quarta-feira, outubro 31, 2012

Tudo na mesma ...



Fiquei perplexo ao saber que o Governo vai manter os transportes gratuitos para juízes e procuradores. Mas não só para estes. As borlas vão também continuar para os militares, polícias, funcionários das transportadoras e membros dos gabinetes do Governo.

Mas o que é isto? Então, há bem pouco tempo este mesmo Governo pôs termo ao desconto de 50% nos passes sociais dos transportes públicos para jovens e idosos e vai manter - não o desconto de 50% mas a gratuitidade absoluta - tamanho privilégio para estes senhores que não serão, por certo, dos mais carenciados?

E ainda fiquei mais furioso ao conhecer o texto do e-mail enviado pelo Sindicato dos Magistrados aos seus associados quando referia, a determinado passo: "... será conveniente que não se discuta na comunicação social este episódio ...". Claro, obviamente que não é conveniente que a opinião pública saiba de mais este desmando que pode causar alguma agitação.

Uma vez mais me insurjo contra este tipo de regalias que podem até ter feito sentido em tempos idos mas que, hoje, são completamente inaceitáveis.

 

terça-feira, outubro 30, 2012

Mais vale dar uma queda ...



A questão não é recente, mas continua a originar polémica. E por isso mesmo, eu continuo a não perceber como é que num Estado de direito, num país ocidental, civilizado e democrático, um cidadão ferido pode pagar, por tratamento idêntico, montantes completamente diferentes. Basta estar ferido em resultado de uma agressão ou de uma queda. Vejamos um caso real:

Uma senhora idosa, vítima de assalto, recorreu ao hospital e teria que pagar pelo tratamento 108 euros, além da taxa moderadora. Se a mesma senhora, em vez de ter sido maltratada pelo assaltante tivesse caído na rua e apresentasse mais ou menos os mesmos ferimentos, teria que pagar apenas uma taxa de 17,5 euros.

Acham isto normal? Então o tratamento não é idêntico, não ocupa o mesmo tempo aos técnicos de saúde e utiliza os mesmíssimos medicamentos? Porque carga de água existem pagamentos tão diferentes?

A coisa parece resumir-se a um detalhe. É que em casos de agressão ou violência o Serviço Nacional de Saúde entende que o tratamento deverá ser pago pelo agressor. E a resolução deste enredo, parece ser tão simples ... caso houvesse vontade política. Há muito que deveria ter sido legislado que os meliantes que se dedicam a magoar as pessoas deveriam deixar um cartão com a sua identificação para, mais tarde, virem a suportar as despesas médicas. Fácil e exequível. Ou, utilizando o plano B, a vítima depois de ter sido agredida pelo assaltante, atirar-se-ia do cima de uma escada e o problema ficaria logo resolvido porque o diagnóstico médico só poderia ser um: queda.

Agora a sério, parece-me incrível que esta situação se mantenha. É injusta e dá azo a que se recorra sistematicamente à mentira. Segundo as estatísticas, as quedas são cada mais frequentes e as agressões têm uma expressão infinitamente menor. Certamente por acaso ...


 

segunda-feira, outubro 29, 2012

O Maratonista

 
Nas jornadas parlamentares conjuntas PSD/CDS-PP, realizadas nos últimos dias, Vítor Gaspar voltou a mostrar os seus dotes de "grande comunicador". Desta vez, usou uma metáfora para dizer que o processo de ajustamento por que estamos a passar é como uma corrida de maratona. O ministro de Estado e das Finanças considerou que "Portugal está a dois terços da maratona, ou seja, por volta do 27º quilómetro, aproximando-se da parte da corrida em que, para não se desistir, é preciso ter treino, é preciso ter disciplina, é preciso ter persistência, é preciso ter força de vontade, é preciso ter vontade de vencer".

Não se sabe bem se estamos, ou não, no tal quilómetro 27, mas sei que Gaspar se esqueceu de mencionar que numa maratona também é necessário ter resistência para aguentar.

 
Com o entusiasmo que se lhe conhece (e que nos entusiasma também, e de que maneira) afirmou "Como sabem, os corredores de maratona, em geral, não desistem ao 27º quilómetro, desistem entre o 30º e o 35º quilómetro. Uma maratona torna-se cada vez mais difícil e os atletas têm os seus maiores desafios na fase final da maratona. É isso exactamente que acontece com um programa de ajustamento".

Mais uma vez Vítor Gaspar se esqueceu de mencionar que nem sempre é assim. O nosso atleta Francisco Lázaro, em 1912 nos Jogos Olímpicos de Estocolmo, sucumbiu precisamente ao quilómetro 29. Não desistiu no 27º nem entre o 30º e o 35º quilómetros. Foi no 29º quilómetro: não resistiu e faleceu.


E Portugal? Irá conseguir aguentar até ao fim da maratona do ajustamento ou cederá até lá? É que exauridos como estamos, está cada vez mais difícil - ainda que com treino, disciplina, persistência, força de vontade e vontade de vencer - aguentarmos tamanho esforço.

sexta-feira, outubro 26, 2012

Até quando poderemos viver com um mínimo de dignidade?


 
Ainda na última segunda-feira eu dizia aqui: "perturba-me não saber até quando poderemos viver com um mínimo de dignidade".

Pois bem, numa sessão realizada na Assembleia da República, a Deputada do PCP, Rita Rato, interpelava o ministro da Solidariedade e da Segurança Social, Pedro Mota Soares, nestes termos:

"... o aumento das pensões mínimas, fazendo o arredondamento por cima, e pensando num aumento dos 8 euros (que não chegou, de facto, aos 8 euros), nós estamos a falar de 0,26 cêntimos por dia numa pensão na ordem dos 256 euros ..."

E é esta inquietação que me assalta. Para quem ganha pouco mais de 250 euros por mês, que significado tem um aumento de 8 euros, os tais 0,26 cts diários?

Será que já nem esse "mínimo de dignidade" devida às pessoas é respeitado? Não, não respondam, eu sei a resposta ...
 
 
 

quarta-feira, outubro 24, 2012

Ainda não sei se ele estava a falar a sério ...


Há uma semana, em directo na RTP1, no programa "De Caras", o jornalista Vítor Gonçalves entrevistava Fernando Ulrich, CEO do BPI.

Quando abordavam o problema do desemprego a conversa foi mais ou menos esta:

VG: "... mas estava à espera que o Estado negociasse consigo para aumentar o número de empregados do Banco? Se tivesse apoios do Estado poderia criar empregos no BPI? ..."

FU: " ... se pudesse haver 300 ou 500 pessoas que estivessem no BPI durante um ano ou dois, garanto que era melhor para elas porque aprendiam, valorizavam-se e era bom para a sua carreira ..."

VG: " ... e o que é que precisava que o Estado fizesse, que lhes pagasse uma parte do salário? ..."

FH: " ... ou até a totalidade. Era melhor do que pagar subsídios de desemprego. E isto é aplicável às grandes empresas, não às PME porque lá meter 2 empregados, mesmo pagos, perturbaria as empresas. Agora se eu tiver mais 500 pessoas no Banco não perturba o Banco .... "

 

Eu acho que é a isto a que se chama empreendedorismo. Meter nos quadros do Banco 500 funcionários, pagos pelo Estado e a trabalhar e a gerar riqueza para o Banco é uma ideia genial. Acompanhada, porventura, por uma outra medida: a de despedir umas centenas de bancários que já lá estavam e que deixariam de ser necessários.

Pois a mim não perturbaria mesmo nada - mesmo não sendo uma grande empresa nem sequer uma PME - que o Estado pagasse a uma desempregada para ir trabalhar lá em minha casa. Pegando nos argumentos do banqueiro, era melhor para o Estado pagar o ordenado da empregada doméstica do que pagar subsídio de desemprego e para a empregada também seria bom porque se valorizaria e faria curriculum.

Mesmo vendo com toda a atenção a entrevista, não consegui perceber se Ulrich estava realmente a falar a sério. Mas eu acho que estava ...

 

terça-feira, outubro 23, 2012

Mário, acabou a noz-moscada ...



O desemprego e o aumento de impostos disparam. Dizem que por causa da crise, a mesma que está a provocar uma austeridade cruel que acentua, e de que maneira, a desigualdade social. Os pobres mal conseguem sobreviver, a classe média definha e os ricos e muito ricos estão a uma distância cada vez maior da base da pirâmide social. Mas de tão alto que estão no seu vértice, nem os consigo ver com nitidez. Ralo-me muito mas não posso fazer grande coisa.

Quanto aos reformados, indefesos e envelhecidos, pensamos como ao longo de uma vida contributiva foram entregando ao Estado, supostamente protector e "pessoa de bem", os seus descontos que se destinavam a garantir, mais tarde, a merecida reforma. Mas o que estamos a assistir não corresponde às expectativas criadas ao longo dos anos. Por conveniência do Estado, as regras foram-se alterando e o contrato estabelecido no início do "casamento" entre os trabalhadores e o Estado não foi cumprido. Indigno-me muitíssimo mas não posso fazer grande coisa.

Depois de duras e prolongadíssimas reuniões, o Governo lá conseguiu apresentar a proposta do Orçamento de Estado para 2013 (para muitos um colossal embuste e completamente inexequível), com muitos avanços e recuos provocados, em parte, pela pressão da opinião pública. Finalmente aprovada pelo Conselho de Ministros a proposta do OE, ainda se vão conhecendo erros na inscrição de verbas de despesa atribuídas aos Ministérios da Defesa e da Economia. Preocupo-me com o que aí vem, fico "piurso" com a incompetência dos governantes mas não posso fazer grande coisa.

Agora, quando ouço reclamar que a noz-moscada acabou, justamente quando se está a preparar um souflé de peixe em que este ingrediente é absolutamente indispensável ... porque "pertence", embora não possa deixar de ficar ralado, indignado e preocupado (com o meu esquecimento) sempre posso fazer qualquer coisa. Dizer "sim querida, vou já comprar" e sair rapidamente em direcção a um supermercado.

 

segunda-feira, outubro 22, 2012

Eu já vi este filme ...


Há muitos anos, fui funcionário público. Nesses tempos em que ser empregado do Estado era sinónimo de estabilidade, arranjavam-se empregos com alguma facilidade (não esquecer que muitos portugueses combatiam em África) mas os ordenados eram baixos e não havia as mordomias que foram conquistadas com a revolução de Abril de 1974. Por exemplo, as horas extraordinárias e o trabalho aos domingos e feriados não tinham qualquer percentagem adicional ao custo de cada hora normal. Recordo-me que antes do 25 de Abril ganhava 0,04 euros por hora e o mesmo preço se aplicava quando fazia umas horas extraordinárias ou trabalhava aos domingos ou aos feriados. Sim, porque aos sábados trabalhava-se sempre, as oito horas da praxe. Só bastante mais tarde alcançámos a semana-inglesa e, depois de Abril de 1974, a semana de cinco dias.

Recordo isto numa altura em que se tem vindo a assistir a uma quebra acelerada de tudo quanto foi conquistado. Depois de se terem alcançado patamares de remuneração e de condições laborais muito aceitáveis, voltámos a assistir ao trabalho escravo, sem vínculos, sem segurança, sem carreira, quase a troco de um prato de comida. Isto quando se consegue um emprego, o que, nos dias de hoje, já é uma bênção.
É que perturba-me não saber até quando poderemos viver com um mínimo de dignidade.

 

sexta-feira, outubro 19, 2012

Somos mesmo bons ...


Apesar dos resultados decepcionantes da nossa selecção de futebol nos dois últimos jogos, que não foi além de uma derrota com o nosso principal adversário e de um empate com a modesta Irlanda do Norte (as "desculpas" para o fracasso foram o relvado sintético no primeiro caso e a chuva no segundo), apesar disso, fiquei contente em saber que o nosso país, pequenino como é, conseguiu guindar-se ao lugar de maior vencedor do troféu que é atribuído aos melhores marcadores dos campeonatos europeus. Temos nada menos que seis Botas de Ouro. A saber, Eusébio, Fernando Gomes e Cristiano Ronaldo venceram o troféu duas vezes cada um. A Holanda é o segundo país com mais Botas de Ouro, umas modestas quatro.

Fiquei muito orgulhoso da façanha e fiquei na expectativa de ouvir os nossos jovens (e não só) responder pronta e sabiamente quando uma das nossas televisões se lembrar de fazer um inquérito de rua sobre os notáveis portugueses que alcançaram os maiores prémios do mundo.

Quanto ao futebol não tenho qualquer dúvida que o farão. Já terei algumas se aos inquiridos for perguntado quais os portugueses que ganharam o Prémio Nobel. "Salazar??" "Durão Barroso??", responderão interrogativamente alguns ...

Pois o nosso orgulho seria total se todos soubéssemos que, para além dos magos da bola, Egas Moniz, em 1949, foi galardoado com o Nobel da Fisiologia ou Medicina, José Saramago, em 1998, com o Nobel da Literatura e Siza Vieira e Souto Moura, respectivamente em 1992 e 2011, com o Prémio Prizzker (O Nobel da Arquitectura).

E refiro só os vencedores do Nobel (porque são menos) mas poderia ir muito mais além se pretendesse saber outros vencedores das mais diversas áreas (o que iria complicar a questão).

Aí sim, diríamos, de peito cheio, "Somos mesmo bons"!

 

quinta-feira, outubro 18, 2012

Parece-me que eles estão a "esticar a corda" em demasia ...



Ainda não há muito tempo escrevemos aqui sobre os luxos gastronómicos dos restaurantes da Assembleia da República, que são suportados pelo orçamento da própria AR. E ficámos atónitos, agora, com duas notícias recentes que davam conta de mais uns luxos também contemplados pelo orçamento (elástico) da Assembleia.

Então não é que o Orçamento da Assembleia da República para 2013 vai manter as verbas destinadas à Associação de ex-Deputados e Grupo Desportivo para a organização de eventos desportivos, nomeadamente torneios de golfe (em 2012 estas duas entidades receberam 57 mil euros)?

E o que dizer da renovação da frota automóvel do grupo parlamentar do PS que também foi custeado pelo Orçamento da Assembleia (210 mil euros)?

Bem pode dizer o Conselho de Administração da Assembleia da República que teve a preocupação de reduzir verbas em dotações. Bem pode o Partido Socialista afirmar que teve o cuidado de substituir carros de topo de gama por outros mais económicos ... mas também de topo de gama, como se apenas existissem no mercado os Audi, os BMW, os Wolkswagen e os Mercedes ... de gama alta.

Sabemos todos que a democracia tem custos. Porém, o que está em causa é o significado, o exemplo, que transmitem à população. Quando se pede um esforço gigantesco aos cidadãos, a roçar o desumano, é de uma completa insensibilidade e falta de bom-senso a ostentação que os nossos representantes continuam a demonstrar ... à conta dos contribuintes.
 
 
 

quarta-feira, outubro 17, 2012

Agradecidos ...



A apresentação do Orçamento de Estado para 2013 veio confirmar aquilo que já esperávamos: no próximo ano, os portugueses vão viver um verdadeiro inferno. Vamos ser sujeitos à mais alta subida de impostos de sempre e, por consequência, haverá mais falências e desemprego, piores condições de vida e os movimentos de indignação e manifestações terão um aumento exponencial e serão (porventura) mais violentos.

O Ministro das Finanças diz que “não há margem no OE e este é o Orçamento necessário". Já não sei se será bem assim, ainda há pouco ouvi notícias que alguma coisa ainda pode mudar. Entretanto, a antiga Ministra das Finanças, Manuela Ferreira Leite, disse acreditar que a proposta governamental de Orçamento do Estado para 2013 é inviável e que não vai poder ser executada. Isto, claro está, se o Orçamento chegar a ser aprovado porque o CDS, através do vice-presidente José Manuel Rodrigues, defende que o partido deve "chumbar" este Orçamento do Estado e tirar daí "todas as consequências políticas". A ver vamos ...

Mas esta apresentação do OE permitiu-nos assistir, uma vez mais, às tiradas peculiares (surpreendentes e um pouco demagógicas) de Vítor Gaspar. Ainda há dias na Assembleia da República afirmava:
 
"o povo português revelou-se o melhor povo do mundo e o melhor activo de Portugal".
Agora, saiu-se com esta:
"O país investiu muito na minha educação, durante algumas décadas, e é minha obrigação estar disponível para retribuir. A minha permanência [no Governo] dependerá da utilidade que ela [a minha educação] terá para a República".
Perante isto, e independentemente do Orçamento passar ou não, só podemos dizer ao Ministro Gaspar que estamos todos muito "AGRADECIDOS"!
 
 

terça-feira, outubro 16, 2012

Na manifestação do dia 15 de Setembro faltava lá um cartaz!


Fez ontem um mês que eu participei na manifestação do 15 de Setembro, em Lisboa. Éramos muitos milhares a desfilar pelas ruas, a entoar palavras de ordem e cânticos contra o Governo, contra alguns (quase todos os) Ministros, contra a troika, contra o desemprego, contra, afinal, o assalto aos nossos bolsos e à degradação das condições de vida e à falta de perspectivas.

Eram muitos os braços no ar, como muita era convicção de que "o povo unido jamais será vencido", como muitos eram os cartazes e faixas que exprimiam o sentir (desesperado) de quem se sente no limite.

E, como digo, cartazes eram muitos. A troika, evidentemente, era um dos temas mais em destaque. Porém, não vi um só cartaz contra os carteiristas que assaltaram um dos elementos da troika a residir em Lisboa desde Outubro do ano passado.

E não posso deixar de referir o assunto porque não me parece justo andarmos sempre a dizer que a troika anda a meter a mão nos bolsos dos portugueses (e anda) e quando o representante do FMI,
o austríaco Albert Jaeger, que andava a passear pela capital, ficou sem a carteira no eléctrico 28, vá de batermos palmas de contentes e acharmos que foi bem feito. Quase como que a dizer "até que enfim, um português foi ao bolso da troika" ou "o eléctrico da carreira 28 entrou no mundo da alta finança mundial".

É que não pode haver dois pesos e duas medidas ...
 
 

segunda-feira, outubro 15, 2012

Acordai


 
"Acordai" é um poema do escritor e poeta português José Gomes Ferreira (1900 - 1985), que foi musicado por Fernando Lopes-Graça (1906 - 1994), um dos maiores compositores portugueses do século XX.

"Acordai" é, também, uma “canção heróica” e - hoje - uma das bandeiras dos muitos milhares de descontentes em Portugal.

E será bom que os políticos acordem de vez. É que, como dizia o ex-Presidente Jorge Sampaio numa entrevista à SIC Notícias, "a austeridade rebenta com o país. Há um caminho que pode deslizar para um certo desespero".
 
 
Acordai
acordai
homens que dormis
a embalar a dor
dos silêncios vis
vinde no clamor
das almas viris
arrancar a flor
que dorme na raiz

Acordai
acordai
raios e tufões
que dormis no ar
e nas multidões
vinde incendiar
de astros e canções
as pedras do mar
o mundo e os corações

Acordai
acendei
de almas e de sóis
este mar sem cais
nem luz de faróis
e acordai depois
das lutas finais
os nossos heróis
que dormem nos covais
Acordai!

 

sexta-feira, outubro 12, 2012

Como se educa uma criança




Conhecem, certamente, aquela história de um homem que tinha sete teorias sobre como educar os filhos. Depois, teve sete filhos e ficou sem teoria nenhuma.

Pois é! Convenhamos que educar crianças não é fácil. E por uma série de razões que vão desde a falta de aptidões para a tarefa dos próprios educadores (pais e/ou outros) às características específicas de cada criança. Ainda por cima elas não vêm com um manual de instruções e continua a não existir regras uniformes de aplicação à totalidade dos miúdos. Acaba por ser um pouco “cada caso é um caso”.

Por isso não resisti a partilhar convosco uma cena a que assisti num restaurante. A criança, com um ou dois anos de idade muito irrequietos, almoçava à mesa com a família. De repente (e isto com as crianças é mesmo de repente), dá-lhe uma birra daquelas e desatou num berreiro danado. Provavelmente o sono estava ali para as curvas e vá de chorar que não havia chucha que o calasse. O pai levantou-se de um salto, arrancou o miúdo (arrancou-o da cadeira, literalmente), sem qualquer delicadeza e zás, encostou-o a uma parede do restaurante de cara voltada para a dita. O berreiro continuou forte por mais uns escassos minutos e a criança manteve-se sempre na posição em que fora “plantada” sem que os demais lhe ligassem peva. De súbito, o choro parou, o miúdo (ainda na mesma posição) voltou a cabeça para a sala do restaurante e a sua carinha bonita e os olhos maravilhosos, aparentavam uma calma como nada se tivesse passado. O pai pegou nele e voltou a colocá-lo no seu lugar à mesa. O almoço continuou e toda a família pôde terminar a refeição em paz.
 
 

quinta-feira, outubro 11, 2012

Um novo consultor em perspectiva?




Vi numa reportagem de televisão um "ignorante" cidadão da Guarda afirmar que os helicópteros que combatiam os fogos que lavravam incontroláveis por várias frentes, teriam mais eficácia se tivessem outros pontos de abastecimento mais próximos. Dizia, em tom humilde "É que, enquanto vão e voltam, demoram vinte minutos e quando chegam já se reacendeu o que tinham apagado. E temos tanta água por aqui...".

 
Nessa altura não pude deixar de pensar nos versos de António Aleixo:

"Há tantos burros mandando em homens de inteligência, que, às vezes, fico pensando que a burrice é uma ciência".

 
A sabedoria está em arranjar soluções simples e viáveis. Será que ninguém tinha tido uma ideia tão óbvia? Não tarda que vão buscar o desconhecido cidadão da Guarda para consultor do órgão a quem cabe a responsabilidade de combater os fogos. E se calhar, bem ...
 
 

quarta-feira, outubro 10, 2012

Porque razão hei-de acreditar desta vez?



Corria o ano de 2003 e Passos Coelho era consultor da Tecnoforma, empresa que, nesse ano, recebeu 82% do valor das candidaturas aprovadas pelo programa “Foral”, composto por dinheiros do Fundo Social Europeu e do Estado português, destinados à formação profissional ao nível das autarquias. Programa que era tutelado pelo então secretário de Estado Miguel Relvas. Aliás, entre 2002 e 2004, 63% do número de projectos aprovados a privados foram para a mesma empresa.

Coincidência, ou não, Miguel Relvas fazia parte do governo de Durão Barroso, Paulo Pereira Coelho o seu gestor na região Centro, Pedro Passos Coelho consultor da Tecnoforma, João Luís Gonçalves era sócio e administrador da empresa e António Silva era director comercial e vereador da Câmara de Mangualde. Todos eles eram destacados dirigentes da JSD ou deputados do PSD.
 
Passos Coelho nega que houvesse quaisquer favorecimentos. Mas porque razão hei-de acreditar agora no Primeiro-Ministro se já lhe ouvi afirmações como:

"acabar com 13º mês? isso é um disparate"; "posso garantir que não será necessário em Portugal cortar mais salários nem despedir gente para cumprir um programa de saneamento financeiro no Estado Português"; "aquilo que o primeiro-ministro (Sócrates) nos acusou foi o de querer acabar com o IVA intermédio da restauração (13%). É absolutamente falso"; "nós não devemos aumentar os impostos"; "a política de privatizações em Portugal será criminosa se visar apenas vender activos ao desbarato para arranjar dinheiro" ou "não contarão connosco para mais ataques à classe média em nome dos problemas externos" ... e por aí adiante ...
e sabemos que tudo isso era mentira?
Bem pode negar, veementemente, Passos Coelho. Mas lá que desconfiamos, desconfiamos.
Ainda no sábado, Nuno Amado, Presidente do BCP, dizia ao Expresso:
"um dos problemas de Portugal chama-se "Amiguismo".
 
 
 

terça-feira, outubro 09, 2012

Um assalto à mão armada


Quando, em criança, me faziam a velha pergunta "Então, o que queres ser quando fores crescido?" nunca me imaginei ser cowboy nem a viver no faroeste entre índios e duelos ao pôr-do-sol. Os meus objectivos eram mais próximos e mais ingénuos. Queria ser apenas revisor dos caminhos de ferro ou jogador de hóquei em patins.

Afinal, e tantos anos mais tarde, cá estou no tal faroeste (em Portugal) onde os bandidos (o Governo) "assaltam" sem piedade os trabalhadores e os índios (também os do Governo e os seus impiedosos consultores) "matam" a classe média e lhes tiram cruelmente o respectivo escalpe.

E este estado de coisas chegou a um ponto que até já é repudiado por muitos dos apaniguados dos partidos da coligação que está no poder. Marques Mendes, conselheiro de Estado e ex-presidente do PSD, classificou estas últimas medidas de austeridade como um "assalto à mão armada aos contribuintes. Isto é um assalto fiscal. Não é um agravamento fiscal, nem um aumento fiscal enorme como dizia o ministro das Finanças, isto é uma espécie de assalto à mão armada ao contribuinte".

Ainda por cima, feito "ao melhor povo do mundo", como disse Vítor Gaspar. Ao melhor e ao mais paciente, digo eu.
 
 
 

segunda-feira, outubro 08, 2012

O país está às avessas


O facto da bandeira de Portugal ter sido hasteada de pernas para o ar pelo Presidente Cavaco Silva, na varanda do Município de Lisboa, no início das comemorações do 5 de Outubro, não teria uma importância por aí além (pese embora a bandeira nacional seja um símbolo da Pátria e com os símbolos há que ter todos os cuidados), não fosse o facto da situação miserável em que o país se encontra.

Se, noutros tempos, em termos militares, a bandeira virada ao contrário já significou território ocupado, a bandeira agora hasteada pode perfeitamente ser o sinal da “invasão económico/financeira do país" por aqueles que são os nossos credores.

Houve mesmo quem afirmasse "É o estado do país". E a analogia é capaz de fazer sentido. A bandeira ao contrário, pode "traduzir" o desespero e a falta de esperança de um povo que não consegue vislumbrar uma luzinha que seja ao fundo do túnel.

E num gracejo (mesmo nos piores momentos há sempre quem ainda consiga ter algum humor), houve quem dissesse que a tal falta de luz no final do túnel se deveu ao facto de já nem sequer haver dinheiro para pagar a electricidade. Cá para mim, no entanto, o episódio da bandeira não passou de uma vingançazinha de alguém por este 5 de Outubro ser a última vez que foi feriado no nosso país.
 
 
 

quinta-feira, outubro 04, 2012

Entre a raiva e a esperança



Hoje lembrei-me da pergunta clássica “tenho duas notícias, uma boa e uma má, qual queres saber primeiro?”.

Já que posso escolher, começo pela que me dá uma raiva dos diabos. A que tem a ver com a descarada discrepância que se verifica entre o que a quase extinta classe média entrega ao Estado, qualquer coisa como 70% dos seus rendimentos (entre impostos directos e indirectos) e aquilo que é despendido por quem vive do rendimentos do capital que coloca ilegalmente no exterior e que paga uma reduzida taxa de 7,5% para o legalizar, podendo continuar a mantê-lo lá fora com todo o descanso. Acho isto uma obscenidade, apesar do Estado, com este expediente, ter conseguido recolher cerca de 258 milhões de euros .

Por contraponto, o que me transmite alguma esperança nos homens e no futuro foi a o facto de, perante a notícia de que a Fundação “O Século” (que desde 1927 organiza colónias de férias para crianças carenciadas) deixar de poder continuar a desenvolver este trabalho meritório já a partir deste ano devido a dificuldades financeiras, ter havido um empresário da indústria farmacêutica – Paulo Paiva dos Santos – que em 35 segundos decidiu doar 100 mil euros para que a Fundação "O Século" possa, em 2013, voltar a acolher os miúdos. Um belo exemplo de solidariedade.

quarta-feira, outubro 03, 2012

Falando de Fundações




Dado que muitos dos meus Amigos ainda estão de boca aberta com a quantidade de Observatórios que existem em Portugal, e que aqui vos dei conta em 25 de Setembro último, decidi voltar ao tema "onde se gasta o nosso dinheirinho sem que haja utilidade visível", desta vez para falar de Fundações. Instituições que, de resto, não se sabe bem quantas existem. Há quem diga que são umas quantas centenas, mas já ouvi falar em 1 100.

O curioso é que o Governo prometeu que ia acabar com quem anda a receber indevidamente milhões do Estado (as tais gorduras do Estado) e, afinal, parece que só vai extinguir três Fundações e reduzir os subsídios a umas quantas mais, não se conhecendo exactamente quais são, e com que critérios o vai fazer. E ainda há um outro problema, é que mais de um terço das Câmaras Municipais não acata a proposta de extinguir Fundações.
 
Mas a questão de fundo é a seguinte: para que servem as Fundações? Há quem jure que não recebem verbas do Estado mas, então, porque é que tantas dessas Fundações ameaçam acabar com a actividade se houver cortes de subsídios? E porque precisam de ser Fundações?

Pessoalmente, gostaria que me dissessem para que servem e quanto dinheiro sai do Orçamento Geral do Estado para Instituições como, por exemplo:
 
- Fundação Cronse para a Pesquisa Religiosa;
- Fundação Lapa do Lobo;
- Fundação LMCE - Lisboa Mais Bela Cidade da Europa;
- Fundação Mister Freedman;
- Fundação Work Deaf World;
- Fundação Lar do Emigrante Português no Mundo;
- Fundação da Obra Social das Religiosas Dominicanas Irlandesas;
- Fundação de Ensino e Resposta a Desastres;
- Fundação para a Preservação da Cultura Tibetana;
- Fundação Austronésia Borja da Costa; ou
- Fundação Ajuda à Igreja que Sofre.
 
Não me passa pela cabeça pôr em causa a utilidade de qualquer das Fundações. Mas gostava que se fizesse um trabalho sério e criterioso que premiasse apenas as Fundações que têm realmente utilidade pública. Quanto às outras ...
 
 
 

terça-feira, outubro 02, 2012

Racionar ou racionalizar?



Senti-me desconfortável com o parecer do Conselho de Ética para as Ciência da Vida que sugere racionar os medicamentos para o tratamento de cancro, SIDA e doenças reumáticas. Ao que percebi - e muitos outros entenderam exactamente o mesmo - os doentes poderão deixar de ser tratados ou, na melhor das hipóteses, serão tratados com medicamentos muito mais baratos (e não sei se com a mesma eficácia) em vez daqueles que, em princípio, seriam os adequados. Tudo, claro está, por razões de natureza economicista. Devo confessar que me custa aceitar a medida. Acho-a desumana.

E quem é que vai decidir o tal racionamento? Os economistas e gestores que estão apenas preocupados com os números do balanço e não conseguem perceber que o que está em causa são as pessoas? Quem vai perguntar aos doentes (se é que eles têm alguma palavra na matéria) se querem prescindir de viver mais uns meses? Afinal, na perspectiva de um gestor, o doente mais barato é o doente morto.

Vão faltando pessoas que saibam o que digam ou que, no mínimo, saibam exprimir exactamente o que querem dizer. Como parece ter sido caso (afirma agora um membro do tal Conselho de Ética), uma vez que usaram a expressão "racionar" em vez de "racionalizar", o que tem um significado completamente diferente.

Vivem-se hoje tempos muito difíceis em que o dinheiro escasseia e há escolhas que têm que ser feitas. Compreendemos que alguns medicamentos possam atingir os 500 mil euros por doente e por ano e, por isso, será razoável que se utilizem medicamentos mais baratos se, os mesmos, conseguirem atingir - mais ou menos - os mesmos fins. Mas, o Conselho de Ética, a gestão dos hospitais e o poder político, têm que assegurar, no mínimo, aquilo que foi dito pelo Professor Daniel Serrão:

“Está em causa a substituição do óptimo pelo bom. Não é do óptimo por nada".


 

segunda-feira, outubro 01, 2012

A Arrogância



Eu não gostei, os empresários não gostaram, muitos militantes e responsáveis do PSD e do CDS também não gostaram e, acho eu, que ninguém de bom-senso deve ter gostado de ouvir o conselheiro do primeiro-ministro para as privatizações - António Borges - dizer a uma plateia de empresários portugueses e estrangeiros:

“Que a medida (TSU) é extraordinariamente inteligente, acho que é. Que os nossos empresários, que se apresentaram contra a medida, são completamente ignorantes, não passariam no primeiro ano do meu curso da faculdade, isso não tenham dúvida”.

Uma arrogância desmedida!
 
É que é inacreditável como os nossos empresários, de tão burros que são, não conseguiram compreender esta "medida extraordinariamente inteligente", saída da cabeça iluminada de António Borges. Os tais empresários burros que são (na maioria) gente esforçada, que cria emprego e gera riqueza. E é, também, inacreditável que sendo uma medida de tamanha qualidade ela não tenha sido posta em prática pelo Governo.
O Presidente da CIP, António Saraiva, respondeu de pronto:
“Se tivéssemos que reagir emotivamente a estas declarações de António Borges (que foram infelizes e excessivas), se calhar a maioria dos empresários portugueses também não o contrataria, não passaria na selecção dos recursos humanos das empresas, porque só tem um determinado conhecimento e não tem uma visão alargada”.
Mas a reacção com a qual mais me identifiquei foi a de Daniel Oliveira que escreveu:

"Pior do que um idiota é um idiota atrevido. Pior do que um idiota atrevido é um idiota avençado".
Contudo, não nos esqueçamos que António Borges - que é "apenas" um contratado (a quem pagamos muito bem), não faz parte do Governo e não foi eleito por nenhum de nós - tem o poder de aconselhar/decidir a forma como as nossas principais empresas vão ser desbaratadas. A exemplo do que já aconteceu com outras recentes privatizações. A não ser que alguém tenha a coragem de o mandar embora rapidamente.