sexta-feira, novembro 27, 2009

O que o Banco Alimentar faz que mais ninguém faz


Hoje transcrevo parte de um texto escrito pelo jornalista José Manuel Fernandes, publicado no Jornal Público no dia 24 de Dezembro de 2008 com o mesmo título deste post.


José Manuel Fernandes nesta sua crónica natalícia sobre as diversas acções de apoio a pessoas desfavorecidas, refere instituições como a “Comunidade Vida e Paz”, a “AMI” e outras, mas destaca o papel desempenhado pelo Banco Alimentar Contra a Fome durante os doze meses do ano.


Apesar de ter passado quase um ano, e porque estamos em vésperas de nova recolha de alimentos, parece-me oportuno transcrever as suas palavras.


“… O segredo do Banco Alimentar não está nas recolhas regulares de alimentos, que sensibilizam a população e que este ano (2008), apesar da crise, ou por ser de crise, renderam mais do que em anos anteriores. O segredo está na rede de recolha de alimentos que seriam destruídos pelas grandes redes de distribuição e ser capaz de os colocar onde são necessários, onde fazem falta. Não em qualquer guichet onde se tira a senha, mas nas creches, nos lares, nos abrigos, em todas as instituições onde servir uma refeição melhor faz toda a diferença. Muitos dos que são ajudados pelo Banco Alimentar nem suspeitam que o são…”.


Seja através dos excedentes das empresas que colaboram com o Banco Alimentar, seja através de iniciativas do BA que vão acontecendo ao longo do ano e que, na generalidade, não são do conhecimento do grande público, seja pelas recolhas de alimentos que são efectuadas duas vezes em cada ano, tudo o que é conseguido constitui uma ajuda preciosa a quem tanto depende desse apoio para ter uma existência um pouco mais digna …”.


José Manuel Fernandes tem toda a razão. Todas as ajudas são “ajudas preciosas. Segundo a Federação Portuguesa dos Bancos Alimentares contra a Fome, no primeiro semestre de 2009 foram apoiadas com produtos 1 650 instituições, que concederam ajuda alimentar a mais de 267 mil pessoas comprovadamente carenciadas.


Sábado e Domingo próximos contamos com todos vós.






quinta-feira, novembro 26, 2009

Voyeurismo político?


Depois do Presidente do Supremo Tribunal de Justiça e do Procurador Geral da Republica terem tornado público que nas escutas efectuadas no âmbito do processo “Face Oculta” não encontraram elementos que justifiquem procedimento criminal contra José Sócrates, o que é que, de facto, os portugueses querem saber?


Reparem que não está em causa se o primeiro-ministro pode ou não pode ser “escutado”, não se questiona sequer porque é que as escutas se tornaram a principal forma de investigação no nosso país quando, outrora, uma das acusações que se fazia à PIDE era justamente o abuso intolerável da devassa da privacidade dos cidadãos, nem, e finalmente, se José Sócrates está envolvido no processo da sucata”.


O que a rapaziada quer mesmo saber é se o Sócrates disse ao Vara que a Manuela Moura Guedes tinha que ser corrida da TVI porque já andava a chatear com tanta perseguição ao PS e, sobretudo, a ele próprio. Provavelmente um tipo de desabafo igual a tantos outros que se fazem entre camaradas, como aquele que confidenciei ontem a um amigo “O Teixeira dos Santos bem pode dizer que este orçamento que vai apresentar é redistributivo quando para mim é simplesmente rectificativo”.


E depois? Qual foi o mal deste meu comentário feito em privado? E o de Sócrates feito ao Vara em conversa particular?


Miguel Sousa Tavares escrevia no Expresso do último sábado com bastante ironia:


“… Sigam o raciocínio: se o PM fala sobre o futuro da TVI é porque queria interferir nele; e, se queria interferir nele é porque queria silenciar o Jornal de Sexta, que estimava, e, aliás, com razão, ser um jornal ad hominem, dirigido contra ele; logo, se queria silenciar o Jornal de Sexta é porque queria atentar contra a liberdade de informação; e, logo, se era isso que no fundo queria, estava a atentar contra o Estado de Direito”.


Meus amigos, a verdade é que se já nem acreditamos na palavra do PSTJ e do PGR (se calhar até achamos que eles estão todos “feitos” uns com os outros), se duvidamos do que afirmam e queremos tão-somente que eles “confessem” outra coisa, aquela que nós gostaríamos de ouvir (porque certezas já nós as temos), provavelmente o que acontece é que achamos que tudo o que nos contam é pura mentira. Já não acreditamos em nada nem em ninguém.


A ser assim, o nosso interesse tende a centrar-se apenas nos aspectos marginais das questões, deixando o essencial de fora e, perigo dos perigos, começamos a não saber distinguir entre o que é informação e voyeurismo político.




quarta-feira, novembro 25, 2009

Conversas de café


Nos últimos dias ouvi, um pouco por todo o lado, os ecos da imensa preocupação que vai na alma dos portugueses porque o “Rei da Sucata”, Manuel Godinho – o da “Face Oculta” - conseguiu ganhar seis contratos ao Exército, apesar de estar em prisão preventiva.


Aliás, esta semana, não se ouvia sequer falar de outra coisa que não fosse “o malandro está preso e mesmo assim uma das suas empresas ganhou um concurso público nacional a que concorreram uma data de outras empresas de sucata, cujos patrões ainda estão cá fora”.


O que prova que o Godinho é um belo gestor e que as suas organizações não necessitam da sua presença para fazerem bons negócios. Faz lembrar aquela velha teoria de que quando os árbitros são competentes nos jogos que dirigem nem se dá pela presença deles.


Não sei se esta analogia foi feliz. Tanto mais que se diz tanta coisa dos árbitros … ainda que nenhum tenha sido preso.


O meu desassossego, porém, é outro. Empreendedor como é, temo que Manuel Godinho olhando para as grades da cela onde se encontra, já tenha assegurado a compra das mesmas quando, um dia, forem substituídas.

terça-feira, novembro 24, 2009

Se conduzir não beba

A acreditar na teoria que as autoridades insistentemente divulgam, grande parte dos acidentes na estrada são devidos ao excesso de álcool dos condutores. Daí as múltiplas campanhas de prevenção que são lançadas e que andam todas elas, à volta de:


“Se conduzir não beba”,


“Se beber não conduza”,


“Se conduzir, beba com moderação”.


Por isso fiquei surpreendido ao receber uma carta do Automóvel Club de Portugal (ACP) que me pedia para responder a um questionário e que anunciava que em troca da minha participação se propunham enviar-me 4 garrafinhas de vinho tinto. E fiquei tão espantado porquê? Apenas porque o ACP, o mesmo ACP que ao longo dos anos tem sido um dos principais mentores da condução segura e, por extensão, da condução sem álcool, se prepara para oferecer aos seus sócios justamente umas embalagens de uma bebida alcoólica.


Eu sei que se trata de, apenas, 4 garrafitas de 0,25cl de vinho, portanto de 1 litro no total. De qualquer forma, achei curioso que a oferta fosse um produto que pode ser prejudicial à condução e não um qualquer acessório directamente ligado aos automóveis, como se poderia esperar de uma associação de automobilistas.


Bom, mas o ACP ao ser criativo deste modo teve, também, a sensibilidade e a habilidade suficientes para suster as eventuais críticas. Pelo que esclareceu:


“Receba esta caixa grátis


O vinho xxxx é produzido pela Adega xxxx, de xxxx, e apresentado numa inovadora e elegante garrafa de 0,25cl, a medida certa para um correcto consumo individual”.


Portanto, criativo e pedagógico.


Ah, e eu já respondi.



segunda-feira, novembro 23, 2009

Matrimónio macabro



Promete ser fiel na alegria e na tristeza, na saúde e na doença, amando-o e respeitando-o até que a morte os separe?” – esta a frase tradicional que se costuma ouvir em todos os casamentos e cuja resposta é, invariavelmente, “sim”. Enfim, o normal, num casamento normal.


O que já não é comum, e provavelmente não haverá muitos por esse mundo, foi o casamento celebrado entre uma noiva jovem e um marido que … tinha morrido há um ano. Foi o que aconteceu há dias quando a francesa Magali Jaskiewicz deu o nó com o defunto que foi vítima de um acidente mortal há um ano.


E isto só foi possível porque a lei francesa prevê a possibilidade “postmortem” nos casos em que um contratempo impede um casamento já anunciado, como aconteceu nesta situação em que Magali e Jonathan George – que já viviam em união de facto e tinham dois filhos em comum – deram conhecimento da sua intenção de casar dois dias antes do desastre que vitimou George.


Apesar da desgraça, Magali quis assumir os votos anteriormente formulados e, assim, passou directamente do estado de solteira para o de viúva. Uma cerimónia a título póstumo em que ao lado da noiva esteve presente a fotografia de um George sorridente.


Impressionante e macabro, não acham?





quarta-feira, novembro 18, 2009

Creio no Mundo como num malmequer


"Creio no Mundo como num malmequer" de Alberto Caeiro

Creio no Mundo como num malmequer,

Porque o vejo. Mas não penso nele

Porque pensar é não compreender...

O Mundo não se fez para pensarmos nele

(Pensar é estar doente dos olhos)

Mas para olharmos para ele e estarmos de acordo...

Eu não tenho filosofia: tenho sentidos...

Se falo na Natureza não é porque saiba o que ela é,

Mas porque a amo, e amo-a por isso,

Porque quem ama nunca sabe o que ama

Nem sabe porque ama, nem o que é amar...

Amar é a eterna inocência,

E a única inocência é não pensar...

terça-feira, novembro 17, 2009

Segredo de justiça


Embora já tenha idade para ter juízo, continuo a ser ingénuo. Vejam lá que me passou pela cabeça que as constantes fugas de informação sobre os casos mais mediáticos em investigação não eram senão meros descuidos. Ingénuo mas não tolo. Cansei de assistir a contínuas fugas, umas atrás das outras. É que já não são simples descuidos, é negligência pura, ou pior ainda, parece existir uma criminosa intenção de divulgar factos, supostamente em segredo de justiça, para atingir e difamar alguém.


Tecnicamente, o segredo de justiça determina a proibição da divulgação do que se passa no processo-crime, independentemente do motivo que presidir a tal divulgação.


A não ser que – e lá está de novo o meu lado naif a manifestar-se – haja pessoas nesses meios da justiça que não conseguem mesmo guardar segredos.


Freud dizia que saber guardar um segredo era um dos primeiros sinais do processo saudável de autonomia. Não me parece que se aplique neste caso.


Por outro lado, há quem pense que quem revela segredos vem a sentir arrependimento e um sentimento de traição. Também não parece ser o caso.


Temos, portanto, pessoas que, de modo soez, divulgam cirurgicamente informações reservadas. É tempo da justiça actuar, mesmo que seja contra os seus próprios agentes. E, como dizia há dias o antigo Presidente da República, Mário Soares, “é preciso que a Justiça não seja uma Face Oculta”.




segunda-feira, novembro 16, 2009

Quase me esquecia …


Uma coisa que me aborrece mesmo é que só muito raramente se valoriza aquilo que é feito de bom em Portugal e pelos portugueses. Aliás, raramente, é uma forma subtil de dizer, porque o normal é não dar atenção ao que se faz bem, sobretudo se pensado e realizado pelos nativos deste país periférico e à beira-mar plantado.


E procedemos assim porque não temos motivos suficientes de que nos possamos orgulhar? Não, a verdade é que são cada vez mais os casos de sucesso que, em Portugal ou no estrangeiro, têm portugueses como protagonistas.


Ainda agora se soube que um português, de seu nome, Carlos Neves, ganhou uma medalha de ouro na Suíça por ter produzido o melhor queijo suíço feito na própria Suíça.


Com o “Vacheri”, o equivalente ao nosso Queijo da Serra, Carlos Neves ganhou o tal galardão porque o queijo foi considerado o melhor produto suíço de todas as regiões demarcadas, o melhor entre 8 500 produtos avaliados. Um prémio de excelência atribuído à qualidade da mão-de-obra portuguesa, uma vez mais reconhecida lá fora e uma vez mais desprezada pela comunicação social do nosso país que prefere continuar a passar notícias - até à exaustão - das desgraças do país e do mundo.


Diz-se que comer queijo faz esquecer. Neste caso não por comer mas, provavelmente, por ter estado a falar no dito, quase me esquecia de assinalar a vitória da nossa selecção nacional de futebol que, com grande dificuldade, uma enorme dose de sorte, uma trave e dois postes, lá conseguiu ganhar à congénere da Bósnia por um modesto (e vamos a ver se suficiente) um a zero.


Atendendo a que o assunto era futebol, todos os jornais e televisões deram, neste domingo, o destaque merecido. Mas, pergunto, se não fosse de futebol será que alguém se lembraria de falar no prémio ganho por Carlos Neves?



sexta-feira, novembro 13, 2009

“Admirável Mundo Novo”



Receio que uma vez mais o título da crónica de hoje tenha criado falsas expectativas ao leitor. “Admirável Mundo Novo” de Aldous Huxley é uma obra maior da literatura do século XX, onde Huxley “imagina” um modelo de sociedade futura, condicionada em termos genéticos e psicológicos, e onde denuncia os perigos que ameaçam a humanidade. Uma leitura que considero imprescindível.


De forma mais modesta, o meu “mundo novo” da crónica de hoje, resume-se apenas à vontade de partilhar convosco uma cena a que assisti há dias e que me impressionou bastante.


Não muito longe do lugar em que eu me encontrava, uma mulher tinha uma das mãos junto da face, enquanto que a outra mão gesticulava furiosamente em vários sentidos e agitava os dedos em rituais estranhos. Disfarçadamente olhei para a mulher sem compreender. Parecia louca.


Percebi então que “falava” ao telemóvel, através de uma vídeo-chamada. Aquela mulher estava a comunicar gestualmente com outra pessoa. Todos aqueles esgares e movimentos faziam sentido para quem não podia transmitir ou receber os sons de forma tradicional.


Era gente que não ouve (e que não fala a maior parte das vezes) a comunicar entre si através de um simples telefone portátil, independentemente das distâncias.


“Admirável mundo novo”, pensei.

quinta-feira, novembro 12, 2009

Teste


Proponho-vos hoje um texto. Um texto e um teste. Leiam-no e adivinhem quem o escreveu.



“Um povo imbecilizado e resignado, humilde e macambúzio,

Fatalista e sonâmbulo, burro de carga, besta de nora,
Aguentando pauladas, sacos de vergonhas, feixes de misérias,
Sem uma rebelião, um mostrar de dentes, a energia dum coice,
Pois que nem já com as orelhas é capaz de sacudir as moscas;
Um povo em catalepsia ambulante, não se lembrando nem donde vem,
Nem onde está, nem para onde vai;
Um povo, enfim, que eu adoro, porque sofre e é bom,
E guarda ainda na noite da sua inconsciência como que
Um lampejo misterioso da alma nacional,
Reflexo de astro em silêncio escuro de lagoa morta.

Uma burguesia, cívica e politicamente corrupta até à medula,

Não discriminando já o bem do mal, sem palavras, sem vergonha,
Sem carácter, havendo homens que, honrados na vida íntima,
Descambam na vida pública em pantomineiros e sevandijas,
Capazes de toda a veniaga e toda a infâmia, da mentira à falsificação,
Da violência ao roubo, donde provém que na política portuguesa
Sucedam, entre a indiferença geral, escândalos monstruosos,
Absolutamente inverosímeis no Limoeiro.

Um poder legislativo, esfregão de cozinha do executivo;

Este criado de quarto do moderador; e este, finalmente,
Tornado absoluto pela abdicação unânime do País.

A justiça ao arbítrio da Política,

Torcendo-lhe a vara ao ponto de fazer dela saca-rolhas.

Dois partidos sem ideias, sem planos, sem convicções,

Incapazes, vivendo ambos do mesmo utilitarismo céptico e
Pervertido, análogos nas palavras, idênticos nos actos,
Iguais um ao outro como duas metades do mesmo zero,
E não se malgando e fundindo, apesar disso,
Pela razão que alguém deu no parlamento,
De não caberem todos duma vez na mesma sala de jantar.”

Não, erraram redondamente. Não foi Medina Carreira. O magnífico e contundente texto que transcrevemos foi escrito por Guerra Junqueiro em 1896. Repito, este texto foi escrito pelo deputado, jornalista, escritor e poeta GUERRA JUNQUEIRO em 1896.

Passados estes anos todos, verificamos que nada mudou.

Como dizia Guerra Junqueiro “Alguém tem dúvidas que o povo é imbecil? O problema é que a Raça é fraca”.



quarta-feira, novembro 11, 2009

Até que enfim!


A rebaldaria das viagens acabou. Pelo menos acabou a forma como eram utilizadas até agora. Jaime Gama, Presidente da Assembleia da República decidiu que a partir desta legislatura, doravante e para o futuro, os deputados não vão poder desdobrar bilhetes de avião nem usar em proveito próprio as milhas percorridas em deslocações oficiais.


Eu sei que dava um certo jeito prescindir da utilização da classe executiva para poder viajar com um acompanhante em classes inferiores. Era simpático dar-se aos deputados da nação a possibilidade de alguém viajar com ele e à conta, sem que o Estado pagasse mais por isso. Era o chamado dois em um em que todos ganhavam. Só que, esse esquema, ainda que legal, era em si mesmo imoral e destituído de ética.


Mas não sei se a medida não poderia ter ido um pouco mais além. Afinal, se os Deputados não se importavam de viajar em classe económica só para levar consigo uns familiares ou amigos, será que o regulamento não deveria obrigar a que todas as viagens fossem efectuadas com bilhetes mais baratinhos? Afinal, muitos desses senhores até já o faziam.


Eu sei que a honorabilidade dos cargos exige certos formalismos mas, caramba, o país não está propriamente no melhor dos momentos e esse sacrifício (?) bem poderia ser suportado por pessoas que não devem ser das mais desfavorecidas da nossa sociedade. Pelo menos nas viagens de curto e médio curso. Não concordam?

terça-feira, novembro 10, 2009

Vinte anos depois … e muitos muros por derrubar


Há umas horas atrás, em Berlim, um dominó gigante desmoronou-se perante milhares de berlinenses e dezenas de líderes políticos de todo o mundo. E os principais canais de televisão mostraram em directo a cerimónia comemorativa dos vinte anos da queda do muro de Berlim.


Duas décadas depois, embora felizes pelo derrube de um dos símbolos mais visíveis da guerra fria entre o Ocidente e o Bloco de Leste regido pela União Soviética, há muros que teimam em erguer-se altaneiros para separar países e famílias em várias partes do mundo.


E todos eles justificados por motivos tão díspares como o combate à violência, à imigração ilegal ou à propagação de doenças infecciosas ou para delimitar terreno às comunidades de diferentes religiões, etnias ou políticas. O resultado prático é sempre o mesmo: isolar. Tal como fizeram em Berlim em 1961.


E a lista de muros e cercas que continuam a existir é extensa. Por exemplo, quinhentos quilómetros de cercas eléctricas de alta voltagem separam o Botsuana e o Zimbabué. Foram construídos muros por Israel na Cisjordânia. Grande parte da fronteira do Uzbequistão está fechada por cercas de arame farpado. Quase três mil quilómetros de fronteira entre a Índia e o Paquistão têm muros, cercas e fortificações e na região de Caxemira a fronteira é reforçada com minas. Há barreiras a separar os Estados Unidos e o México. Em volta das favelas do Rio de Janeiro estão a ser construídos muros.


Vinte anos depois estamos em festa pá, como na canção do Chico Buarque. Comemoram-se os vinte anos da queda do muro de Berlim. Mas, pergunta-se, e os outros muros – igualmente brutais, cheios de ódio e intolerância - daqui a quando anos é que poderemos também comemorar a data do seu derrube? É que continuam muitos muros por derrubar.







segunda-feira, novembro 09, 2009

A queda da Ministra


Mesmo antes do actual governo tomar posse, já se vaticinava que esta legislatura não deverá chegar ao fim. Segundo alguns comentadores a sua queda será inevitável.


Como que a agourar tal destino, a nova Ministra do Trabalho, Helena André, já se encarregou de protagonizar “a queda”, tendo, ela própria, tomado a iniciativa de cair em plenos Passos Perdidos da Assembleia da República no dia em que se debateu o Programa do Governo. E caiu não uma mas duas vezes.


Dizem que o encerado do chão foi o responsável por tão aparatosos “espalhanços”, mas a verdade é que estas duas quedas podem sugerir algo de premonitório.


Para já, o que se sabe é que a Ministra não se magoou e mostrou grande agilidade a levantar-se, o que pode ser um bom sinal (político) para o Governo a que pertence.


Cá para mim, no entanto, e dado o passado sindical de Helena André, o que o trambolhão significa mesmo é que ela tem queda para a política.

sexta-feira, novembro 06, 2009

O gesto


Olhei por acaso para o cantoneiro (não sei se é assim que se chama ao funcionário que antigamente era conhecido por varredor) que empurrava o carrinho do lixo ao longo da rua. Aqui e ali parava, apanhava o lixo do chão, colocava-o na pá que, depois, despejava num dos baldes do carrinho. Enquanto trabalhava, o cigarrito que lhe servia de companhia ficava dependurado na boca.


Os gestos repetiam-se, o cigarro ia-se extinguindo e a calçada ficava mais limpa. Até que o cigarro se tornou beata e o varredor acabou por a atirar para o chão que acabara de limpar.


Nesse momento não pude deixar de pensar no que teria levado aquele homem, responsável pela limpeza da rua, ser - ele próprio – o causador do emporcalhamento da mesma. Nesse círculo vicioso do suja, limpa e suja, só consegui imaginar duas razões para o gesto: Descuido ou distracção.


A não ser que, ainda que inconscientemente, quisesse garantir o seu próprio posto de trabalho …

quinta-feira, novembro 05, 2009

O cai-cai


O título da crónica de hoje poderia sugerir que eu iria escrever sobre aqueles vestidos mais versáteis e sexy que, sem alças, parecem querer cair a qualquer momento. Não, lamento desiludir os meus Amigos, mas o tema que vos trago é bem menos agradável.


O cai-cai a que me refiro é o da perda de qualidade em duas áreas específicas que devem merecer a nossa atenção.


A primeira, Portugal caiu (o primeiro cai) 14 posições no ranking da liberdade de imprensa. Segundo a organização “Repórteres Sem Fronteiras” o nosso país passou do 16º posto para o 30 lugar na lista dos países que mais respeitam o trabalho dos jornalistas. Apesar de Portugal, em termos mundiais, continuar numa posição razoável, mesmo assim, considero que uma queda tão acentuada no que respeita … ao respeito pela liberdade de imprensa é, no mínimo, preocupante.


A segunda escorregadela (o outro cai) tem a ver com as desigualdades entre homens e mulheres no acesso a recursos e oportunidades. Em 2006 Portugal estava em 33º lugar, em 2007 caiu para 37º e em 2008, pelo terceiro ano consecutivo, voltou a cair agora para a 39º posição. Outra descida que nos deve preocupar.


Convenhamos que todo este cai-cai é demasiado. Também nestas áreas o nosso país vai ficando mais longe dos outros. Porquê?





terça-feira, novembro 03, 2009

A grande questão


Já aqui reflectimos diversas vezes sobre a tão falada crise de valores, acabando quase sempre – face aos múltiplos desvios comportamentais verificados - por nos interrogarmos onde é que, afinal, falhámos.


Será que nós, enquanto pais e educadores, não soubemos transmitir aos nossos filhos as tais regras de conduta fundamentais que regem a vivência em sociedade? Ou será que foi a própria sociedade, nomeadamente o Estado (que dá sempre jeito culpar porque não tem rosto) que não pôs á nossa disposição os meios necessários para que as novas gerações tenham hoje valores idênticos aos que nos foram legados?


Não sendo fácil obter uma resposta cabal nem, tão-pouco, conseguir afastar um sentimento de culpa que acaba por estar sempre presente, será talvez mais inteligente tentarmos analisar a questão de uma outra forma. E a nova resposta poderia ser a que foi dada num congresso sobre vida sustentável:


“Todos pensam em deixar um planeta melhor para os nossos filhos. Quando é que começaremos a pensar em deixar filhos melhores para o nosso planeta?”


Será que, de alguma forma, temos dado demasiada protecção aos nossos jovens? Será que a maneira de os educar foi a melhor? Não seria pedagogicamente mais adequado torná-los mais conscientes e responsáveis? Tenho pensado muitas vezes sobre o assunto mas interrogações permanecem.

segunda-feira, novembro 02, 2009

Que “sucata” de país


A notícia rebentou. Um vasto esquema de corrupção montado por um sucateiro "apanhou", com a sua rede tentacular, altos, médios e pequenos quadros de empresas públicas, funcionários de Câmaras Municipais, agentes de forças policiais e antigos titulares de cargos políticos entre outros. Um puzzle complexo em que dezenas de pessoas foram corrompidas e se trocaram favores por dinheiro e prendas caras.


A investigação da Judiciária, designada por “Face Oculta”, ainda não está concluída. Contudo, alguns dos nomes envolvidos já foram anunciados. Por exemplo, o de Armando Vara, ex-ministro socialista, ex-administrador da Caixa Geral de Depósitos e Vice-Presidente do BCP, o maior Banco privado português. O mesmo que foi apanhado numa escuta a pedir dez mil euros ao tal sucateiro para que, através da sua influência, se escancarassem as portas para os negócios com a EDP, Petrogal, Refer, Galp Energia e outras empresas públicas e privadas.


Enfim, a marosca está a ser deslindada. Enquanto isso, gostaria de transcrever as palavras de Joe Berardo, um dos principais accionistas do BCP:


“não tenho informação suficiente para comentar. No entanto, acho invulgar o que está a acontecer. Não dá para acreditar que pessoas tão bem remuneradas se sujeitem a isto por causa de 10 000 euros. Quando se fala de milhões ainda pode haver a tentação. Mas o montante é ridículo …


Por outras palavras, “todo o homem tem o seu preço".


Vergonhoso, digo eu. Quando se tenta passar a ideia de que o crime compensa … a partir de uma dada importância, quando a cultura da aldrabice parece estar instalada na sociedade, o desespero parece desabar sobre nós e só podemos manifestar a nossa indignação dizendo


“Que sucata de país este”!