos prontos, já que a globalização “ataca” em todas as frentes, para nos preocuparmos com outras questões igualmente importantes e que foram, também, já assumidas por outros países da Comunidade.

Por exemplo, o governo espanhol anunciou que vai começar a financiar durante esta legislatura as operações de mudança de sexo de pessoas transexuais que optem por este procedimento. E mais, a Espanha financiará a 100% as mudanças de sexo a partir de 2008.


Não se alarmem, por enquanto, os mais conservadores cá do burgo, porque, a coisa em Portugal, ainda não é para já. É que enquanto as intervenções de mudança de sexo foram contempladas no programa do actual governo de Zapatero, não consta que Sócrates tivesse tido idêntica preocupação aquando da elaboração do seu programa de governo.

terça-feira, fevereiro 13, 2007

Matemática lírica


Quando em Janeiro último, aqui publiquei um texto sobre Millor Fernandes fiquei um tanto ou quanto desapontado por não ter tido um só comentário sobre, pelo menos, aquele naco de prosa de humor inteligente, intitulado “O Socorro”, escrito por esse homem genial.

Talvez por isso, volto hoje à carga, tentando chamar a vossa atenção para este homem que derrama um humor fino e penetrante, capaz de, por exemplo, ter uma visão sobre a estupidez definida numa simples frase.

“Idiota mesmo é o sujeito que, ouvindo uma história com duplo sentido, não entende nenhum dos dois”


Mas porque Millor Fernandes também abraçou a poesia, com a mesma genelialidade e humor que transparece em toda a sua obra, espero que hoje desfrutem totalmente esta


“Matemática lírica”



Um Quociente apaixonou-se
Um dia
Doidamente
Por uma Incógnita.


Olhou-a com seu olhar inumerável
E viu-a, do Ápice à Base...


Uma Figura Ímpar;
Olhos rombóides, boca trapezóide,
Corpo ortogonal, seios esferóides.


Fez da sua
Uma vida
Paralela a dela.


Até que se encontraram
No Infinito.

"Quem és tu?" indagou ele
Com ânsia radical.

"Sou a soma do quadrado dos catetos.
Mas pode chamar-me de Hipotenusa."


E de falarem descobriram que eram
- O que, em aritmética, corresponde
A almas irmãs -Primos-entre-si.


E assim se amaram
Ao quadrado da velocidade da luz.

Numa sexta potenciação
Traçando
Ao sabor do momento
E da paixão
Rectas, curvas, círculos e linhas senoidais.


Escandalizaram os ortodoxos das fórmulas euclideanas
E os exegetas do Universo Finito.

Romperam convenções newtonianas e pitagóricas.
E, enfim, resolveram casar-se.

Constituir um lar.
Mais que um lar.
Uma Perpendicular.


Convidaram para padrinhos
O Poliedro e a Bissectriz.

E fizeram planos, equações e diagramas para o futuro
Sonhando com uma felicidade
Integral
E diferencial.


Casaram e tiveram uma secante e três cones
Muito engraçadinhos.

E foram felizes
Até aquele dia
Em que tudo, afinal,
Vira monotonia.
Foi então que surgiu
O Máximo Divisor Comum...

Frequentador de Círculos Concêntricos.
Viciosos.
Ofereceu-lhe, a ela,
Uma Grandeza Absoluta,
E reduziu-a a um Denominador Comum.


Ele, Quociente, percebeu
Que com ela não formava mais Um Todo.
Uma Unidade.

Era o Triângulo,
Tanto chamado amoroso.
Desse problema ela era a fracção
Mais ordinária.

Mas foi então que Einstein descobriu a
Relatividade.
E tudo que era espúrio passou a ser
Moralidade
Como aliás, em qualquer
Sociedade.

segunda-feira, fevereiro 12, 2007

Honestidade recompensada



1ª. História:

Alberto Gonzalez, um mendigo mexicano, encontrou na rua um saco de jóias e, depois de muita procura e alguma sorte, conseguiu localizar o casal proprietário a quem entregou o saco das jóias. Por ter devolvido os cinco colares de ouro e os quatro anéis de diamantes, Gonzalez recebeu uma gratificação.

2ª. História:

Uma senhora saiu de uma joalharia em Nova Iorque e mandou parar um táxi. Já um bom bocado depois da senhora ter abandonado o taxi, o motorista reparou que no banco de trás, estava um saco que veio a verificar estar cheio de anéis de diamantes. O motorista que não se chegou a saber o nome mas que é originário de um país extremamente pobre, andou freneticamente de um lado para o outro à procura da passageira, até que, vá lá saber-se porquê, acabou por a encontrar e devolver-lhe o saco com os anéis. Como recompensa recebeu um cheque de cem dólares, a gratidão da senhora e o reconhecimento público da sua honestidade.

Afinal, neste mundo cão em que vivemos, ainda vamos sabendo de certas histórias que nos dão alguma esperança relativamente à natureza humana.


Mas o título desta crónica, a que chamei

“Honestidade recompensada”

dado a coincidência de que, em ambos os casos, estarem envolvidos dois sacos com jóias, o título podia muito bem ser (ou a moral da história, se quiserem)

“Os sacos com jóias acabam sempre por ser devolvidos aos seus legítimos donos”

A abstenção


Devo confessar que as altas taxas de abstenção que se têm verificado em todas as votações e referendos me preocupam seriamente. E se, porventura, não vão aumentando, também não se sente que vão diminuindo significativamente, o que, convenhamos, não é nada animador.


É claro que depois de em 1998, no primeiro “referendo ao aborto”, como ficou a ser conhecido, a abstenção ter atingido o elevado número de 68,11 %, esperava eu que nove anos depois, com mais elevação nos argumentos utilizados nas campanhas pelos diversos movimentos, com maiores e mais actualizados conhecimentos médicos e com uma expectável subida da maturidade de quem defende o sim e o não, esperava eu, dizia, que as pessoas corressem a manifestar a sua opinião e, desta forma, dessem um sinal de que esta coisa da democracia tem muito a ver com a nossa participação e com o nosso empenho naquilo que a todos interessa, e que não ficassem tão somente, pela menor, embora importante, participação nas votações de quem nos vai governar.

Esperava, mas enganei-me. Em 2007, mais de 30 anos depois de nos terem devolvido a liberdade, não sabemos o que fazer com ela e continuamos a esquecer que a liberdade pressupõe responsabilidade e que o voto, embora não obrigatório, constitui uma das expressões em que podemos manifestar a nossa vontade, independentemente do que estiver em causa. E vai daí, em 2007, neste 2º. Referendo contra a interrupção voluntária da gravidez, realizado quase nove anos depois de primeiro, ainda por cima em matéria tão importante como a que estava em causa, continuamos a pautar a nossa participação com uma elevadíssima abstenção que, desta vez, se situou em 56,39%. Ainda assim menor que em 1998 mas, de qualquer forma, uma abstenção demasiada alta.



Mas, meus amigos, se julgam que era da abstenção de ontem que eu vos queria falar, estão redondamente enganados. Hoje, tinha vontade de vos falar de um outro tipo de abstenção, da renúncia em participarem no encontro quase diário que fazemos aqui neste nosso blogue.

Eu sei que são muitos os que lêem estes meus desabafos, estas minhas “revoltas” e estas minhas histórias, mas seria óptimo que todos participássemos um pouco mais para que, desta interacção, pudessem resultar momentos mais agradáveis e, eventualmente, susceptíveis de criarem espaços de discussão criativa.

Não chega apenas ler o blogue, como não chega apenas na política, votar nas legislativas ou nas presidenciais. É necessário um pouco mais de interesse, muito mais participação e um enorme empenhamento.

E, deixem-me divagar, como seria bom que, aqui no “Por Linhas Tortas”, vocês pudessem aparecer de vez em quando, a comentar os textos que vão sendo publicados. Sem qualquer tipo de obrigação e sem esforço, mas tão-somente porque todos queremos participar e comunicar.

Abaixo a abstenção!

quinta-feira, fevereiro 08, 2007

Um sabor ... saboroso


Quando escrevi aqui no blogue que o tempo da “lambidela nos selos de correio” tinha os seus dias contados, eu referia-me, evidentemente, e pelas informações que detinha na altura, ao que se previa que acontecesse em Portugal.

Não foi preciso esperar muito para ter conhecimento que noutras paragens bem mais longínquas, na China, vai ser lançado um selo temático para assinalar a entrada no “Ano do Porco”. Temático e com uma particularidade inédita. Ao ser lambido (lá está o velho ritual que, pelos vistos, é ou era praticado em todo o mundo, pese embora o seu lado pouco higiénico), o selo evidencia o característico sabor a porco agridoce, além do respectivo cheiro. Ou seja, um selinho com sabor e aroma a porco.

Ora aí está uma inovação “realmente nova”. E com dupla utilização. Por um lado, lambe-se o porco agridoce e fica-se almoçado, por outro lado, sela-se o sobrescrito que se pretende enviar. Bom, bonito (espera-se que sim) e barato.

Ao fim e ao cabo, uma situação que me fez lembrar um amigo meu, tipo pouco endinheirado, que para poupar uns trocos, e sempre que os vizinhos do andar de baixo tinham para o jantar “iscas com elas”, cujo cheiro era tão intenso e tão saboroso, o meu amigo debruçava-se à janela e ia comendo pequenos pedaços de pão que molhava no cheiro gostoso que subia prédio acima. E assim ficava jantado e ... satisfeito!

quarta-feira, fevereiro 07, 2007

mordomias


Durante alguns anos, para além da minha actividade profissional normal, dava, simultaneamente, acções de formação na área em que era especialista.

Acções de formação que eram ministradas em qualquer parte do país, fossem perto ou longe de casa. Por exemplo, se eu tinha uma acção programada para o Porto, ou em Castelo Branco, ou em Leiria ou em Faro, preparava previamente a minha aula e, no dia da acção, levantava-me muito cedo, punha-me a caminho, chegava ao local, dizia o que tinha para dizer (durante quatro, cinco, seis ou mesmo sete horas seguidas) e regressava (estafado, estafadíssimo) ao sossego do lar.

A minha entidade patronal paga-me apenas a gasolina (nem as portagens pagava) e uma refeição, e não me dava nem mais um chavo porque, presumo eu, achava que eu estava a trabalhar para a empresa, não no meu local habitual mas em qualquer outro sítio. Ao fim e ao cabo, era um dia normal de trabalho apesar de eu ter que preparar e monitorar uma acção de formação e apesar de muitas vezes ter que conduzir 700 quilómetros no mesmo dia.

É claro que muitas vezes eu pensei que estava a ser alvo de uma grande exploração e que não me recompensavam convenientemente pelo esforço despendido. Sejamos claros, estava a ser explorado e pronto!

Continuo a achar isso, mas agora, face às coisas que se vão sabendo, ainda fico mais transtornado. Como aconteceu a semana passada quando soube que um senhor importante da nossa praça, recebe subsídios que vão bastante mais além do que seria aceitável.

E a coisa é fácil de contar. O presidente da Entidade Reguladora para a Comunicação Social (ERC), vive no Porto e desloca-se todas as semanas a Lisboa, onde fica em média dois dias num hotel da capital.

Muito embora o carro lhe esteja atribuído pela Entidade Reguladora, é justo que lhe paguem as despesas com o hotel, com a gasolina e com as portagens que ele (provavelmente) paga do seu bolso. Até aqui nada a dizer.

O que eu já não considero mesmo nada justo é que para além dessas despesas pagas com as deslocações e de um ordenado compatível com o cargo que ocupa, o senhor ainda receba mensalmente 1.000,00 euros, a título de subsídio de residência, pelo facto de morar a mais de 100 quilómetros de Lisboa, local onde vem exercer as suas funções, como disse, um ou dois dias por semana.

Se o senhor residisse no Porto e estivesse deslocado em Lisboa durante toda a semana eu ainda percebia que lhe atribuíssem um subsídio de renda de casa. Mas para vir a Lisboa dois dias por semana, no máximo, darem-lhe mais 1.000,00 euros quando lhe pagam todas as despesas com a deslocação? Ainda por cima, quando o senhor deve ter um vencimento que não deve ser nada pequeno?

Resta saber, e a questão não é tão despiciente como possam imaginar, se o carro fornecido pela ERC terá já o depósito atestado e, ainda assim, o senhor presidente continue a ser ressarcido das despesas de combustíveis ... que ele, afinal, não chegou a pagar. Olhem que eu conheço alguns casos desses ...

Resta, então, dizer que essa lei tão abstrusa estabelece como critério único para atribuição de um subsídio de residência o da distância geográfica em relação ao local de trabalho, independentemente se o indivíduo se desloca para trabalhar um ou dois dias por semana, ou esteja fora da sua residência habitual a semana inteira.


Dizia Freud que “existem duas maneiras de ser feliz nesta vida. Uma é fazer-se idiota e a outra, sê-lo”. Como acho que não faço parte da segunda hipótese, e não gostaria de passar por pertencer à primeira, é evidente que não posso estar feliz, nem deixar de me indignar com situações deste tipo.

Ou será que conseguem achar alguma justiça nisto tudo?

terça-feira, fevereiro 06, 2007

Garrett é que tinha razão

Já não é a primeira vez que me lamento por ser constantemente esquecido sempre que chega a hora de condecorar alguém. Artistas, Desportistas, Actores, Políticos, Industriais e toda a minha gente, viva ou a título póstumo, leva a sua medalhazita ou a sua comenda por, supostamente, ter legado alguma coisa de importante ao país.

Claro que também há o reverso da medalha, e à força de se medalhar tanta gente e, por vezes, sem qualquer critério que se entenda, caiu-se na vulgaridade e hoje não há bicho careta que não tivesse sido já agraciado pelo Presidente da República. Agora até o ex-Procurador Geral da República, Souto Moura, homem de quem tanto mal se disse e a quem todos queriam ver pelas costas, até ele vai ser condecorado pelo Professor Cavaco Silva com a Grã-Cruz da Ordem de Cristo, por (alegados) serviços prestados ao país. Quem é que, há uns tempos atrás, pensaria que isso fosse possível...

Mas, como diria o nosso Almeida Garrett, a propósito da atribuição de tantas medalhas e títulos:


“Foge, cão, que te fazem barão.

Para onde? Se me fazem visconde...”


segunda-feira, fevereiro 05, 2007

O que teria acontecido?


A verdade é que, como não ia completamente distraído, olhei com mais atenção para um cartaz em que a Câmara Municipal de Oliveira do Hospital anunciava o “arranjo urbanístico da zona envolvente da Junta de Freguesia de São Gião”, obras que, de acordo com o cartaz, iriam ser comparticipadas pela Comunidade Europeia.

Mas porque as coisas ou se lêem ou não se lêem, e se se lêem, lêem-se do princípio ao fim, não pude deixar de olhar, com olhos de ver, para quanto ia custar aquela obra que ia alindar aquela parte da cidade. E o cartaz indica que o custo total da obra está estimado em 4.042,95 euros, sendo a comparticipação comunitária de 5.532,21 euros.

O meu “olho clínico” que tem a mania de reparar em certas coisas, fez-me parar o carro. Reli atentamente as verbas anunciadas e não pude de deixar de ficar completamente “abazurdido” e baralhado.

Então se as obras vão custar somente 4.042,95 euros, porque carga de água é que a Comunidade Europeia vai comparticipar com 5.532,21 euros, ou seja, mais 1.489,26 do que o necessário?

Acreditem que a pergunta não é de todo mal-intencionada. Mas se ninguém me sabe dar uma explicação plausível para o sucedido, e se não me levam a mal que eu especule sobre o assunto, a justificação só pode ser dada por uma das seguintes situações:

a) Ou o cartaz foi mal feito e trocaram a ordem das verbas (incompetência e falta de controlo da obra executada); ou
b) a Comunidade Europeia, sabendo que em Portugal não se cumprem nem prazos nem orçamentos, já adiantou mais uns mil e quinhentos euros para compensar os desvios (incompetência de novo, e descrédito internacional por aquilo que se faz por cá) ; ou
c) a Comunidade foi mal informada do custo da obra, pensando que a mesma poderia ser de um montante muito superior e enviou, a título de comparticipação 5.532,21 euros.

Quero acreditar que tenha havido um lapso na execução do cartaz, descuido que, repito, faz sobressair a incompetência e a falta de controlo de quem o mandou fazer.

Mas se, de facto, o que aconteceu é que a Comunidade mandou um montante (que deveria ser apenas uma comparticipação) superior ao custo total da obra, por onde é que andam os 1.489,26 euros que vieram a mais?

Perguntar não ofende ...

domingo, fevereiro 04, 2007

Que grande par de meias ...

Lembro-me de uma vez ter ouvido o Professor Cavaco Silva, então primeiro-ministro, confessar que era um castigo ter que comprar sapatos. Era a esposa que o obrigava a ir comprar uns novos sapatos, sempre que os que estava usando já tinham as solas rotas.

Pois agora, soube-se que o norte-americano Paul Wolfowitz, líder do Banco Mundial, o homem que decide e distribui milhões e milhões de dólares a países pobres, tinha, não a sola dos sapatos rotas, mas rotas as duas meias que trazia calçadas (logo as duas) quando, no domingo, na Turquia, teve que descalçar-se para visitar uma mesquita.

Calculo o embaraço de Paul Wolfowitz e o espanto de quantos assistiam à cerimónia. Quando Paul descalçou os dois sapatos, ficaram à mostra os dedos grandes dos pés saindo pelo meio de dois enormes buracos nas meias. Como se costuma dizer, duas “batatonas” de todo o tamanho.

“Acidentes” que, como se vê, também acontecem aos outros ...

quinta-feira, fevereiro 01, 2007

Por favor, tragam-me o livro de reclamações


Eu sei que as constantes críticas à restauração algarvia não caiem lá muito bem aos algarvios em geral, e em particular aos responsáveis da Região de Turismo do Algarve. É natural que não gostem do que se diz, mas a verdade é que não podem fechar os olhos às situações concretas que se apontam, nem desculpar os maus profissionais que também existem nesta actividade, e não são tão poucos como isso, infelizmente.

Há umas semanas, Clara Ferreira Alves disse na Revista Única do Expresso, e acredito que com mágoa: “Não fui bem servida em determinado restaurante”.

Na semana seguinte, o Expresso fez eco das respostas que não se fizeram esperar. O Presidente da Região de Turismo do Algarve lembrou que aquela região é o principal destino turístico nacional, registando em cada ano, cerca de 15 milhões de dormidas de mais de 2,5 milhões de turistas entre portugueses, britânicos, alemães, holandeses, espanhóis, irlandeses e de outras nacionalidades, uma procura que gera riqueza económica e social. Disse mais o senhor presidente, que o Algarve foi eleito o melhor destino de golfe do mundo em 2006, pela Golf Tours Operators. Disse ainda mais, que o Algarve tem alguns dos hotéis mais prestigiados internacionalmente e detém, ano após ano, o maior número de bandeiras azuis nas suas praias. E termina dizendo que a oferta hoteleira algarvia é muito diversificada e profissionalizada.

Não temos razão para duvidar das afirmações do senhor presidente Helder Martins. Provavelmente tudo isso é verdade, como é verdade que depois de cinco anos em queda livre, o turismo algarvio está a crescer muito acima das previsões iniciais. O balanço de 2006 é francamente positivo e o crescimento foi muito acima do esperado, o que, para o líder da RTA, este crescimento pode ser explicado pela cada vez maior afirmação do Algarve como destino de férias.

Mas sem querer entrar em demasiados detalhes, parece que a explicação do Senhor Martins é um pouco simplista, uma vez que não entra em linha de conta com factores que poderão ter influenciado o aumento dos turistas que nos visitam, como por exemplo, a guerra do Médio Oriente que poderá ter prejudicado zonas turísticas como Israel, Egipto e todas as zonas balneares da bacia mediterrânea.

Voltando ao que estávamos a tratar, o senhor presidente do RTA nunca refutou em concreto o que aconteceu à jornalista Clara Ferreira Alves. Nem sequer reconheceu que existem situações que não se encaixam nos casos de sucesso apontados por ele. Na restauração como em qualquer outra actividade existem maus profissionais e má gestão dos recursos ao serviço dos estabelecimentos que estão abertos ao público.

Não sou cronista profissional e muito menos um “opinion maker” que gosta de desancar o Algarve durante as horas vagas. Pelo contrário, rumo regularmente ao sul do país, gosto de lá passar temporadas e costumo frequentar a restauração e a hotelaria algarvias.

Mas o facto de ser bem servido em muitos locais, de encontrar vezes sem conta profissionais de mão cheia, isso não me faz esconder a cabeça na areia, quando deparo com situações que devem ser denunciadas para não se repetirem.

Foi o que me aconteceu recentemente num restaurante da zona ribeirinha de Portimão. Nesse restaurante fomos encontrar um serviço muito mal organizado nas mesas e na gestão dos pedidos e uma cozinha que não foi, no mínimo, nada satisfatória. Razões mais do que suficientes para pedir a conta do que já tínhamos consumido e o livro das reclamações, o qual, diga-se de passagem, só nos foi entregue depois de algumas insistências.

O direito à indignação e a não satisfação dos nossos direitos enquanto clientes devem ser expressos de forma clara e inequívoca no Livro de Reclamações. Por isso ele é obrigatório.

Ao manifestar o nosso desagrado, fundamentadamente como é óbvio, estamos a prestar um serviço público colaborando na melhoria dum serviço mais profissional e mais satisfatório para todos.

Se as reclamações vão, ou não, produzir efeitos, é coisa que não faço a mínima ideia. No entanto, há muito que me deixo guiar por uma frase que ouvi algures:

“Todos deviam ser resignados ou revoltados. Espero que fossem revoltados, é menos triste. Um homem revoltado nunca está completamente vencido”.