sexta-feira, fevereiro 25, 2011

A qualidade dos deputados

Li há dias num jornal que aquele palhaço brasileiro que foi eleito em Dezembro passado deputado federal por São Paulo, que dá pelo nome (artístico) de Tiririca, se enganou na votação sobre as propostas sobre o salário mínimo e acabou por votar a favor da oposição. Votou e … acabou por marcar um golo na sua própria baliza. Só que Tiririca não desarmou e, ao reconhecer que se tinha enganado, até afirmou com humor “Ih, então eu votei não e saiu sim …”

Pois é, lá como cá, muitas vezes o que se questiona é a qualidade dos deputados. Que se traduz, basicamente, na sua preparação, sensatez, habilidade política e honestidade. E numa altura em que tanto se fala na redução do número de deputados na nossa Assembleia, talvez fosse boa ideia sermos mais exigentes na escolha dos nossos representantes, que podem até ser em menor número mas têm que ser os melhores. O que acham?

quinta-feira, fevereiro 24, 2011

Quando o feitiço se vira contra o ...

A crónica publicada ontem, encaixa-se bem na galeria de “bonecos” que tantas vezes encontramos no nosso quotidiano.

Na história narrada, o protagonista é um taxista (já descobri grandes filósofos nesta classe profissional), mas a personagem bem poderia ser desempenhada por um “barman”, um cabeleireiro ou outra pessoa com profissão diversa.

É que, às vezes, por força das circunstâncias ou das características dos indivíduos que temos pela frente, os serviços que deles esperávamos, traduzem-se, afinal, em saber ouvir-nos, opinar e aconselhar. Nada mais (e não é pouco).

E há ainda aqueles que em vez de nos prestarem determinado serviço, acabam por usar a nossa experiência e saber, deixando-nos não na situação de utilizadores, mas de prestadores de serviços que não esperávamos executar.

Foi o que me aconteceu, há uns anos, numa consulta com o urologista que me acompanhava na época. A determinada altura, o médico considerou que a minha profissão não era susceptível de me provocar um “stress” causador de outras maleitas, ao que eu lhe respondi que não era bem assim, uma vez que a minha função de auditor me provocava um ...

Já nem ouviu o que eu ainda tinha para dizer. “Ah, você é auditor, ora ainda bem que conheço um porque tenho um problema financeiro para resolver e gostaria que me desse um parecer”.

Mais de uma hora depois, quando a consulta terminou, saí deixando-o satisfeito, com a resolução do seu problema encaminhada. E o curioso é que, ao deixar o consultório, paguei qualquer coisa como 85,00 euros por meia dúzia de minutos de confabulações sobre o que me levara lá, enquanto que o “meu parecer financeiro” ao senhor professor foi completamente gratuito.

É aquilo a que eu chamo o “virar-se o feitiço contra o feiticeiro”.

quarta-feira, fevereiro 23, 2011

A filosofia do taxista

Trago-vos hoje um texto de humor (e não só), do escritor brasileiro Luís Fernando Veríssimo. Espero que gostem.


"Entrou no táxi parado no ponto e pediu:
- Rua tal, número tal.
O motorista virou-se para encará-lo e perguntou:
- Tem a certeza?
-Como “tem a certeza”? Tenho sim. Vamos lá.
- O senhor sabe como está o trânsito naquela zona?
- Muito ruim, é?
- Péssimo. E não é só naquela zona. É em toda a cidade. Tudo parado.
- Eu sei, eu sei. Mas eu preciso ir.
- Precisa mesmo?
- Olha aqui, meu amigo, se você não quer me levar...
- Não, pense bem. Precisa mesmo? Certeza absoluta?
- Claro. Tenho uma reunião importantíssima.
- Importantíssima?
- Bom... Importante.
- Importante?
- Está certo. Não é questão de vida ou morte. Pensando bem, nada é uma questão de vida ou morte. A não ser a morte.
- E a vida.
- Como assim?
- A única coisa vital da nossa vida é a nossa vida. O senhor concorda?
- Não sei se eu...
- Tome o seu caso. Correndo para ir a uma reunião importante que não é tão importante assim. Enfrentando trânsito que não anda, se irritando, enfim, se matando. Transformando uma questão que não é vital numa questão de vida e morte. É ou não é?
- É, mas...
- Eu sei. O senhor precisa ganhar dinheiro. Tem que sustentar a família. É casado?
- Estou me separando...
- Então. Precisa de dinheiro. Eu também. Não posso ficar parado. Mas o dinheiro não compra a vida. Pelo contrário, a gente gasta a vida para ter dinheiro. É uma troca em que sempre se sai perdendo. Qual foi o problema?
- Como?
- A separação.
- Ah. Pois é. Foi isso. Eu vivo irritado com essa loucura toda, ela vive irritada, nós acabamos só nos irritando mais um ao outro. Mas foi ela que quis se separar.
- E não tem jeito mesmo?
- Sei lá. Por mim, teria. Mas ela diz que eu não consigo me desligar do meu trabalho e das minhas preocupações. Que eu estou sempre ligado, que viver comigo é como viver com uma caixa 24 horas.
- Faça o seguinte. Quando chegar em casa hoje, gire um botão imaginário, ou torça o seu próprio nariz, e diga que está se desligando. Que nada é mais importante na sua vida do que o amor dela, e do que ficar com ela.
-É, pode dar certo.
- Eu sei que vai dar.
- De onde você tirou tanta sabedoria?
- Dos engarrafamentos. Trancados no trânsito o dia inteiro, temos duas opções. Ou nos transformamos em neuróticos com fantasias assassinas, ou aproveitamos o tempo parado para filosofar. Eu escolhi a filosofia.
- Talvez você possa me ajudar com outro problema...
- Só um instante. Se o senhor não se importar, vou ligar o taxímetro durante a sessão.
- Tudo bem".

terça-feira, fevereiro 22, 2011

Já naqueles tempos os cigarros “queimavam”


Em Portugal, entre Novembro de 1937 e 1970, qualquer cidadão que usasse um isqueiro para acender o tabaco tinha que ter uma licença.

Uma licença de utilização, passada pelas Finanças, todos os anos, nada barata e, para cúmulo, era passada nominalmente. Ou seja, um isqueiro não podia ser utilizado por outra pessoa que não aquela cujo nome estava na licença. E para controlar a sua utilização havia a polícia e uma caricata “profissão” denominada de “fiscal de isqueiros” que, em caso de prevaricação, aplicavam uma multa e apreendiam o isqueiro.

Recordo-me, a propósito, de uma tarde em que o meu pai me levou ao futebol, quando ele pretendia fumar um cigarro, e porque estava vento, acendeu o isqueiro levantando o cotovelo para proteger a chama. Como por acaso, apareceu do nada um fiscal que interpretando o gesto como estar a querer esconder a acção, logo perguntou pela famigerada licença.

Dado que a imagem não é suficientemente nítida, reproduzo o texto da “Licença Anual Para Uso de Acendedores e Isqueiros” em que gostaria de chamar a vossa atenção para uma palavra lá existente: delinquente. Nem mais!

“É proibido o uso ou simples detenção de acendedores ou isqueiros que estejam em condições de funcionar quando os seus portadores não se achem munidos da licença fiscal.
Os infractores serão punidos com a multa de 250$00 além da perda dos acendedores ou isqueiros, que serão apreendidos, salvo as excepções reguladas pelo respectivo decreto-lei.
Se o delinquente for funcionário do Estado, civil ou militar, ou dos corpos administrativos, a multa será elevada ao dobro e o facto comunicado à entidade que sobre ele tiver competência disciplinar.
Das multas pertencerão 70 por cento ao Estado e 30 por cento ao autuante ou participante.
Havendo denunciante, pertencerá a este metade da parte que compete ao autuante.
Outras disposições consultar os respectivos decretos”.

Para quem não sabia ou já não se lembrava, aqui está a memória não muito longínqua de uma prática existente no nosso país. De repressão, sim, mas também de caça a mais um imposto.

segunda-feira, fevereiro 21, 2011

E o vencedor é …

Na noite chuvosa de sexta-feira passada decidi duas coisas: fui ao cinema e, na sequência, atribuí o meu voto a um filme concorrente aos Óscares de Hollywood do próximo dia 27. É certo que não faço parte do júri nem sequer sou especialista em cinema e é também verdade que não vi ainda todos os filmes que estão nomeados, mas a minha resolução está tomada.

O “Discurso do Rei” encheu-me as medidas, como se costuma dizer. Baseado na história verídica do Rei Jorge VI, um monarca tímido que lutava contra a gaguez, o filme tem uma óptima realização e está extraordinariamente interpretado. Colin Firth (o rei) e Geoffrey Rush (o terapeuta) são magistrais e os diálogos estão muito bem construídos.

Não se trata de uma reconstituição de época nem, tão-pouco, pretende mostrar uma visão detalhada sobre os meandros da governação de um reinado que ocorreu num período difícil, no início da II Guerra Mundial, mas assisti a uma história comum (que por acaso se passou com a família real inglesa), comovente e tocante. Uma história de pessoas muito diferentes que se encontraram pelos caprichos do acaso e acabaram ligados por laços de amizade que duraram até à morte.

Não é por acaso que o filme está nomeado para 11 estatuetas, entre as quais o de melhor filme, o de melhor actor principal (Colin Firth) e o de melhor actor secundário (Geoffrey Rush).

Eu gostei. Daí que eu diga “... and the winner is”: “The King’s Speech”, “O Discurso do Rei”.

sexta-feira, fevereiro 18, 2011

Perguntas para reflectir no fim-de-semana

Dado que hoje é sexta-feira e estamos à beira de um fim-de-semana (que se espera com menos chuva), é bom que comecemos, desde já, a relaxar. Desde logo com algumas das perguntas cujas respostas nunca ouvi alguém dar até hoje.

Por exemplo:

Se depois do banho estamos limpos porque é que lavamos a toalha? ou
Se os homens são todos iguais, porque é que as mulheres escolhem tanto ? ou

Porque é que a palavra 'Grande' é menor do que a palavra 'Pequeno'? ou

Porque é que 'Separado' se escreve tudo junto e 'Tudo junto' se escreve separado? ou

Se o vinho é líquido, como pode existir vinho seco? ou ainda

Quando inventaram o relógio como sabiam que horas eram para poder acertá- lo?

Vão pensando nisso. Bom fim-de-semana.

quinta-feira, fevereiro 17, 2011

Apesar de tudo na província é capaz de ser mais fácil

A onda de choque resultante da notícia da morte da idosa da Rinchoa, a que nos referimos na passada Segunda-Feira, para além da comoção que provocou, gerou um alerta sobre a situação dos que vivem sozinhos e nomeadamente dos mais velhos. Familiares, vizinhos, comerciantes e até autoridades ficaram mais sensibilizados para o acompanhamento dessas pessoas.

Temo, porém, que com o passar do tempo, estes cuidados possam diminuir e tudo volte à estaca zero.

Há que reconhecer, no entanto, que muitas autarquias da província já têm dispositivos de apoio a idosos isolados, com programas específicos criados para o efeito. Só que, como costumo dizer, há província e província. O número de pessoas e a dispersão geográfica duma concelho como Guimarães não é o mesmo de um concelho como Alcoutim. Nos meios maiores é muito mais difícil conseguir o acompanhamento das pessoas que vivem sozinhas.

Na tentativa de ultrapassar essas dificuldades, o Instituto da Segurança Social vai apresentar uma proposta ao Governo que, basicamente, pretende acompanhar as pessoas à distância, por exemplo, através de uma chamada telefónica diária. O problema é que nem todos estarão interessados em aderir, tanto mais que, embora de pouca monta, haverá custos para os utilizadores.

Em Portugal estão sinalizados cerca de 25 mil idosos em risco. Mas quererão todos eles ter alguém que lhes controle os movimentos, ainda que seja para o seu bem? Não podemos esquecer que há pessoas pouco sociáveis, com feitios difíceis e extremamente independentes que querem manter a sua “liberdade”a todo o custo. E embora possamos não compreender as suas motivações, temos que as respeitar.

quarta-feira, fevereiro 16, 2011

A aula de hidroginástica

A crónica de hoje poderia ser dedicada a gente de todas as idades dado que, julgo, todos se reveriam, de uma maneira ou de outra, no que vou contar.

A cena passa-se num dos melhores ginásios da capital e no início de uma aula de hidroginástica.

Desde já gostaria de dizer que esta era a minha primeira aula e que só acedi “alinhar” nesta actividade depois de grandes esforços de familiares para me convencer. Embora a “Hidro” seja aconselhada pelos médicos por ser um bom exercício que visa melhorar a qualidade de vida, confesso, eu que sempre pratiquei desporto de competição, que sempre olhei para aquelas classes como reuniões de pessoas idosas que se juntam para se divertir e para conviver.

É claro que esta actividade é também isso, ou seja, também serve para aumentar a interacção social, para diminuir o isolamento, para melhorar os níveis de independência e autonomia, para ocupar os tempos livres de forma saudável, enfim, para promover o bem-estar geral.

Mas é mais do que isso, é um exercício físico exigente, que faz mexer todas as partes do corpo e que apenas por estarmos dentro de água não nos deixa suar da forma habitual. Ah, e quanto àquela ideia da reunião de pessoas desocupadas e com idade avançada esqueçam, não é nada disso. Comparecem às aulas pessoas de todas as idades que têm um fim comum – fazer exercício.

Mas voltemos à minha primeira aula de “Hidro”. Normalmente, as sessões são acompanhadas de música mexida, cujo ritmo ajuda a execução dos exercícios ministrados pelo professor.

Ora, desta vez, logo no início da aula o aparelho de som avariou. A jovem monitora, impotente para resolver o falhanço da máquina, tratou de “puxar” pelos alunos, começando a entoar canções mais ou menos conhecidas e, claro está, mais ou menos actuais. Como a classe não respondeu a contento, provavelmente por desconhecimento das letras, a jovem recorreu às suas memórias de infância e foi buscar músicas populares e de artistas também populares – do género “atirei o pau ao gato” ou “eu tenho dois amores” - para angariar novas energias e para que a aula decorresse normalmente dentro da anormalidade, o que conseguiu.

Foi então que dei conta que a maioria das minhas companheiras (os participantes são maioritariamente senhoras) entoava com entusiasmo as canções propostas (ou eram elas próprias a sugeri-las) a ponto de se transformar uma aula de “Hidro” num grupo coral a roçar o folclórico.

E, quando olhei ao redor e vi uma boa parte do grupo a entoar de forma entusiástica as canções populares, esquecendo o que os levara ali, percebi que tinha apanhado o comboio errado. Aquilo não era uma aula de hidroginástica mas um autocarro de excursão de seniores animados.

terça-feira, fevereiro 15, 2011

A decisão é sua …

Não fossem as idiossincrasias (bem, como eu gosto de dizer esta palavra) dos portugueses e até era capaz de acreditar que esta história tinha tudo para dar certo. Mas a nossa cultura e as nossas características bem conhecidas, fazem-me pensar que esta iniciativa não durará muito.
Mas, afinal, do que é que estamos a falar?

Pois bem, um restaurante lisboeta recentemente inaugurado, apresenta como novidade a possibilidade dos clientes pagarem as suas refeições de acordo com o seu grau de satisfação. Ou seja, os fregueses podem pagar o preço que acharem mais justo pelo que comeram. O critério é deles. Vou exemplificar: os preços das sopas variam entre os dois euros e cinquenta e os cinco euros, as carnes entre os seis e os doze euros e as sobremesas vão dos dois aos seis euros. É ainda o cliente que decide se deve deixar, ou não, entre dois a quatro euros de gratificação pelo serviço de atendimento.

Os responsáveis da “Cantina da Estrela”, assim se chama o novo espaço, confiam que este novo conceito pode resultar. Aliás, dizem os psicólogos que as pessoas são mais razoáveis quando lhes é dada a responsabilidade de avaliar. Noutros países a coisa funcionou. Noutros … nem tanto.

As características dos portugueses, e se calhar dos povos latinos, não são iguais às dos da Europa Central ou dos Nórdicos. Ao contrário destes, provavelmente não nos comportaríamos lá muito bem se tivéssemos que deixar umas moedinhas em troca de um exemplar de um jornal colocado numa caixa aberta. O mais certo, digo eu, é que desaparecessem os jornais e … o dinheiro. E no tempo em que os bolos-reis traziam uma fava, quantos é que a engoliam para que não fossem “obrigados” a pagar o próximo?

Pode ser que resulte, vamos ver. Mas tenho dúvidas que a maioria das pessoas, perante a escolha de poder pagar entre seis e doze euros, seja de tal forma séria que pague os doze euros. Ou dez … ou oito …


segunda-feira, fevereiro 14, 2011

Uma idosa chamada Augusta

A notícia da descoberta do cadáver de uma senhora que morreu há nove anos na sua casa, comoveu toda a gente. Comoveu, chocou e levantou toda uma série de questões.

E a primeira é a de percebermos que tipo de sociedade é esta em que vivemos, sobretudo nas grandes urbes, em que a desumanização é total. Ninguém sabe e ninguém quer saber quem são e como vivem as pessoas que moram no andar do lado, no de cima ou no debaixo porque todos estão demasiado preocupados apenas com a sua vidinha. Como ouvi alguém dizer “esta é uma sociedade porco-espinho, em que vivemos enrolados sobre nós próprios”.

Mas neste caso (que tomámos conhecimento pela comunicação social), houve pessoas que se preocuparam com a ausência da senhora. Uma vizinha tentou várias vezes junto da GNR que investigassem o caso mas riram-se-lhe na cara como se estivesse louca. Não havia cheiro a cadáver, portanto … Um primo da senhora deslocou-se treze vezes ao Tribunal de Sintra para que alguém entrasse na habitação na tentativa de saber se a prima estaria lá. Em vão, responderam com um argumento idêntico e … nada fizeram.

E o que me revolta é que quer a GNR quer o Tribunal, aparentemente por não haver indícios de morte ou por não haver leis explícitas para este tipo de casos, descurou a possibilidade de acudir a tempo uma pessoa e, quem sabe, salvá-la. Tão-pouco a Segurança Social investigou porque razão os vales da sua reforma foram devolvidos. Todos esses serviços públicos que, supostamente, deviam estar atentos, se alhearam pura e simplesmente.

Mal vai um país em que tenha que existir legislação que contemple todas as situações. As leis devem ser entendidas como referenciais e, como tal, não é por se registar a falta de alguma que se deve deixar de actuar. Falharam, pois, as entidades que deveriam fazer diligências para descobrir o que tinha acontecido à senhora. Só não falhou o Fisco que, face a uma dívida existente, cuidou diligentemente de penhorar a casa e vendê-la. Só foi pena de não ter tido a curiosidade de saber o porquê do não pagamento.

A senhora chamava-se Augusta, teria hoje 96 anos, morreu em sua casa há 9 anos e morava na Rinchoa.

sexta-feira, fevereiro 11, 2011

E a história repete-se


Hoje vou partilhar convosco uma história que me contaram - um diálogo - que se teria passado em França, no tempo de Luís XIV, entre o Cardeal Mazarino e Colbert. Não tenho a certeza da sua veracidade mas, face ao que se tem observado ao longo dos tempos, não me custa acreditar que tivesse acontecido.

No século dezassete, o Cardeal Mazarino, embora nascido em Itália, foi primeiro-ministro de França no tempo do Rei Luís XIV e Colbert seu ministro do Estado e da Economia.

Então, o alegado diálogo terá sido mais ou menos assim:

Colbert: Para encontrar dinheiro, há um momento em que enganar [o contribuinte] já não é possível. Eu gostaria, Senhor Superintendente, que me explicasse como é que é possível continuar a gastar quando já se está endividado até ao pescoço...

Mazarino: Se se é um simples mortal, claro está, quando se está coberto de dívidas, vai-se parar à prisão. Mas o Estado... o Estado, esse, é diferente!!! Não se pode mandar o Estado para a prisão. Então, ele continua a endividar-se... Todos os Estados o fazem!

Colbert: Ah sim? O Senhor acha isso mesmo ? Contudo, precisamos de dinheiro. E como é que havemos de o obter se já criámos todos os impostos imagináveis?

Mazarino: Criam-se outros.
Colbert: Mas já não podemos lançar mais impostos sobre os pobres.

Mazarino: Sim, é impossível.

Colbert: E então os ricos?

Mazarino: Os ricos também não. Eles não gastariam mais. Um rico que gasta faz viver centenas de pobres.

Colbert: Então como havemos de fazer?

Mazarino: Colbert! Tu pensas como um queijo, como um penico de um doente! Há uma quantidade enorme de gente entre os ricos e os pobres: os que trabalham sonhando em vir a enriquecer e temendo ficarem pobres. É a esses que devemos lançar mais impostos, cada vez mais, sempre mais! Esses, quanto mais lhes tirarmos mais eles trabalharão para compensarem o que lhes tirámos. É um reservatório inesgotável.


Não acham que entre este “diálogo provável” e o que temos assistido na governação de há muitos anos a esta parte existem muitas “coincidências”? E são tão óbvias que não teríamos dificuldade em substituir os nomes de Mazarino e de Colbert por outros políticos bem mais recentes. Curioso, não é?

quinta-feira, fevereiro 10, 2011

Tudo como dantes …


Ao longo dos anos a vida foi-me mostrando que os mais novos têm sempre a sensação de que a maioria dos males que os afligem, e à sua geração, apareceram de repente, vindos sei lá de onde, única e exclusivamente para os prejudicar. Como se não tivessem já acontecido anteriormente. Mas não é assim.

Parece, portanto, que aquilo a que passámos a chamar de mercados e agências de notação, são os tais agentes do demónio que opinam, tratam de números e estudam dossiers de países que não conhecem e estabelecem critérios que são aplicados cegamente. Tudo com um único propósito, o de lesar esses países e os seus habitantes.

Mas, como referi, o fenómeno não é de agora. Lembro-me, por exemplo, de que há uns anos uma das maiores firmas de consultoria do mundo foi contratada pelo grupo financeiro onde eu trabalhava para, segundo eles, reestruturar (palavra adocicada que esconde as verdadeiras intenções) as nossas empresas. Dito de outro modo, a sua missão era emagrecer essas empresas, ou seja, eles estavam lá para mandar embora pessoas. E, como se isso não fosse suficientemente trágico, utilizavam um método assaz eficaz e perverso. Instigavam os empregados a sugerir melhorias nos seus serviços para que fossem mais eficientes. Pretendiam, portanto, mais e melhor produção com menores recursos. Tão simples como isso, com a ajuda das sugestões dos próprios empregados das empresas, os serviços tenderiam a melhorar e o número de postos de trabalho a diminuir. E o curioso (tristemente curioso) é que muitos embarcaram no engodo e os objectivos foram alcançados. As mirabolantes ideias que apareceram fizeram com que, na prática, colegas de trabalho despedissem os seus companheiros.
Aliás, em muitos casos, eram as próprias chefias intermédias, desejosas de “ficar bem na fotografia”, que sugeriam alterações espantosas em que antes nunca tinham pensado e de que resultaram o afastamento de mais uns quantos empregados.

Isto aconteceu há uns bons anos, numa altura em que ninguém falava em globalização, em mercados e ainda menos em agências de rating. Podem, por isso, imaginar como o processo foi doloroso para os trabalhadores e muitos não aguentaram tamanha instabilidade. Vi homens maduros e dedicados às empresas onde laboravam há décadas chorarem como crianças quando souberam da extinção dos seus postos de trabalho e a consequente passagem à reforma. Afinal, era a primeira vaga de um mundo novo que ninguém estava preparado para receber.

Seguindo a máxima de Lavoisier “nada se cria, nada se perde, tudo se transforma”, temos que admitir que muitos dos problemas com que nos confrontamos hoje podem ter novas roupagens e novas designações, mas o cerne das questões é exactamente o mesmo daqueles outros problemas que aconteceram no passado. E, curiosamente, os que mais são atingidos também são os mesmos.

quarta-feira, fevereiro 09, 2011

Ao meu falecido irmão Manuel Maria Barbosa du Bocage

José Carlos Pereira Ary dos Santos (1936 – 1984) foi um extraordinário poeta e declamador português.
Todos os grandes cantores o interpretaram. A obra de Ary dos Santos permanece na memória de todos e, estranhamente (ou talvez não), muitos dos seus poemas continuam actualizados.
De Ary dos Santos, o poema “Ao meu falecido irmão Manuel Maria Barbosa du Bocage”


Meu sacana de versos! Meu vadio.
Fazes falta ao Rossio. Falta ao Nicola.
Lisboa é uma sarjeta. É um vazio.
E é raro o poeta que entre nós faz escola.

Mastigam ruminando o desafio.
São uns merdosos que nos pedem esmola.
Aos vinte anos cheiram a bafio
têm joanetes culturais na tola.

Que diria Camões nosso padrinho
ou o Primo Fernando que acarinho
como Pessoa viva à cabeceira?

O que me vale é que não estou sozinho
ainda se encontram alguns pés de linho
crescendo não sei como na estrumeira!

segunda-feira, fevereiro 07, 2011

“Parva Que Sou”


Já ninguém tem dúvidas sobre o poder das redes sociais. A sua força é de tal modo avassaladora que a divulgação de determinada causa ou acção pode ter resultados inesperados. O caso dos “Deolinda” é exemplar. O efeito mediático conseguido com a canção “Parva Que Sou” fez com que um simples trabalho musical se tornasse num hino de várias gerações de jovens, que nele vêem espelhadas as frustrações perante uma vida a que faltam horizontes e esperança.

Feliz ou infelizmente já passei por várias gerações onde a contestação dos jovens se fazia sentir também através das chamadas canções de protesto. Ouvi e cantei Bob Dylan como o fiz também com José Afonso e Sérgio Godinho. E já era a hora de aparecerem novos trovadores que corporizem todas as ansiedades e angústias dos jovens de agora que vivem de mãos dadas com o desemprego, com a precariedade e com a insegurança de uma vida que não conseguem estruturar.

Daí frases da canção como “Sou da geração sem remuneração”, “Porque isto está mal e vai continuar/já é uma sorte eu poder estagiar” ou “Para ser escravo é preciso estudar”.

Pese embora a letra me pareça um pouco frágil e dando o necessário desconto a alguma demagogia que este tipo de versos sempre acarreta, proponho-me, eu que já sou um “jovem menos jovem” voltar a juntar a minha voz aos “Deolinda” para cantar a nova canção-hino da juventude. Uma “canção de protesto” ou uma “canção da crise” que, da net das redes sociais e dos blogues, se está a transformar rapidamente num movimento de massas.

sexta-feira, fevereiro 04, 2011

Não é defeito … é feitio

Não resisto a transcrever o texto de uma mensagem que recebi. No fundo, trata-se de um conjunto de expressões comuns mas que, contextualizados no mundo globalizado em que vivemos, veio “dar razão” a uma série de frases que costumamos dizer no dia-a-dia. Vejam-se alguns exemplos:

“. Se tem um problema intrincado... vê-se grego;
. Se não compreende alguma coisa..."aquilo" é chinês;
. Se trabalha de manhã à noite...trabalha como um mouro;
. Se vê uma invenção moderna...é uma americanice;
. Se alguém fala muito depressa... fala como um espanhol;
. Se alguém vive com luxo...vive à grande e à francesa;
. Se alguém quer causar boa impressão... é só para inglês ver;
. Se alguém tenta regatear um preço...é pior que um cigano;
. Se alguém é agarrado ao dinheiro … é pior que um judeu;
. Se vê alguém a divertir-se...está a gozar que nem um preto;
. Se vê alguém vestindo um fato claro...parece um brasileiro;
. Se vê uma loura alta e engraçada...parece uma autêntica sueca;
. Se quer um café curtinho... pede uma italiana;
. Se vê horários serem cumpridos...trata-se de pontualidade britânica;
. Se vê um militar bem fardado...parece um soldado alemão;
. Se uma máquina funciona bem...é como um relógio suíço;
Porém, quando qualquer coisa corre mal... isso é mesmo à PORTUGUESA!”

A brincar, a brincar, esta é a forma como vemos as coisas. Mas não se preocupem, “Não é defeito … é feitio”

quinta-feira, fevereiro 03, 2011

Do que é que vamos falar então?


Muitos dos silêncios que hoje “se escutam” nas famílias, entre colegas de trabalho e até entre amigos são também uma consequência do mundo globalizado em que vivemos, onde a informação é imensa e extremamente rápida.

Quando não havia internet e tantos canais de televisão que hoje nos permitem mergulhar em mundos inimagináveis até há uns anos, a nossa conversa centrava-se basicamente nos programas (da televisão única) a que tínhamos assistido na véspera e que formatavam as cabeças e as vidinhas de todos. Isto, claro está, para além de algumas tertúlias intelectuais mais ou menos toleradas pelo regime. As discussões travavam-se à volta do último festival da canção, dos chamados programas recreativos e dos concursos que eram, afinal, o foco principal da nossa atenção, para além de se falar dos problemas das famílias e, em particular, dos filhos. Ah, e havia também as touradas, os programas de fados e guitarradas e, naturalmente, o futebol.

O nosso mundo era muito pequeno e as nossas “preocupações” localizadas.

Hoje nota-se alguma dificuldade em conversar porque os interesses dos presentes são muito diversificados. Não quer dizer que não falem, mas, a meu ver, tornou-se mais difícil manter uma boa cavaqueira durante uma tarde ou uma noite.

Por muito interessantes que sejam as personalidades presentes, é arriscado falar-se, por exemplo, sobre literatura ou cinema porque a cultura de alguns, nessas matérias, pode não ser a melhor. E de política? Arriscadíssimo, acho eu. É muito provável que não se passe da repetição do que ouviram nos telejornais ou dos chavões mais utilizados pelos políticos mais conhecidos. Análise crítica ou ideológica seria pedir demasiado.

A verdade é que há hoje um universo de informação extremamente acessível e rápido. E se isso é bom, não podemos, por outro lado, deixar de nos questionar se essa mais-valia pode vir a tornar-se excessiva. É que se corre o risco de que a mensagem que se pretende transmitir não chegue por inteiro aos seus destinatários.

Como conciliar interesses, como dialogar? Do que é que vamos falar então?


quarta-feira, fevereiro 02, 2011

Trocos … são trocos, senhores

Bem sei que a situação foi já resolvida pela nova Administração da empresa mas, mesmo assim, não quero deixar de dar destaque a uma aldrabice, mais uma das que se vão descobrindo por aí sem que os responsáveis sofram qualquer castigo. Ainda por cima num tempo de crise económica em que continuam a verificar-se fraudes, corrupção e tráfico de influências.

Por isso me custa a entender como é que no Taguspark nove dos seus quadros conseguiram ter no último ano aumentos escandalosos e o salário de um assessor de um administrador não-executivo tenha crescido 98%. Leram bem, este senhor – um assessor – quase duplicou o seu vencimento. Que explicação há para isto? Que país é este?

Não fosse a auditoria mandada executar pela nova Administração e lá tinha passado despercebida mais uma escandaleira. Coisa pouca, concedamos. Afinal, o que é isso quando comparado com o facto do Presidente da nossa TAP ganhar o dobro do salário do Presidente dos Estados Unidos? A bem dizer, nada.

terça-feira, fevereiro 01, 2011

“Nas aulas a congelar nem conseguimos pensar”


Fiquei perplexo ao ouvir a indignação exacerbada de uns quantos alunos de uma escola de Vila Real que, perante as câmaras de televisão sedentas de notícias incendiárias, se queixavam do frio intenso que sentiam nas salas de aula. E o protesto veemente levou-os em marcha até ao Governo Civil onde levantaram bem alto cartazes onde se podia ler, por exemplo, “nas aulas a congelar nem conseguimos pensar”.

Muito embora lhes assista todo o direito de reivindicar melhores condições para eles e para a sua escola, acho que, neste caso, o direito à indignação (sentimento que eu tanto prezo) desta vez foi mal utilizado. E porquê? Porque o que aconteceu é que a caldeira de aquecimento avariou de vez e tiveram que encomendar uma outra que virá de Itália, coisa que acontecerá, segundo a Direcção da Escola, dentro de uma semana. Enquanto isso, os aquecedores a óleo postos nas salas de aula tentarão minimizar o frio mas, pelos vistos, não calarão os estudantes.

Por muito frio que faça – e faz certamente - quero acreditar que umas luvas, uns gorros e umas roupas mais quentinhas, peças que as gentes daquela região está habituada há muito, poderão suster por mais alguns dias o griso deste inverno rigoroso. E também quero acreditar que esse desconforto não vai impedir os estudantes de continuar a pensar. Pensem nisso.