quarta-feira, março 31, 2010

Boa Páscoa


Tinha pensado que o texto de hoje seria escrito apenas para desejar a todos uma Páscoa Feliz. Já lá vamos. Antes disso, porém, achei que deveria chamar a vossa atenção para a história do coelhinho da Páscoa e dos seus ovos de chocolate.


Como sabem (e se não sabem deviam fazer como eu que fui à wikipédia), há diversas explicações para esta tradição. A que mais me encanta, no entanto, é aquela que conta que uma mulher pobre coloriu alguns ovos de galinha e escondeu-os para oferecer aos filhos como presente de Páscoa. Quando as crianças descobriram os ovos, um coelho passou correndo e isto foi o suficiente para que se espalhasse a história de que tinha sido o coelho a trazer os ovos.


Esta é a lenda. A verdade, porém, é que os coelhos não põem ovos e, assim sendo, porque se iriam dar ao trabalho de carregar objectos assaz delicados? E porquê só na Páscoa? E ainda que houvesse os ovos, porque é que eles iriam ser de chocolate e não de outra coisa qualquer? Perante tais e inquietantes dúvidas há que ter atenção aos coelhinhos e aos ovos da Páscoa.


E pronto, agora sim, é a altura de vos desejar uma Boa Páscoa.

terça-feira, março 30, 2010

Afinal, o crime compensa


Hoje apetece-me contar uma história. Era uma vez um senhor que para ganhar uns concursos de obras públicas “oferecia” (desinteressadamente, já se vê) uns dinheiritos a quem lhe facilitasse a vida, entregando-lhe o negócio de mão beijada, com prejuízo de outros concorrentes. Ou seja, corrompia quem podia decidir. O tal senhor era, portanto, o corruptor e os funcionários, mestres-de-obras, arquitectos, directores-gerais e quejandos os corrompidos. E a vida lá foi passando sem grandes sobressaltos. Todos eram felizes.


Até que um dia, qual João Ratão movido pela curiosidade que o levou a cair no caldeirão, o senhor tentou corromper um determinado autarca que, pessoa séria, não aceitou a tentativa de suborno e denunciou-o. Houve julgamento e o dito senhor – o corruptor – foi condenado ao pagamento de uma multa de cinco mil euros por corrupção activa.


Só que o advogado do autarca, numa entrevista que concedeu, terá apelidado o tal senhor de “corrupto e vigarista”. Está bem de ver que “quem não se sente não é filho de boa gente” e o visado – o corruptor que embirrava com quem lhe chamava corrupto – acusou o advogado por difamação. No novo julgamento, o tribunal achou que a acusação era forte de mais (embora o tal senhor já tivesse sido condenado por corrupção) e condenou o “patife do advogado” a pagar à “vítima” 13 mil euros pela prática de crime de difamação agravada e danos morais.


Vitória, vitória, acabou-se a história.


Não, não acabou ainda. Falta dizer que a história é verídica e o tal senhor, empresário e corruptor assumido, dá pelo nome de Domingos Névoa (o tal do negócio da Braga Parques/Parque Mayer) e o advogado do autarca chama-se Ricardo Sá Fernandes.


E falta também referir que a história tem uma moral: “Afinal, o crime compensa”. É que o malandro do corruptor condenado a pagar cinco mil euros pelo crime que cometeu, conseguiu depois sacar treze mil “a quem o ofendeu tão injustamente”. Com tudo isto, a tenebrosa figura de Domingos Névoa lucrou oito mil euros e deve estar ainda a rir-se a bandeiras despregadas à custa da justiça do nosso país.

segunda-feira, março 29, 2010

“Portuguese way of life”


Eu sei que me estou a repetir e peço-vos desculpa por isso. Mas que querem, não consigo ficar indiferente perante a notícia de que certos gestores públicos portugueses ganham vencimentos substancialmente maiores do que algumas figuras de proa da cena mundial. Pessoas com um tipo de responsabilidade e visibilidade muito superiores às dos nossos executivos e que comandam países e instituições de uma outra dimensão.


Segundo o líder do Bloco de Esquerda, Francisco Louçã, em 2009, Santos Ferreira (Presidente do BCP) e Armando Vara (Vice-Presidente do BCP com mandato suspenso) ganharam o dobro do salário de Barack Obama, enquanto que Rui Pedro Soares (o “boy” do PS e Ex-Administrador da PT), auferiu oito vezes mais do que o Presidente Norte-Americano.


A ser verdade - e não me admira nada que seja - trata-se de mais uma prova do estado a que isto chegou. Já sabíamos que Vítor Constâncio (ainda Governador do Banco de Portugal e próximo Vice-Presidente do Banco Central Europeu) ganha duas vezes e meia mais do que o Presidente da Reserva Federal Americana e, ficámos a saber agora, que Obama ganha muito mal em comparação com muitos dos nossos gestores públicos.


Dir-me-ão que o problema é que Obama recebe pouco. Pode ser que sim, mas acreditem que não estou minimamente interessado em saber se Obama ganha bem ou ganha mal. O que me interessa (e revolta) são os tais salários obscenos e completamente desajustados, ganhos por uns quantos, num país em dificuldades e em que a esmagadora maioria dos portugueses mal-pagos é chamado a contribuir para que Portugal saia do fosso em que se encontra.


Mas interessa-me também (e receio que isso venha a acontecer) a possibilidade de que em breve tenhamos alguns políticos americanos a bater-nos à porta para pedir emprego. É que aqui, pelos vistos – e nalguns estratos - cultiva-se a “Portuguese way of life”.



sexta-feira, março 26, 2010

Então, estás a viver dos rendimentos?


Esta semana encontrei um antigo companheiro de trabalho que, como eu, está reformado. Não nos víamos há tempos e, como é natural nestes casos, perguntámos pelo estado de saúde do outro, pela família, o que fazíamos agora, blá-blá-blá, blá-blá-blá. As coisas banais que nestas circunstâncias, e na maioria das vezes, é comum querer saber-se, mais por falta de assunto do que por verdadeiro interesse.


Até que ele, finório, perguntou “Ah, então estás a viver dos rendimentos?”.


Não lhe dei resposta, claro, mas a pergunta (que está completamente fora de moda) fez-me viajar até há muitos anos atrás quando era costume ouvi-la, justificada então pelo facto de haver muita gente que vivia (sobrevivia na maior parte dos casos) à conta dos juros que as suas parcas economias rendiam no banco.


Outros tempos em que as pessoas suavam as estopinhas para fazer um pé-de-meia que os descansasse de algum azar que viessem a ter e em que as taxas de juro eram minimamente apetecíveis para criar a ilusão de que o dinheiro conseguia multiplicar-se.


Hoje, as coisas são diferentes e nenhuma das premissas atrás referidas se verifica. Pelo que, a pergunta deixou de ter razão de ser. Já ninguém consegue viver dos rendimentos. Perdão, a esmagadora maioria das pessoas não consegue. Provavelmente nem os gestores públicos que viram ontem o Conselho de Ministros decidir o congelamento por dois anos dos seus “ricos” bónus, vulgo prémios de desempenho. E agora, como vai ser?

quinta-feira, março 25, 2010

Belas Refeições


Uma das minhas interrogações de há muito é, simplesmente, saber o que é que leva as pessoas a querer ser diferentes. Melhor do que os outros até entendo, mas diferentes, porquê, com que intuito?


Bem, conto convosco para me ajudar a perceber o fenómeno. Por agora, dou-vos conta de uma “original” cadeia de restaurantes – a Modern Toilet – já com sete estabelecimentos abertos na Tailândia e dois em Hong Kong.


A excentricidade não se fica apenas pelo nome. Também “curiosas” são as decorações das casas e a própria comida. Por exemplo, bancos e travessas têm a forma de sanita, mini-urinóis servem de copos e quanto à comida (deliciosa por certo) o cardápio é sugestivo: “diarreia com fezes secas”, “disenteria verde” e, nas sobremesas, pontifica o gelado de chocolate em forma de fezes.


Tirando a originalidade dos feitios, dizem que a comida é um pitéu, verdadeiras iguarias asiáticas, vegetariana e com base em frango.


O “porém” da coisa está no aspecto. Mas o que é que isso interessa, afinal? Eles quiseram ser diferentes, conseguiram-no e a moda parece ter pegado por aquelas paragens, embora não tenha a certeza que por cá – se os proprietários pensarem em vir a explorar a pacovice lusitana – venha a ter grande sucesso. E daí …

quarta-feira, março 24, 2010

Não havia necessidade


Há muito que eu acho que certos formalismos ainda existentes na nossa sociedade estão um tanto ou quanto desajustados aos novos tempos. Um bom exemplo disso são os termos jurídicos abundantemente usados pelos nossos tribunais e advogados, que parecem não ter sido alterados desde os tempos em que foram criados.


Outro exemplo é a forma regimental ainda em vigor que tem que ser cumprida sempre que alguém se dirige ao plenário da Assembleia da República. Continuam a existir fórmulas de intervenção que bem poderiam ter sido já alteradas sem que isso pusesse minimamente em causa o respeito pela Instituição Parlamento ou pelos senhores Deputados.


E quando um político mais nervoso ou estreante nas lides se esquece delas ou simplesmente está a milhas de achar que aquilo é relevante, corre o risco de ouvir o Presidente da Assembleia da República dizer que não pode fazer a sua intervenção porque a tal figura regimental não foi cumprida.


Como aconteceu ao novel Secretário de Estado da Educação, João Torcato da Mata que inexperiente, nervoso, desconcentrado e confundido cometeu, de uma assentada, uma mão cheia de crimes de lesa-regimento. Começou por tentar falar sentado e, já de pé, quis dizer ao que ia mas não evocou as palavras mágicas: “Sr. Presidente, Senhoras e Senhores Deputados”.


Entre o enfiar as mãos nos bolsos, o apertar e o desapertar do botão do casaco e o entrelaçar dos dedos das mãos, o desorientado membro do governo procurava desesperado por alguém que o fizesse sair daquela situação tão embaraçosa e humilhante.


Ir ao Parlamento enfrentar o hemiciclo que interroga e argumenta já deve ser uma dura experiência. Mas não é tudo, ainda há os formalismos. Torcato da Mata não se esquecerá disso tão cedo.


E se bem que eu questione a manutenção de tanta formalidade, percebo, também, que o Presidente não poderia tolerar os desvios legais que a forma regimental exige. O que acho é que Jaime Gama poderia ter usado um tom mais benevolente e menos ríspido. Não havia necessidade de envergonhar o rapaz daquela maneira.



Se ainda não viram, passem por

http://www.youtube.com/watch?v=niRX5PeRSyU&NR=1


terça-feira, março 23, 2010

E tudo continua na mesma


A velha questão dos pais ralharem repetidamente aos filhos pelas mesmíssimas razões de sempre deve-se, tão-somente, ao facto dos filhos persistirem em fazer aquilo que lhes dá na gana a contragosto dos progenitores. Ou seja, na prática está mal, ralha-se, os petizes não ligam peva e continua tudo na mesma.


É o que também acontece quando inúmeras personalidades (nós próprios aqui no “Por Linhas Tortas”também fazemos parte do grupo), teimam em manifestar a revolta que nos vai na alma perante os salários obscenos de certos gestores. Ninguém nos ouve ou lê e tudo continua na mesma.


Refiro-me, naturalmente, aos gestores públicos porque, dos particulares - embora aufiram rendimentos muitíssimo acima dos demais portugueses - é uma coisa que tem a ver apenas com quem manda nas empresas, patrões e/ou accionistas.


O que me incomoda à séria são aqueles senhores que gerem empresas públicas e em que está em causa o dinheiro dos contribuintes. Salários altíssimos, mordomias exageradas e prémios igualmente altos e a maior parte das vezes injustificáveis. E não me venham com aquela desculpa abstrusa de que tem que ser assim porque temos que reter os melhores gestores em Portugal. Acham que o ex-Administrador da PT, Rui Pedro Soares, uma pessoa sem currículo, um dos muitos que vivem à sombra dos partidos, merecia o milhão e meio que ganhava? Ou que os Administradores da PT deveriam ter um prémio de desempenho de 12 salários e que, agora, em nome da crise, do PEC ou da vergonha que alguns sentem, vão ficar, apenas, - coitados – com um bónus de uns míseros seis meses de salários?


Reconheçamos que os políticos, de uma forma geral, são mal pagos (depois há a questão de saber se alguns deles merecem aquilo que ganham, mesmo sendo pouco). Não se questionam os (poucos) gestores que são pagos a peso de ouro, como aconteceu a Paulo Macedo quando foi para Director-Geral dos Impostos porque se reconhecia nele características fundamentais para o bom desempenho do cargo. Que ele provou ter.


O que se põe em causa é a forma indiscriminada e injusta como são nomeados estes gestores públicos e a panóplia de benesses a que têm direito, independentemente se merecem ou não. Para além de, naturalmente, ter que se interrogar se é justa a disparidade de vencimentos entre o que uns quantos ganham e o que recebe a esmagadora maioria da população, ainda por cima num país em crise que vai voltar a pedir os maiores sacrifícios aos mesmos de sempre. É injusto, não é?





segunda-feira, março 22, 2010

Animais


Desculpem mas, hoje, vai ser curto e grosso. Para os energúmenos que compõem as claques dos grandes clubes de futebol apenas posso considerá-los de “animais”. Isso mesmo, salvaguardando as devidas e honrosas excepções, já se vê.


Ontem deveria ter sido um dia de festa. Disputava-se uma final de uma competição em que milhares de adeptos, de ambas as equipas, rumaram ao sul do país para assistir ao jogo e apoiar as suas equipas. Jovens e anciãos, famílias com miúdos, senhoras, pacíficos cidadãos que pretendiam apenas ver o futebol e sentir todo aquele ambiente do Estádio do Algarve cheio de gente.


Mas aqueles fanáticos, não satisfeitos, ainda, pelo rasto de destruição que foram deixando pelas áreas de serviço por onde passaram, lançaram pedras e ódio nos parques de estacionamento do Estádio e houve confronto físico entre os adeptos de ambos os clubes. A carga policial foi inevitável. Já dentro do Estádio arrancaram e arremessaram cadeiras para dentro do relvado, provavelmente para atingir os jogadores adversários. Selvagens!


Do jogo propriamente dito, do ponto de vista disciplinar, não houve grandes problemas mas, sejamos honestos, o capitão do FCP, Bruno Alves – que devia ser uma referência - foi demasiado violento e as suas entradas claramente “a matar” incendiaram ainda mais os elementos da claque que apoiava a sua equipa.


O futebol é um jogo muito bonito quando bem jogado e quando há desportivismo. As próprias claques são interessantes quando os seus cânticos e os gritos de incitamento suscitam o entusiasmo das suas equipas. Dão vida ao espectáculo e os estádios têm, seguramente, outro encanto. Seria desejável, por isso, que os clubes, a polícia, as estruturas do futebol ou os políticos pusessem termo, de uma vez por todas, a esta onda de violência que não dignifica o desporto e não serve a ninguém.


sexta-feira, março 19, 2010

Apesar de tudo, senti ternura


Um dia destes fui ver um filme numa sala quase vazia. Não é a primeira vez que isso acontece mas, desta feita, a coisa foi diferente. Muito perto de mim estava sentado um casal já com alguma idade que, perante tamanho desafogo, ia comentando em voz alta as cenas que iam passando na tela. Pior, antecipavam as cenas seguintes, do género “queres ver que ele agora vai dar com ela …” ou “tá-se mesmo a ver que no fim eles …”.


Enfim, viam, comentavam, interagiam entre eles de forma natural, tão natural como se estivessem em casa defronte da televisão.


E se este tipo de comportamento habitualmente me irrita, a ponto de já por diversas vezes ter enviado um sonoro “SHIUUUUUUUUUUU!” para que ninguém ficasse com dúvidas que estavam a incomodar as pessoas, desta vez, senti uma certa ternura em assistir ao diálogo que se ia desenrolando aqui e ali.


É verdade que, durante a sessão, o “ruído” me aborreceu por vezes. Ao mesmo tempo, porém, achei delicioso observar um casal bem maduro que teima em sair de casa para ir ver cinema no cinema e que é capaz de continuar a comunicar um com o outro. Nos tempos que correm, é obra.


Como disse, apesar de tudo, senti ternura.


quinta-feira, março 18, 2010

Buracos dissuasores


Vi no Facebook uma chamada de atenção sobre uma coisa que nos pode acontecer. O de cair com o carro em buracos na via pública e o que devemos fazer para sermos reembolsados pelos estragos.


Muito genericamente, e ao que li, deve-se chamar a polícia, procurar testemunhas e tirar fotografias (apesar de estas não servirem como prova em tribunal) e fazer-se um requerimento. São duas reclamações: uma pedindo a reparação do carro e outra a reclamar a resolução do buraco. Depois é fazer chegar a queixa à Aca-m (Associação de Cidadãos Auto-Mobilizados) e à Deco que remete o requerimento para a Câmara".


Basicamente são estes os procedimentos para que possamos ser ressarcidos da nota preta que vamos pagar pelas reparações. Mas o que eu achei piada nesta notícia foi uma justificação (?????) dada pelo próprio presidente da Aca-m, que dizia esta “pérola”:


“Como o investimento da Câmara de Lisboa para reparar as vias públicas é escasso, “os buracos funcionam como redutores de velocidade e acalmia do trânsito, embora não seja esse o propósito", tendo concluído desta forma brilhante “Não se deve tirar os buracos sem antes se colocarem outros meios para reduzir a velocidade".


Boa! Agora é que se vai acabar com a sinistralidade nas nossas estradas. Quem superintende sobre o estado das estradas, nacionais ou camarárias, mais não tem que espalhar uns quantos buracos pelas ditas e pronto. Os veículos são obrigados a circular com todos os cuidados e os acidentes “viste-los”, como dizia o outro.


Para mim, a questão deveria colocar-se precisamente ao contrário: sem buracos melhorar-se-ia a segurança rodoviária. Agora, essa de plantar buracos com a finalidade de serem redutores de velocidade, não lembra ao diabo.


Enfim, colocada a questão deste jeito, começo a pensar que é bem capaz de ser a mesma coisa de que comer um pastel de nata … sem nata, para não fazer mal ao colesterol. Ou melhor ainda, um pastel de nata sem pastel mesmo. É que a massa costuma ter tanta gordura.

quarta-feira, março 17, 2010

Citações


Desconfio sempre dos eternos bem-falantes que empregam muitos termos estrangeiros ou dos que se socorrem de inúmeras citações de personagens mais ou menos ilustres. Desconfio, sobretudo, destes últimos. Sinto um arrepio na pele e tenho a sensação de que estou a ser levado.


Como saber se muitas daquelas citações estão correctas, se foram proferidas pelas pessoas invocadas ou se, estas, são credíveis ou até existem ou existiram.


Por isso não pude deixar de sorrir quando ontem li uma notícia que dizia que o meio intelectual francês ficou estupefacto porque um dos mais conhecidos filósofos da actualidade, Bernard-Henry Lévy acaba de publicar um livro onde cita outro pensador francês, Jean-Baptiste Botul. Qual o mal disso, perguntarão? Nenhum, se o tal Botul algum dia tivesse vivido. Mas não, esse “famoso pensador” nunca existiu.


Na falta de certezas absolutas, quando se pretende fazer citações, é capaz de ser mais seguro não atribuí-las a alguém em concreto. Ou seja, o melhor será não mencionar quem, hipoteticamente, as terá dito. Limitem-se a dizer a expressão que vos vier à cabeça e depois rematem com um sempre convincente “Como diz o outro …”.


terça-feira, março 16, 2010

Os tabefes



Não é para me gabar mas sempre fui um aluno bastante razoável e, por isso, nunca tive problemas com as malfadadas reguadas ou ponteiradas com que alguns professores mimoseavam quem se portava mal ou, simplesmente, falhava. Para os mais novos essa coisa de, no ensino primário e mesmo no secundário, os alunos serem castigados com punições físicas pode até parecer história mas, afianço-lhes, que era assim mesmo. Os tempos eram outros e, não sei se bem ou se mal, o método em uso era aplicado sistematicamente e a maioria de nós tentava esforçada e desesperadamente não falhar para não sofrer as consequências.


“Erraste a conta de multiplicar? Vais levar duas reguadas e vais fazer o exercício mais duzentas vezes”. O simples olhar para a janela ou a conversa em surdina com o colega do lado, podia ser o suficiente para que um ponteiro “voasse” rapidamente até a um braço (ou à cabeça) para fazer o aluno retornar ao mundo dos vivos. Aquilo funcionava mesmo e fazia voltar a concentração.


Talvez a forma não fosse a melhor, por certo que o exagero era condenável, mas a verdade é que os alunos não levantavam grandes problemas aos “profs”. Até porque, depois de terem levado a sua dose na escola, os pais (que davam sempre razão aos professores) em casa se encarregavam de complementar o castigo, juntando mais um par de estalos, quando não se lembravam de outra penitência mais dolorosa.


Outros tempos, como disse. Os alunos, as famílias e a sociedade, mudaram e são agora mais problemáticos. O respeito (nem que fosse provocado pelo medo) foi-se, a autoridade dos professores e dos pais desapareceu e a indisciplina nas escolas é total.


E quando um ingénuo professor teve a ideia peregrina de que uns “tabefes ligeiros” poderiam ser a solução para travar os seus alunos mais irrequietos, e se lembrou de pedir aos pais autorização para pôr em prática a aplicação dos tabefes, o Ministério da Educação decidiu instaurar um processo disciplinar ao professor. E isto não é história, passou-se mesmo numa escola de Azeitão.


É caso para recordar o velho provérbio “Quem meu filho beija, a minha boca adoça”, que, actualizado e adaptado ao que estamos a tratar, pode ser dito desta maneira:


“Quem ao meu filho dá tabefes, tem que ser castigado”



segunda-feira, março 15, 2010

Não está na altura de estabelecer alguns limites?


Já devem ter reparado que os fins-de-semana parecem não me fazer lá muito bem. Isto porque, nalgumas segundas-feiras, as minhas crónicas transparecem algum azedume, quando não, uma ira profunda.


É que, às vezes, os casos são de arrepiar. Vejam só se alguém pode ficar indiferente perante a atitude intolerante dos pilotos da TAP que querem fazer greve se não lhes derem um aumento acima dos 8%. Mais concretamente, 8,88% para os comandantes e 8,55% para os restantes pilotos.


Tenho muito respeito pelos pilotos e deposito neles toda a confiança quando viajo nos aviões que conduzem. Mas isso não adormece o meu espírito crítico nem me impede de ver que no nosso país, onde a maioria dos trabalhadores não vai ter aumentos este ano (e alguns não os têm há anos), estes senhores querem um “aumentão” claramente desproporcionado relativamente aos demais concidadãos e ao estado das finanças públicas portuguesas. Sim, porque não podemos esquecer que a TAP é uma empresa que é detida integramente pelo Estado.


Perguntar-me-ão, mas os pilotos não deveriam ganhar muito bem porque são profissionais altamente preparados e têm um grande risco e responsabilidade? Respondo com um rotundo SIM. Mas não nos devemos esquecer das outras áreas de actividade onde os respectivos trabalhadores têm igualmente grande risco e responsabilidade e os seus vencimentos não se comparam, em nada, aos dos pilotos.


Já agora, sabem quanto ganham por mês os pilotos da TAP? Ganham, em média, 8.600 euros (os mais novos 5.000 euros e os comandantes seniores 10.000 euros)? E sabem qual é o vencimento médio em Portugal? Qualquer coisa como 894 euros.


Por isso me revolto. É indigno que em Portugal, numa empresa pública onde os restantes trabalhadores da mesmíssima empresa vão ter um aumento de 1,8%, os senhores pilotos ameacem fazer uma greve de seis dias (cirurgicamente na altura da Páscoa) se não forem satisfeitas as suas reivindicações. Uma greve que poderá causar à TAP um prejuízo de 30 milhões de euros.


Será que de empresa tecnicamente falida quererão uma empresa que vá mesmo à falência?


sexta-feira, março 12, 2010

O que é Simpatia (a uma menina)


Um poema do poeta brasileiro Casimiro de Abreu (1839 - 1860)


Simpatia - é o sentimento
Que nasce num só momento,
Sincero, no coração;
São dois olhares acesos
Bem juntos, unidos, presos
Numa mágica atracção.

Simpatia - são dois galhos
Banhados de bons orvalhos
Nas mangueiras do jardim;
Bem longe às vezes nascidos,
Mas que se juntam crescidos
E que se abraçam por fim.

São duas almas bem gémeas
Que riem no mesmo riso,
Que choram nos mesmos ais;
São vozes de dois amantes,
Duas liras semelhantes,
Os dois poemas iguais.

Simpatia - meu anjinho,
É o canto do passarinho,
É o doce aroma da flor;
São nuvens dum céu d'Agôsto,
É o que m'inspira teu rosto ...
- Simpatia - é - quase amor!

quinta-feira, março 11, 2010

Quando e como dar um presente

No passado fim-de-semana recebi um presente de aniversário. Lembro-lhes que faço anos em Dezembro. Portanto, quase três meses depois do dia certo, um familiar que já não via há tempos, entregou-me o bendito presente que, de resto, muito apreciei. Mas independentemente de quando ou o que recebi, a questão que me merece a reflexão de hoje é o presente em si mesmo. O que eu quero dizer com isto é que quando damos qualquer coisa a alguém, nos aniversários ou fora deles, devemos ter presentes certos critérios e não o:

- tenho que comprar qualquer coisa, por isso vou ali à FNAC (por exemplo) e trago o primeiro livro/disco que me vier à mão;
- vou ser diferente e vou comprar uma coisa completamente inédita, quiçá uma gravata com a fotografia de um jogador do Glorioso, mesmo que saiba de antemão que ela nunca vai ser usada porque o aniversariante é de um clube rival; ou
- vou levar uma coisa de que eu gosto e pronto.

E o busílis coloca-se exactamente porque:

- não basta comprar uma coisa qualquer porque, afinal, é a intenção que conta;
- se sabemos à partida que a prenda vai ser inútil, mais vale que se perca algum tempo extra para escolher uma coisa mais adequada ou que, pelo menos, tenha algum préstimo;
- não se definiu claramente a quem é que a oferta tem que agradar mais, se a quem a oferece ou a quem a recebe.

O que pretendo dizer é que, na minha perspectiva, tem que haver alguma imaginação, alguma inovação, algum trabalho de pesquisa, algum interesse em surpreender o destinatário da oferta. É a ele que a prenda tem que agradar ou ser útil. Só ser diferente é pouco. Ficamos pela metade se conseguimos apenas surpreender ou se a prenda agradar mais a nós do que a quem se oferece.

Claro que não estou a referir-me em concreto à pessoa que me deu o presente de aniversário. De quem veio, eu sei que todos os anos, há muitos anos, eu recebo exactamente a mesma coisa, sem tirar nem pôr. Esperem, não estou a ser justo, às vezes a coisa muda de marca.

O que não muda é o facto de eu adorar receber os cumpimentos de parabéns no próprio dia em que faço anos e, se possível, logo de manhã. Nem tão-pouco muda a minha ideia de que a oferta dos presentes deve ser efectuada nesse mesmo dia e, de preferência, que venham ao encontro da minha personalidade e dos meus gostos.

A mensagem está dada.




quarta-feira, março 10, 2010

É indigno. É desumano

Há uns anos estive em trabalho em Maputo. Foi logo a seguir ao fim da guerra civil, quando os efeitos materiais e morais do confronto eram bem visíveis por toda a parte. Moçambique era na altura considerado um dos países mais pobres do mundo e eu tive a oportunidade de constatar as enormes dificuldades sentidas pela população no seu dia-a-dia, porque o dinheiro não abundava e porque nada funcionava em condições.
Lembro-me que num dos prédios mais altos da cidade, havia pessoas que moravam nos andares mais elevados e que não podiam vir à rua simplesmente porque os elevadores estavam parados por falta de manutenção.

Corria o ano de 1994, vivia-se numa situação de pós-guerra, num país demasiadamente pobre em África.


Ontem li uma notícia publicada num jornal cá do burgo que dava conta que em Almada há pessoas que há uma década não saem de casa por falta de rampas nos prédios em que vivem.

Deficientes, idosos que têm dificuldade em movimentar-se e pessoas que estão confinadas a cadeiras de rodas, todos estão enclausurados nas suas casas há anos porque os contrutores e as entidades que deveriam licenciar e fiscalizar as obras se esqueceram do pormenor "insignificante" de incluir no projecto as necessárias rampas de acesso. Só degraus e escadas demasiado inclinadas, ainda por cima perigosas, por escorregadias, quando chove. "Erros frequentes na construção de edifícios" é como justificam o caos em que vivem.

Só os bombeiros conseguem - e com dificuldade - transportar os doentes a uma consulta, à fisioterapia ou a um hospital.

E de nada servem as múltiplas queixas e petições que os moradores estão fartos de enviar às instâncias oficiais. As autarquias continuam sem dar resposta às justas reivindicações de quem lá mora e se sente enterrado vivo.

Estamos em 2010 num país da Europa. Não existem motivos que justifiquem tamanha situação. É indigno. É desumano.




terça-feira, março 09, 2010

O PEC

A coisa complicou-se de tal forma que agora têm que ser tomadas medidas drásticas para reduzir o deficit até ao nível previsto pela União Europeia. Medidas que, inevitavelmente, passam pelo bolso de todos nós.

Já prevíamos que isso iria acontecer mas, se dúvidas houvesse, José Sócrates e Teixeira dos Santos vieram ontem anunciar o que de mais importante foi decidido para tentar controlar as contas públicas até 2013. E o PEC, a apresentar em Bruxelas, tem que demonstrar inequivocamente que o nosso país vai dar passos firmes para atingir esse objectivo. É o que esperam os senhores da União Europeia, é o que esperam os patrões dos mercados internacionais que decidem se sobem ou descem os juros dos dinheiros com que nos endividamos e é o que esperamos nós, ao tentar perceber se todos os sacrifícios que fazemos têm algum sentido.

Mas claro que o dinheiro tem que aparecer de algum lado. Assim, uma fatia desses muitos mil milhões que precisamos poupar, tem que ser recuperada pelo congelamento dos salários dos funcionários públicos, pela criação de um tecto máximo para benefícios fiscais e deduções no IRS, por um corte de 0,5% nos gastos com prestações sociais e pelo pagamento das auto-estradas que até aqui eram de borla.

Porque o Governo não pode mandar tirar fotocópias das (poucas) notas que ainda tem no Banco de Portugal nem vai – formalmente – fazer subir os impostos, a situação parece estar à beira de um beco sem saída.

Sócrates afirmou que espera conseguir um consenso político e social com os partidos da oposição sobre as medidas do PEC. E realmente fez um piscar de olhos à direita (ao adiar a construção de dois troços do TGV) e à esquerda (ao criar um escalão de 45% no IRS para rendimentos superiores a 150 mil euros), mas o Governo não teve a coragem de piscar o olho aos cidadãos. É que nós sabemos que o desemprego não baixará dos 9% até 2013 e desconfiamos que o pedido de sacrifícios não se fique por aqui.

segunda-feira, março 08, 2010

“Alice no País das Maravilhas”

Há muito que não assistia a uma estreia de um filme. Aconteceu na última quinta-feira, numa sala completamente esgotada, onde fui ver o muito aguardado “Alice no País das Maravilhas”, uma adaptação da história criada por Lewis Carroll com a perspectiva muito pessoal de Tim Burton que o realizou.

Quase 50 anos depois da primeira versão da história cinematográfica, aí temos a recriação de Alice, num filme com efeitos 3D.

Devo dizer, desde já, que não sou apreciador de filmes em 3D, agora tão em moda. Apesar de tudo, gostei deste “delírio” de Tim Burton que, afastando-se (como se esperava) da história original, apresentou uma Alice já com 19 anos, que foge a um casamento de conveniência e que mergulha num mundo fantástico de sonho e aventura, um negro mundo subterrâneo onde vai encontrar monstros e loucos, tudo à mistura com muita fantasia. Uma terra de maravilhas, mistérios e perigo, onde se trava uma luta entre o real e a ficção.

Como disse, gostei do filme. Mas, entre os meus companheiros, as opiniões dividiram-se. Houve quem achasse a realização banal e previsível, um pouco ao jeito da Disney, e houve quem tivesse ficado impressionado com tantos seres animalescos que, ainda por cima, por via do efeito 3D, vinham ao nosso encontro impetuosamente.

Apesar de para o espectador ser diferente a visualização de um filme que utiliza esta técnica dos outros considerados comuns, é bom que se diga que este não é uma película exclusivamente em 3D mas sim um filme em que esta ferramenta se harmoniza muitíssimo bem com a história que está a ser contada.

Para lhes despertar o “apetite”, aqui está um cheirinho (sem necessidade de colocar óculos especiais) do filme

sexta-feira, março 05, 2010

Joguem o Tetris, meus senhores

Se não me falha a memória, a memória é a segunda grande função do cérebro. E, segundo li, a teoria cognitiva desta capacidade intelectual não foi, até ao momento, tão desenvolvida como a da inteligência, dada a complexidade e tipos de memória existentes.

Daí que não devêssemos valorizar tanto certas “falhas” de memória dos nossos políticos que são tão martirizados quando apanhados nas tortuosas contradições que tecem (por falhas de memória momentânea, já se vê). E nós, cínicos confessos que somos, estamos sempre a postos para classificar tais “esquecimentos” de mentiras grosseiras, ditas por despudorados aldrabões.

A propósito do caso PT/TVI, Sócrates disse não ter sido informado do negócio e, mais tarde, de nada saber oficialmente. Em rigor, uma confusão ou um lapso de memória que pode acontecer a qualquer pessoa. Para mais, o Primeiro-Ministro já tem tantas outras coisas com que se preocupar …

Mais recentemente, soube-se que Paulo Rangel, um dos candidatos à liderança do PSD, já foi filiado no CDS, de 1996 a 1999, mas, segundo disse, não se recordava disso. "Nunca escondi a ligação ao CDS, apenas afirmei que não me recordava de me ter filiado". Estão a ver? Rangel não se lembra de ter conta aberta no CDS mas, por outro lado, recorda-se perfeitamente de ter escrito a carta de renúncia que enviou em 30 de Março de 1999. Ou seja, não tem a certeza se assinou mas garante que se desvinculou.

Do mesmo modo não se pode exigir a outros profissionais, por exemplo a engenheiros e mestres-de-obras, que se recordem do universo de procedimentos que têm que observar quando constroem casas. Há sempre a possibilidade de ocorrerem lapsos de memória, mesmo que, por causa deles, venham a resultar as derrocadas dos edifícios construídos. Como agora aconteceu no novíssimo Hospital de Cascais, inaugurado há uma semana, onde na zona de consultas externas caiu um tecto e se verificou uma inundação devido ao entupimento de um cano de água.

É o que eu digo, nestas coisas do cérebro, existem zonas ainda muito nublosas que fazem parecer estranhas certas atitudes. Por isso, recordo um artigo publicado numa revista científica que revela que jogar Tetris provoca efeitos positivos no cérebro.

Pois então, do que é que estão à espera? Joguem o Tetris, meus senhores.

quinta-feira, março 04, 2010

Os hábitos vão mudando



A propósito de turismo, um dos livros que estou a ler é 1 Km de cada vez” de Gonçalo Cadilhe. É um livro interessante, que se vai lendo aos poucos, e que nos dá conta de histórias por ele vividas por esse mundo.


Chamou-me a atenção um capítulo em que escrevia sobre americanos, descendentes de italianos, que pretendiam sentir-se menos americanos.


Dizia:


“O que significa sentir-se menos americano? Significa sentir-se mais europeu, desses europeus que são mediterrânicos, provençais, latinos e solares. Significa, por exemplo, tomar um aperitivo à hora dele, ao fim da tarde. Que tem um sentido oculto e profundo, na América – porque um aperitivo precede um jantar, essa coisa tão mediterrânica de sentar-se à mesa para uma refeição decente a horas “indecentes”, como às 8 ou às 9 p.m.. Os americanos, pelo contrário, não jantam – comem qualquer coisa ao fim do dia. O que quer que seja”.


Partilho, em parte, da sua tese. Nós europeus e sobretudo os latinos, gostamos de estar à mesa e não apenas para comer. É à mesa que confraternizamos com familiares e amigos, que fazemos negócios, que conquistamos amores. Costumo dizer que um dos prazeres da vida consegue-se, tão simplesmente, com um bom queijo, um bom vinho e uma boa companhia. Gostamos de jantar, de petiscar ou de tomar um copo. A mesa faz parte da nossa cultura.


Mas os tempos são outros e os hábitos estão a mudar. Já muitos portugueses se americanizaram e comem, também eles, qualquer coisa ao fim do dia. O que quer que seja. Por puro comodismo, para economizar, por dieta, por cansaço, porque se sentem bem com essa espécie de alimentação. Todas as motivações são válidas. E pelos relatos que vou ouvindo, estou em crer que bastante gente há muito que deixou de se sentar à mesa para comer uma refeição decente. Mesmo sendo latinos e europeus.

quarta-feira, março 03, 2010

Turismo de sofá

Há uns anos um vizinho confidenciava-me que tinha ido a Atenas em trabalho. Naturalmente perguntei se tinha gostado da capital grega e dos seus lugares mais conhecidos, tão carregados de História. A resposta veio pronta e completamente surpreendente:


“Em oito dias só saí do hotel uma única vez para visitar a cidade. De resto, fiquei pela piscina …”.


Nem queria acreditar. Então o fulano tinha a oportunidade de ir até ao outro lado da Europa e aproveitar a estadia para conhecer o Parthenon, andar pelas ruas da cidade, eu sei lá que mais, e ficava no hotel para banhar-se numa piscina que de Homérica pouco teria. Puro desperdício, pensava eu.


O tempo e as transformações que ele sempre trás, fez com que eu passasse a considerar o meu vizinho como um homem muito à frente do seu tempo. Mas só comecei a pensar nisso, quando se começou a falar em Couchsurfing, a maior rede social do mundo de alojamento gratuito, o chamado turismo de sofá. Um turismo que alberga “turistas” a quem já não interessa visitar os monumentos dos países que visitam mas que preferem tão-somente deslocar-se para conhecer pessoas de culturas diferentes, saber como elas vivem o dia-a-dia e viver isso com elas. Esse é o intuito, o resto já é passado.


Bem podem dizer-me que com a internet podemos visitar, e em pormenor, os lugares mais longínquos e inóspitos do mundo. É verdade que sim, só que, nada substitui o nosso olhar. O estar lá e o vermos as coisas com os nossos olhos é completamente diferente de vermos as mesmas paisagens ou locais em belíssimas fotografias ou pela net, ainda que essas imagens sejam de altíssima qualidade.


Eu que sou doutros tempos e que continuo a interessar-me por belas e exóticas paisagens e monumentos com história, olhados e admirados no próprio local, não consigo ficar indiferente ao facto de dois em cada mil portugueses estarem disponíveis para dormir em casa de desconhecidos fora do país e para acolher, em troca, estrangeiros na própria casa, oferecendo-lhes dormida e companhia.


Turismo de sofá? Não, para mim não, obrigado.





terça-feira, março 02, 2010

O “Devir”

Um dos resultados de tentar acompanhar as modas, apesar de já ter idade para ter juízo, é a admiração que provoco nalgumas pessoas bem mais novas que, quiçá, me julgariam a milhas de tais modernices.


Foi o que aconteceu há dias quando, depois de ter aderido ao facebook, um jovem amigo me enviou a seguinte mensagem: “Olá, é com grande satisfação que o recebo aqui na minha humilde página. Gostaria de felicitá-lo pela sua atitude perante a vida, pois só assim conseguirá acompanhar aquilo que muitos chamam de “Devir”.


Para além das palavras de amizade, o que me deixou um tanto ou quanto aflito foi o termo “Devir” que, num primeiro momento, julguei estar relacionado com qualquer actividade extra-terrestre.


Afinal não. Segundo a wikipédia (mais uma vez ela), o “Devir” é um conceito filosófico que qualifica a mudança constante, a perenidade de algo ou alguém. Traduz-se, de forma mais literal, nas palavras de Heraclito (filósofo nascido em Éfeso – 540 a.C./470 a.C. - e considerado o “pai da dialéctica”) em “a eterna mudança do ontem ser diferente do hoje”. Tão simples como isso.


Portanto, ao ser incluído nessa onda que gera a mudança que se verifica em cada dia e fazendo parte dos agentes que protagonizam o “Devir”, só posso dizer que me sinto feliz. ESTOU VIVO!

segunda-feira, março 01, 2010

Fidalgo Lavrador


A minha mãe contava que quando eu era bebezinho uma vizinha do prédio vaticinava o meu futuro dizendo: “Este menino vai ser um fidalgo lavrador”.


Lavrador não fui mas sinto que de fidalgo devo ter herdado alguma coisa, por pequena que seja, embora sem fortuna.


A minha riqueza consiste no prazer de conhecer pessoas e lugares interessantes. Como aconteceu no passado sábado em que fui almoçar ao Hotel Olissipo Lapa Palace, mais conhecido pelo Hotel da Lapa, em Lisboa.


Este ano alinhei de novo no desafio de ir almoçar/jantar a alguns restaurantes mais “in”, daqueles que participam na 3ª edição da Lisboa Restaurant Week by “Sabor do Ano” e que a troco de uns acessíveis 20 euros (19 para o restaurante e 1 para uma Instituição de Solidariedade Social) servem uma refeição completa, cheia de requinte, dentro de aquilo que normalmente se conhece como cozinha de autor.


É verdade que nem sempre as refeições correspondem aos mínimos que cada um estabelece como aceitáveis. Alguns chegam a provocar umas sonoras gargalhadas e uma vontade enorme de entrar no Mac mais próximo. Não foi o caso desta vez.


O Hotel da Lapa é um lugar muito agradável e sofisticado e o almoço foi simpático.


Começámos por uma


“Terrina de Fígado de Aves com Cogumelos Selvagens e Salada Fresca, Compota de Tomate Verde e Vinagrete de Citrinos”,


avançámos por uns


Lombinhos de Porco com Duxelle de Girolles em Massa filo, Cama de Grelos e Batatas Sautée”


e terminámos com um


“Parfait Exótico com Salada de Manga e Sorvete de Coco”.


Ainda provei uma outra sobremesa, “Flan Quente de Chocolate “Guanaja” com Coração de Framboesa e Gelado de Lavanda”.


Toda a refeição foi acompanhada com um excelente vinho branco geladíssimo e rematámos com café e uns “petit four” deliciosos, estes, oferta do restaurante.


Num dia desagradável de tempestade a pedir recolhimento, foi uma refeição perfeita, num ambiente requintado, com música ambiente de bom gosto e um serviço sem qualquer mácula, eficiente e simpático.


Se ainda forem a tempo (alguns esgotam num instante) vale a pena deixarem-se tentar por alguns dos restaurantes que participam nesta semana gastronómica. O preço é acessível, acabamos por contribuir para uma causa social e, caramba, nós também merecemos estes pequenos “luxos”, mesmo que não sejamos “fidalgos ou lavradores”.


De 24 de Fevereiro até 6 de Março


restaurantes.aospontos.com