domingo, maio 31, 2009

Os Barões e o Justiceiro

Para aqueles que andam distraídos com o que se passa na justiça (mesmo para os que vociferam a sua indignação contra uma justiça lenta, cara e para poderosos) e para os que ainda não compreenderam o que está verdadeiramente por detrás das numerosas guerras que o Bastonário da Ordem dos Advogados – Marinho Pinto – vem travando com os diversos intervenientes no sector, deixo-vos com a transcrição de um artigo do jornalista João Garcia, a quem cumprimento, publicado no Expresso de 23 de Maio, intitulado “Os Barões e o Justiceiro”.


“A vida dos advogados mudou. Os senhores de elegantes fatos às riscas, que entravam nos tribunais com óculos de armação em ouro, de brilhantes pastas de cabedal castanho e beca dobrada sobre o braço direito foram substituídos por jovens clientes de pronto-a-vestir barato e mochila de lona às costas. Os primeiros ainda existem, talvez até estejam mais ricos e poderosos, mas contam cada vez menos no universo da profissão; os segundos são cada vez mais.
A advocacia deixou de ser, para a maioria, uma profissão liberal. Hoje, os advogados são, em regra, trabalhadores dependentes (mal) pagos a recibos verdes.
Não é de estranhar, portanto, que o Bastonário dos Advogados tenha deixado de ser um sócio fundador de uma das grandes sociedades e tenha passado a ser o candidato dos “sem-terra” da profissão – sem poder nos escritórios, mas com valioso voto na Ordem.
Passa por aqui a guerra que está instalada: o justiceiro Marinho tem pela frente os barões da advocacia”.


Goste-se, ou não, do jeito como Marinho Pinto efectua as suas intervenções, a verdade é que muita gente se reconhece nas acusações do Bastonário.

Pode condenar-se a forma mas não, seguramente, o conteúdo.

A frontalidade e a clareza (polémicas quase sempre) e a coragem como denuncia situações, órgãos e cargos fazem-nos acreditar que ainda há esperança de, um dia, virmos a ter uma justiça justa, servida por pessoas sérias. A bem dos cidadãos.

quinta-feira, maio 28, 2009

Nova recolha do Banco Alimentar Contra a Fome





Não esqueçam. No próximo fim-de-semana, 30 e 31 de Maio, é tempo de continuarmos a alimentar esta ideia.



Enganos

Aqueles que leram o último texto publicado neste espaço e que, de seguida, se foram apercebendo da minha ausência ao longo dos dias, devem ter imaginado que, pura e simplesmente, eu estaria no Brasil a solidarizar-me com algumas almas destroçadas por falta de namoro. Enganaram-se.

Na verdade, apenas achei que necessitava de uma pausa e rumei até ao sul do país. Queria uns dias de liberdade e de sol, de praia se possível. Enganei-me. Os dias estiveram nublados, algo frios, desagradáveis por vezes.

Mas para além disso queria também aproveitar a escapadela para tentar descobrir quais as propostas apresentadas pelos partidos que estão neste momento a concorrer à Europa. Ao fim e ao cabo, tinha a esperança que - fora da capital – pudesse perceber quais eram, de facto, as ideias que esses partidos e movimentos têm na manga para convencer o eleitor.

Apesar do esforço, devo dizer que nada encontrei, se bem que conseguisse ver alguns cartazes de propaganda, cuja mensagem, de tão má que é, não conseguirá sequer convencer os próprios autores, quanto mais aqueles a quem querem cativar. Slogans e cartazes que não passam, na minha opinião, de mero lixo político, nada mais. Mas, pior do que isso, o que eu vi é que esta campanha mais parece dirigida para as legislativas ou para as autárquicas e não para as europeias, de tanto que se ouve falar da governação e dos problemas do país e nada sobre a Europa. Enganei-me de novo.

Depois desta pequena ausência e de tantos enganos pelo caminho, só espero que os fiéis (e obstinados) leitores deste blogue, não se enganem também e façam, eles próprios, umas férias … permanentes.

segunda-feira, maio 18, 2009

Quero namorar

Ora aí está uma bela iniciativa que poderá trazer um bem-estar acrescido a muita gente. Porventura com resultados até bem mais palpáveis do que aqueles que poderão advir das medidas anti-crise levadas a cabo pelos governos.

Um denominado “Movimento dos Sem Namorados” organizou uma manifestação de centenas de solteiros que protestaram no Rio de Janeiro o facto de não terem namorado. Segundo a organização existem no Brasil mais de 50 milhões de adultos que ainda não encontraram uma cara-metade.

Pelas imagens que vimos na televisão, desfilaram muitos “gatos” e “gatinhas” de fazer perder a respiração. O que é que se passa, minha gente? Porque é que tantas pessoas querem partilhar afectos e não encontram as suas almas gémeas?

“Cansei de ser sozinho”, “Quero namorar” ou “Namoro já” eram alguns dos cartazes que os manifestantes erguiam em desespero.

Foi então que pensei – eu que estou sempre pronto a ajudar os mais carentes – que talvez fosse uma boa ideia marcar viagem até ao Brasil.

Temos que ser uns para os outros, “né”?

domingo, maio 17, 2009

“À mulher de César…”

Acredito que Cavaco Silva seja um homem sério. Mas, digo-o com todo o respeito, mostra-se, por vezes, demasiado simplório quando fala.

Agora foi na Turquia. Ao terminar a visita oficial àquele país, deslocou-se à região da Capadócia onde, perante os jornalistas, afirmou:

"Visitar a Capadócia era desde há muito tempo um sonho da minha mulher. E depois de ler alguns livros sobre a Capadócia, eu próprio comecei a sentir-me atraído por esta parte da Turquia que considero extraordinária".

Senhor Presidente, eu sei bem o que sentiu ao fazer essa visita. Já estive também na Capadócia e concordo em absoluto que é uma região extraordinária onde, a cada passo, se respira História.

Mas há um porém. É que eu fiz essa viagem pagando-a do meu bolso. Quanto à visita do casal presidencial (e de mais toda aquela gente que os acompanhava – deputados, empresários e até a fadista Kátia Guerreiro - que nós vimos nas televisões) não estamos seguros de quem é que suportou a despesa. Sobretudo, precisamente, na ida até à Capadócia.

Admito, no entanto, que o acrescento ao roteiro oficial tenha sido oferecido pelo governo turco. Estou certo de que foi, ainda por cima tendo em conta que o apoio de Portugal à entrada da Turquia na União Europeia é precioso.
Mesmo assim, o senhor Presidente deveria ter tido um pouco mais de cuidado com as suas palavras. Provavelmente não terão soado nada bem a quem enfrenta tantas dificuldades no dia-a-dia e que não consegue sequer “matar” as suas necessidades essenciais quanto mais satisfazer sonhos, por mais simples que sejam.
E dizer que "visitar a Capadócia era desde há muito tempo um sonho da sua esposa", poderá ter levado algumas pessoas a pensar que, depois da visita de Estado, a excursão extra estava a ser paga pelo erário público.

É que, como se costuma dizer, “ À mulher de César não basta ser, tem também que parecer”.

quinta-feira, maio 14, 2009

Mais um projecto-lei

Podia, se para aí estivesse virado, publicar uma série de propostas de lei que saem das mãos e das cabecinhas dos nossos ilustres deputados da Assembleia da República. De todos os partidos, sublinhe-se.

Desta vez, quem se aprimorou a imaginar tamanha pérola foi o Partido Ecologista os Verdes, que não se ficou por menos que:

“É proibida a aquisição, venda, troca ou cedência a qualquer título, detenção, manutenção, exibição, apresentação pública ou integração em espectáculos de quaisquer animais não-humanos selvagens, por circos ou outros espectáculos itinerantes em território nacional”.

Pelo que, a proibição exigida pelos “verdes” resume-me aos animais não-humanos selvagens porque quanto aos humanos selvagens (que abundam por aí) poderão ser comprados ou vendidos e exibidos livremente em qualquer lugar.

Discutível o conteúdo, péssima a forma.

Depois não venham queixar-se de que há quem diga por aí que no nosso país existem leis de má qualidade.

quarta-feira, maio 13, 2009

A Lei do Financiamento dos Partidos

Na crónica que escrevi ontem sobre os gastos previstos pelos partidos para as próximas europeias, ficou bem patente que todos eles se estiveram nas tintas para a contenção das despesas e que mostraram uma enorme falta de imaginação e de bom-senso. De forma inaceitável, diga-se.

Se querem brincar às campanhas eleitorais, tudo bem. Mas, pelo menos, façam-no recorrendo às novas tecnologias que são muito mais baratas. Não recriem as velhas receitas de cartazes que nada dizem nem, tão-pouco, utilizem a estafada e pacóvia técnica de distribuir montanhas de aventais, de esferográficas e de abanicos só para conseguirem mais uns votos.

Mas ainda a este respeito, gostaria de acrescentar mais uma coisa. É que a subvenção que o Estado costuma dar para estas “feiras”, aquilo a que se costuma chamar “Lei do Financiamento dos Partidos” foi agora alterada com a aprovação unânime de todos os deputados com excepção, honra lhe seja feita, de António José Seguro do PS.

E o curioso é que embora a lei fosse aprovada por todos (vá lá saber-se porquê …), com a excepção referida, os dois maiores partidos já falam em corrigir as alterações agora introduzidas.

Não é este o fórum próprio para discutir o que é que está na base desta vontade súbita em alterar a alteração. Só lhes digo que se a lei agora aprovada pela quase unanimidade chegasse a ser promulgada pelo Presidente da República, o que duvido, possibilitaria que as campanhas eleitorais pudessem vir a ser um negócio bem lucrativo. Seria a mais completa sem-vergonha.

Ainda assim, resta-me a dúvida. Porque é que essas “cabecinhas pensadoras” não analisaram devidamente e em tempo as alterações à lei? Se o tivessem feito, não necessitariam, agora, de fazer esta triste figura.



terça-feira, maio 12, 2009

Desperdício

No preciso momento em que somos bombardeados com as piores notícias sobre a crise financeira e económica que nos afecta a todos, em que o desemprego continua a subir desvairadamente, em que a maioria das empresas atravessa dificuldades enormes a ponto de ir estender a mão ao Estado, não é que o próprio Estado está disposto a oferecer, de acordo com a lei, 4,5 milhões de euros para o financiamento das campanhas eleitorais dos partidos e movimentos que concorrem às próximas eleições para o Parlamento Europeu?

Um valor que, calculem, corresponde a qualquer coisa como 10.000 salários mínimos nacionais. Mas será que está tudo doido?

Daí que me sinta horrorizado com o desperdício de tamanha fortuna. É inacreditável que as treze forças políticas que vão concorrer se proponham gastar, entre subvenções estatais e umas quantas angariações de fundos entre os simpatizantes, alguns milhões de euros.

E quando se olha para os números e se dá conta que só o PSD espera gastar 2,2 milhões de euros (mais 95% do que nas últimas europeias), o PS 1 milhão e 520 mil (mais 9%), a CDU 1 milhão e 200 mil (mais 185%), o Bloco 725 mil (mais 301%) e até o Movimento do Partido da Terra 1 milhão e meio de euros, o que é que lhes parece que vai sentir o comum dos cidadãos?

Pode parecer demagogia da minha parte mas considero inaceitável que se gaste tanto dinheiro desta forma e numa altura destas, ainda por cima para falar aos portugueses sobre as europeias que, toda gente tem consciência disso, não interessam grandemente à generalidade dos cidadãos. Aliás, na última sondagem conhecida só 36% dos eleitores já tinha decidido votar. E esses sabem já, e há muito, para onde vão os seus votos.


segunda-feira, maio 11, 2009

Atenção aos levantamentos de dinheiro em ATM



Não costumo servir de veículo à divulgação deste tipo de notícias. Porém, para casos como este, estou sempre disponível para ajudar.

A questão é simples. Não façam levantamentos de dinheiro em caixas automáticas (ATM’s) do Banco Português de Negócios (BPN).

Porquê? Pura e simplesmente porque as máquinas não pertencem à rede Multibanco, da SIBS, mas sim à Netpay que cobra comissões sobre os levantamentos.

De acordo com a DECO um levantamento de 100,00 euros pode custar até 5,83 euros.

Tudo sem darem qualquer explicação a quem quer que seja, cliente ou não do “famigerado BPN”.


Mas para que não restem dúvidas, consultem os sítios que a seguir indico:



http://ww1.rtp.pt/noticias/index.php?headline=98&visual=25&article=366349&tema=29

e


http://www.deco.proteste.pt/dinheiro/bancos/comissoes-bancarias-netpay-do-bpn-tem-custos-s540761.htm






domingo, maio 10, 2009

Quero aplaudir

Muita gente recordar-se-á de "Sir Humphrey", uma espécie de director-geral da função pública, na célebre série cómica inglesa “Sim, Senhor Ministro”, passada na televisão com grande êxito no início dos anos 80 do século passado.

Mas, para quem nunca viu a série, lembro que ele simbolizava o grãozinho de areia que emperra qualquer engrenagem. Aquele que tudo complicava para que nada se alterasse. Quando o Ministro dos Assuntos Administrativos queria pôr em prática qualquer medida que visasse a melhoria dos serviços públicos, Sir Humphrey conseguia sempre, com os seus contactos políticos e a argumentação enviesada, que as coisas ficassem rigorosamente na mesma.


Pois em Portugal o Ministro Teixeira dos Santos era bem capaz de ter na Administração uns quantos “Humphrey”. Alguns que muito embora a lei os obrigue a avaliar o desempenho dos seus funcionários em prazos conhecidos de todos, decidiram “ir andando e olhando para o lado” até a coisa ser esquecida.

Só que o Ministro das Finanças estava atento e, perante a negligência de 10 dirigentes a quem incumbia a tarefa, afastou esses dez quadros de topo por incumprimento das suas obrigações.

Em Portugal, não estamos habituados a assistir à punição dos infractores. Por isso mesmo desejo expressar aqui a minha satisfação.

Bravo, quero aplaudir.

sexta-feira, maio 08, 2009

A frase do dia

Perante tantas dificuldades que se avolumam dia após dia, os sonhos e desabafos da maioria dos portugueses bem podem ser expressos na frase:


"O meu grande sonho é ser pobre um dia,

porque ...

ser todos os dias é .... lixado!"


quinta-feira, maio 07, 2009

Quando a acusação é mal formulada

Esta coisa de se andar sempre a falar mal da justiça tem que se lhe diga. Claro que não me refiro, neste momento, ao estado a que chegou a justiça no nosso país, nomeadamente no que concerne à sua morosidade e custo. Não, esses são aspectos que já se entranharam profundamente nos nossos espíritos, e de tal forma que, por força do hábito, nem reclamamos mais. Não gostamos mas acomodámo-nos.

O que eu quero dizer é que quem pensa recorrer à justiça tem que estar preparado para a possibilidade de ter que enfrentar certos enredos da lei que nem sempre são entendíveis por quem não é da especialidade.

Ora vejam este caso verídico:

Uma gatinha, de seu nome Maria, vivia com a sua dona no Bairro dos Anjos em Lisboa. Um dia, vá lá saber-se porquê, saiu de casa sem avisar e foi parar a Carnaxide. A Maria foi encontrada por uma outra senhora que se compadeceu do seu estado – presumivelmente estava ferida e maltratada – recolheu-a e levou-a ao veterinário. Enfim, cuidou dela.

Dado que a Maria era portadora de um chip com informações sobre a própria, o médico que a tratou entrou em contacto com a tal senhora dos Anjos e disse-lhe que a gata só seria devolvida quando estivesse curada.

Tanto bastou para que o verniz estalasse entre a dona inicial e a que se lhe sucedeu e o caso fosse parar a tribunal. O processo teve início há quase três anos.

Enquanto se trocavam razões e os respectivos advogados tentavam acordos impossíveis por recíproca irredutibilidade das partes, a Maria desapareceu de novo. Até hoje.


E é aqui que as coisas se complicam. Enquanto as “duas donas” continuam a disputar a posse da Maria que, entretanto, já vai a caminho de não sei onde, o Ministério Público decidiu que a questão não poderá ser julgada porque a acusação está mal formulada.

E porquê, perguntarão? Porque os factos tal como estão descritos, correspondem não ao crime de furto mas … de aquisição de coisa achada, porque falta o elemento de subtracção".

Ou seja, o juiz não pode decidir sobre um crime de furto precisamente porque o objecto/elemento/coisa roubada não existe. Seria absurdo.

Assim, e para que o julgamento prossiga, é necessário que alguém dê a volta à acusação mal formulada ou que a Maria se digne a aparecer de novo. Se não …

quarta-feira, maio 06, 2009

Juro que é verdade

“Toda a gente está convencida de que o IKEA vende móveis baratos, o que não é exactamente verdadeiro. O IKEA vende pilhas de tábuas e molhos de parafusos que, se tudo correr bem e Deus ajudar, depois de algum esforço hão-de transformar-se em móveis baratos. É uma espécie de Lego para adultos. Não digo que os móveis do IKEA não sejam baratos. O que digo é que não são móveis. Na altura em que os compramos, são um puzzle. A questão, portanto, é saber se o IKEA vende móveis baratos ou puzzles caros”.


Em Março do ano passado, Ricardo Araújo Pereira escreveu um texto engraçadíssimo na Visão, intitulado “IKEA: enlouqueça você mesmo” de que, hoje, reproduzo um extracto.

Logo nessa altura achei que ele abordava apenas um dos conceitos subjacentes ao modelo IKEA. Mas há outros e todos eles me deixam à beira de um ataque de nervos. Ou seja, eu enlouqueço não só por ir comprar umas quantas tábuas que tenho que pagar, carregar e montar para poder vir a ter um móvel decente (se tiver sorte), como também por ter que – obrigatoriamente - percorrer quilómetros e quilómetros atrás de setas “plantadas no chão” até à saída, para conseguir comprar uma “utilidade” que encontrei logo à entrada da loja. Sem que, de resto, haja uma única porta que nos permita fugir dali.

Há ainda uma outra coisa que me deixa deprimido. É que certas pessoas interiorizaram a ideia de que ir ao IKEA obriga a que tenhamos que comer lá, o que pressupõe manducar almôndegas com batatas fritas aos palitos ou, quando muito, salmão à sueca. “Petiscos” a que eu até achei graça nas primeiras vezes mas que, com a continuação, já não os posso ver. Cansei.

Porém, as coisas acontecem quando menos se esperam. Na semana passada, indeciso entre ir fazer passadeira ao ginásio ou esfalfar-me numa das tais caminhadas pelas setas do chão do IKEA, acabei por optar pela segunda hipótese. Então não é que ao passar pelo restaurante eu vi pessoas a comerem favas com entrecosto à portuguesa? A sério, juro que vi!


segunda-feira, maio 04, 2009

O Oceanário e Sophia



Há muitos anos que não visitava o Oceanário de Lisboa. Nem sei mesmo se o tinha feito depois de ter encerrado a Expo 98. Já lá vão uns anos e escusado será dizer que adorei voltar.

De uma forma geral quando pensamos no Oceanário imediatamente imaginamos os lindíssimos e multicoloridos peixes que povoam as suas águas. Mas no Oceanário há muito mais para ver. Na verdade, temos ali a possibilidade de mergulhar num universo onde podemos encontrar cerca de 16 000 animais e plantas de mais de 450 espécies, inseridos em ecossistemas naturais.

Cardumes, tubarões, peixe-lua, raias elegantes e um sem número de outras espécies, todas elas a deslizarem num gigantesco aquário central e em quatro outros aquários mais pequenos que nos permitem viajar pelos cinco continentes. Ah, e sem esquecer, naturalmente, as lontras e os pinguins que são sempre motivo da nossa atenção especial. Tudo muito belo e cativante.

Porém, desde 2004 o Oceanário de Lisboa, o maior da Europa, tem um outro motivo de interesse. Por todo o recinto, estão expostos alguns belos poemas de Sophia de Mello Breyner Andresen, poemas retirados da “Antologia Mar”.

Pena é que a maioria das pessoas não se detenha uns momentos junto aos acrílicos onde se oferecem tão belas composições. Uns porque a pressa os empurra para o cumprimento de programas rigorosos, outros porque as crianças, passados os momentos de excitação iniciais, pressionam os adultos a apressarem o passo em direcção ou em busca de qualquer outro estímulo, outros ainda porque não entendem a nossa língua e outros, por fim, porque aquilo lhes diz nada.

Por isso, aproveito a ocasião para sugerir que, numa próxima visita ao Oceanário de Lisboa, parem uns breves momentos junto a cada um dos poemas de Sophia.

A começar logo à entrada, onde se pode ler:

“Inscrição

Quando eu morrer voltarei para buscar
Os instantes que não vivi junto do mar”


Ou, num dos vários painéis:


“Os navegadores

Eles habitam entre o mar e o vento
Têm as mãos brancas de sal
E os ombros vermelhos de sol
Os espantados peixes se aproximam
Com olhos de gelatina”


Ou, ainda, mesmo à saída:

“Mar, metade da minha alma
É feita de maresia”


domingo, maio 03, 2009

Mais respeito



Esta semana a comunicação social deu o devido destaque a um português - João André - que, com 85 anos, concluiu o 12º ano.

Ribatejano de fibra, este homem simples que não teve a oportunidade de estudar quando era novo, decidiu “vingar-se” agora e voltou à escola apenas com uma única finalidade: aprender.

A cerimónia da entrega do diploma teve a presença da Ministra da Educação e do Primeiro-Ministro que, já se vê, aproveitou as câmaras de televisão para dizer como estava orgulhoso de ver um português de têmpera conseguir um galardão que tinha sido possível alcançar justamente porque havia um programa “Novas Oportunidades” lançado pelo seu governo.

Percebia-se que Sócrates estava ali em campanha eleitoral e as suas palavras saíam-lhe da boca, a coberto de um sorriso vagamente hipócrita, frias e formais e nunca se notou qualquer sinceridade nem emoção no que dizia. Palavras, apenas palavras.

Mas, e era aqui que eu queria chegar, Sócrates foi mais longe ao dirigir-se por diversas vezes a João André de uma forma grosseira (no mínimo), tratando-o por você quando a idade do homenageado, a sua dignidade e dimensão humana exigiam um tratamento mais respeitoso.

No dia seguinte tivemos o prazer de voltar a ver João André na SIC Notícias numa entrevista que concedeu a Mário Crespo. Uma delícia. Como é habitual, Mário Crespo foi atencioso e delicado, deixou falar o entrevistado e, então, pudemos descobrir não só um “jovem” que conseguiu concluir o seu 12º ano aos 85 anos como o homem experiente que pinta telas e pratos, molda pedra, faz peças em ferro, cerâmica e vitral e escreve poesia popular. Um homem que gosta de viajar e que pedala 50 quilómetros por semana, um excelente conversador e uma experiência de vida que transmite e que encanta e que, apesar da idade, continua a sonhar. O truque é "nunca parar", afirmou. Uma entrevista excelente que deixou muita gente emocionada, incluindo o próprio entrevistador.

João André é bem o exemplo do querer. Estudou agora porque só agora pôde e porque sempre teve vontade de aprender. E dá gosto ver um ser humano tão tranquilo, tão humilde, que quer saber mais e que, ao mesmo tempo, consegue também ensinar aos mais jovens, incluindo os professores, os seus saberes acumulados durante a vida.

O que eu não gostei mesmo nada foi da forma como o primeiro-ministro se dirigiu ao Senhor João André. Seguramente ele merecia mais respeito.