quinta-feira, fevereiro 20, 2014

Fernando Tordo, mais um emigrante



Só o tempo o dirá se Fernando Tordo, aos 65 anos, fez bem em emigrar. Disse o cantor e autor que já não tem condições para trabalhar no nosso país. Tal como muitas centenas de jovens e menos jovens que não veem outra solução do que se fazer à vida noutras paragens, Tordo partiu desiludido.


Sou grande admirador de Fernando Tordo enquanto artista e acho que ele é um homem inteligente. Mas, preocupado como estava, é capaz de se ter precipitado. Pelo menos é aquilo que eu deduzo quando nos últimos dias ouvi os nossos governantes regozijarem-se com a retoma da economia, com o "milagre económico" como lhe chamaram.


Alegria provavelmente sustentada pelo insuspeito Financial Times que apontou Portugal como o "herói-surpresa" da zona euro. O que deixou surpresos os portugueses que estavam a milhas de imaginar tamanhos sucessos. Suspeitávamos inclusive que os enormes esforços que temos vindo a fazer nos três últimos anos não tinham servido para nada. Até por que, apesar da anunciada recuperação da economia, da esperada saída da troika "à irlandesa", nós comuns cidadãos - quais profetas da desgraça - continuamos com os bolsos vazios e sem saber o que fazer à vida.


Talvez por isso Miguel Sousa Tavares na última 2ª feira no telejornal da SIC tenha sugerido que os jornalistas do Financial Times tenham escrito a matéria sem saírem do aeroporto. Não viram, não sentiram a realidade dos portugueses, o seu dia-a-dia. Se calhar nem se aperceberam, isto agora digo eu, a quantidade de portugueses, novos emigrantes, que estavam à espera de apanhar um avião apenas com um bilhete de ida.


Admiro a coragem de Fernando Tordo e desejo-lhe as maiores felicidades. Mas tenho a esperança de que no avião que o levou até ao Brasil tenha tido a oportunidade de ler o Financial Times a opinar como Portugal é o "herói-surpresa" da Europa. Pode ser que, assim, volte depressa para nós, com uma mala na mão e uma guitarra debaixo do braço. Tal como partiu.



segunda-feira, fevereiro 17, 2014

A Criatividade de Assunção Esteves




Recordo, amiúde, a frase de Eça de Queiroz "Os políticos e as fraldas devem ser mudados frequentemente e pela mesma razão". E lembro-me dela tantas vezes porque os políticos, de uma forma geral, dão bons motivos para isso.


Já aqui tenho demonstrado a minha perplexidade perante algumas intervenções de Assunção Esteves, Presidente da Assembleia da República e segunda figura do Estado. Dignas, a maior parte delas, de políticos menos capazes ou em início de carreira. Ainda não há muito, quando Eusébio faleceu, Assunção Esteves mostrou grande inabilidade nas palavras que proferiu. Agora foi a vez de manifestar a sua veia criativa, mas desadequada, ao sugerir não uma mas duas "ideias geniais" para a comemoração do 40º aniversário do 25 de Abril.


A primeira foi quando propôs que os custos com a dita comemoração fossem suportados por empresas, ao abrigo da lei do mecenato. Claro que a proposta criou mal-estar nas bancadas que rejeitaram a possibilidade de empresas privadas financiarem comemorações estatais.


A outra ideia brilhante foi a de ornamentar chaimites com cravos criados por Joana Vasconcelos. Obviamente que também não teve acolhimento por parte dos deputados, tanto mais que a despesa sairá do orçamento da Assembleia da República e cada cravo vermelho (em crochet) da artista custaria cinco mil euros.


Mais uma vez Assunção Esteves não foi feliz nas palavras e nas ideias. Mas, convenhamos, com ideias destas ...



sexta-feira, fevereiro 14, 2014

E os sacrifícios são suportados por quem?



Na sequência do texto que aqui publiquei ontem, recordo o recente relatório do Banco de Portugal que afirma, inequivocamente, que "no combate ao despesismo e ao excesso de dívida iniciado em 2010, apenas as famílias apertaram verdadeiramente o cinto".

Esta é a verdade nua e crua. Enquanto o Estado e as empresas aumentaram a dívida - a Administração Pública aumentou a dívida em 99,5 mil milhões de euros e as empresas em 7,4 mil milhões - os particulares cortaram 19,4 mil milhões de euros, dos quais 11,7 mil milhões em crédito ao consumo e outros fins que não habitação.

E é incrível como o tão falado "ajustamento" - certamente necessário num país onde (diziam) se vivia muito acima das possibilidades - se tenha feito por via do esforço das pessoas, das famílias e, também, de muitas empresas, enquanto que a contribuição do Estado foi nula, apesar do brutal aumento de impostos e das medidas altamente penalizadoras para os cidadãos, sobretudo com o corte de salários e pensões.

Todos sabemos isto mas não é demais lembrá-lo.



quinta-feira, fevereiro 13, 2014

O pessoal não chegava para tanta trabalheira ...



Nem queria acreditar quando li no jornal "i"a notícia: "Passos Coelho contratou uma empresa, em regime de outsourcing, para assegurar o atendimento telefónico na residência oficial do Primeiro-Ministro por 25,1 mil euros. Isto apesar de ter no seu gabinete dez secretárias pessoais, nove auxiliares, e 12 pessoas a prestar apoio técnico-administrativo em São Bento.


O contrato, assinado no dia 6 de Dezembro com a empresa We Promote - Outsourcing e Serviços, Lda. mas só publicado no dia 5 de Fevereiro no portal Base dos contratos públicos, inclui "designadamente as funções de atendimento telefónico, gestão, registo e encaminhamento de chamadas".

E este já é o terceiro contrato celebrado pelo gabinete do Primeiro-Ministro com a empresa. O primeiro foi assinado no dia 4 de Fevereiro de 2012 por 10,4 mil euros e o segundo foi celebrado a 15 de Janeiro de 2013 por 12,5 mil euros. A justificação para adjudicar directamente com esta empresa foi sempre a mesma: "ausência de recursos próprios".


Assim se percebe melhor como é árduo o trabalho do Primeiro-Ministro. Apesar das dez secretárias, dos nove auxiliares e dos 12 administrativos a trabalhar na residência oficial, ainda assim os telefones não param de tocar em São Bento. Só não sei - e aqui é minha costela maledicente a questionar - é se tanto tráfego é resultante do pedido de "jobs para os "boys"" ou se há para aí muita gente a não estar contente com as políticas aprovadas por este governo.


Mas, a confirmar-se que era absolutamente necessário arranjar mais gente para atender os telefones, gostava que me explicassem por que não aproveitaram os funcionários "colocados" (e desaproveitados) no grupo da mobilidade especial e tiveram que recorrer a uma empresa externa.

Enfim, lá teremos que pagar mais 25 mil euros. É a vida! 



quarta-feira, fevereiro 12, 2014

"Espatifam-se" mas não aprendem ...



Fico com uma urticária dos diabos quando vejo que certos erros que se cometem no passado se repetem mais tarde sem que deles se tenham tirado as devidas ilações. Costuma dizer-se, sobretudo em relação aos mais jovens, que é preciso baterem com a cabeça na parede para aprenderem. Se calhar não! Também é comum apregoar-se que o tempo dá a experiência e, esta, o ensinamento. Se calhar também não!


E a provar que não, vejam os esquemas que prometem às pessoas ganhos enormes de dinheiro sem que, para isso, elas tenham que fazer grande esforço. Como acontece, por exemplo, nos golpes de "pirâmide" que têm aparecido muito nos últimos anos, todos eles a seduzir milhares de pessoas que se propõem ganhar dinheiro fácil. Basta recordar o caso da "D. Branca". O que é que aconteceu? Os primeiros a entrarem claro que se safaram, recuperaram o que investiram e ainda ganharam muito mais mas, para os que só apanharam o comboio em andamento, esses perderam o dinheiro que lá puseram. E aprenderam a lição? Acho que não, pois na "pirâmide" seguinte eles lá estavam de novo.


Agora o que está a dar é o TelexFree. Na Madeira, por onde a marosca entrou cá em Portugal, há já milhares de pessoas convertidas ao negócio, incluindo funcionários públicos, professores, políticos, advogados, militares e polícias. Na ânsia de ganhar no mínimo de 20 a 100 dólares por semana, a rapaziada atirou-se de cabeça - alguns a tempo inteiro e a ganhar milhares de euros por mês - e sonham com um futuro promissor que não acabará nunca.


A Deco e Polícia Judiciária aconselham prudência. Em países da América do Sul já há investigações judiciais. Eu limito-me a recordar o que disse um "insuspeito banqueiro", ex-Presidente do BPP, João Rendeiro - um fulano que foi acusado de burla qualificada, sobre os seus clientes de um esquema que montou - "os lesados sabiam do risco que corriam e são o exemplo acabado da cupidez". Para bom entendedor ...



segunda-feira, fevereiro 10, 2014

A "Factura da Sorte" ou a suprema ironia



Esta última semana não se ouviu falar de outra coisa que não fosse o mau tempo que tem assolado o país. Do que tem estado e do que nos vai afectar nos próximos dias. Também se falou, e muito, das praxes universitárias e dos quadros do Miró que o Governo teima em vender e que a oposição insiste em que fiquem por cá. Quanto a este último tema, que ainda vai fazer correr muita tinta, fiquei com a ideia de que, afinal, quem vivia acima das possibilidades eram o Oliveira e Costa e o BPN que compraram aquela colecção do pintor. Mas isso são contas de outro rosário ...


Também se falou muito nesta última semana, e com grande excitação, no sorteio que dá pelo nome de "Factura da Sorte". Sobretudo por parte do Governo que julga ter encontrado a forma de acabar com a fuga aos impostos. Já aqui manifestei a minha opinião sobre essa esperteza saloia de pôr os contribuintes a fazer conta que são fiscais do Fisco. É a maneira mais fácil, eu sei, mas não concordo com isso e acho mesmo que o Estado fica mal na fotografia.


Mas o que hoje quero salientar nesta medida do Governo que alicia os cidadãos a pedir facturas, nem que seja de 1 cêntimo, é que o prémio é um valente automóvel de gama média/alta. E aqui o meu desacordo não podia ser maior. Se querem mesmo "dar" uns popós (porque deve haver outras razões para além da caça à economia paralela) então, em vez de um carrão, por que não sorteiam dois ou três carros mais baratos? Por um lado, mais contribuintes seriam premiados e, por outro, a manter-se o esquema previsto, estou a imaginar que o sortudo que vai receber um BMW ou outro do género, vai arranhar-se todo a pensar como vai pagar seguros, selo do carro e revisões que são, obviamente, muito mais caros.


Porém, só a ideia do Estado promover tais sorteios já me deixa arrepiado. É como que uma versão moderna do Major Valentim Loureiro a dar electrodomésticos para as pessoas votarem nele. Se pretendem mesmo que os contribuintes peçam facturas para que a receita fiscal cresça, não seria mais avisado que o valor do IVA das facturas fosse dedutível no IRS?


E depois, não acredito que, passada a euforia dos concursos fiscais, os portugueses continuem a pedir facturazinhas por dá cá aquela palha.


Mas quanto ao anunciado concurso, acho muito curioso que o mesmo Governo que condenou o povo por excesso de consumo - de viver acima das suas possibilidades, lembram-se? - venha agora sortear carros de luxo. É a suprema ironia, não acham?



sexta-feira, fevereiro 07, 2014

Autodefinição de Óscar Niemeyer



Oscar Ribeiro de Almeida Niemeyer Soares Filho (1907 - 2012) foi um arquitecto brasileiro, uma das principais figuras da arquitectura moderna e um dos maiores da sua geração.

Niemeyer destacou-se pelo uso das formas abstractas e pelas curvas que caracterizam a maioria das suas obras. Daí ter escrito nas suas memórias:

"Não é o ângulo recto que me atrai, nem a linha recta, dura, inflexível, criada pelo homem. O que me atrai é a curva livre e sensual, a curva que encontro nas montanhas do meu país, no curso sinuoso dos seus rios, nas ondas do mar, no corpo da mulher preferida. De curvas é feito todo o universo, o universo curvo de Einstein.

Mas, para além de génio da arquitectura, Oscar Niemeyer era também um poeta.



de Óscar Niemeyer


Autodefinição




Na folha branca de papel faço o meu risco.

Rectas e curvas entrelaçadas.

E prossigo atento e tudo arrisco na procura das formas desejadas.

São templos e palácios soltos pelo ar, pássaros alados, o que você quiser.

Mas se os olhar um pouco devagar, encontrará, em todos,

os encantos da mulher.

Deixo de lado o sonho que sonhava.

A miséria do mundo me revolta.

Quero pouco, muito pouco, quase nada.

A arquitectura que faço não importa.

O que eu quero é a pobreza superada,

a vida mais feliz, a pátria mais amada.





quinta-feira, fevereiro 06, 2014

“Não consigo criticar nada em Portugal" ... disse a jornalista



É bom ouvir alguém contrariar as más notícias com que os telejornais nos invadem as casas durante o tempo todo. Reconforta a alma ouvir dizer que "Portugal é o maior e que não encontra uma coisinha sequer que seja passível de crítica". Pelo menos é isso que pensa Fiona Dunlop, jornalista da CNN, muito embora ela só estivesse em Lisboa e falasse sobre Portugal. Um deslize que não ensombra a mensagem ...


Eu sei que Lisboa está na moda, foi até eleita recentemente como uma das cidades mais “cool” da Europa, a melhor para se passar umas mini-férias. Mas destacar só as vistas fantásticas da capital, o rio Tejo, a arquitectura, o magnífico peixe que por cá comeu e um treinador (Mourinho) que é muito famoso, parece uma análise um pouco redutora para uma jornalista que devia ter dado igualmente atenção a outros factores. Mas Fiona realçou também o optimismo dos portugueses que, face às dificuldades por que têm passado, esperava ver deprimidos o que, afinal, não aconteceu. Na entrevista à Renascença, a jornalista concluiu: "não consigo criticar nada em Portugal”. Ainda bem. É uma querida.


Porém, falou sobre o Mourinho mas esqueceu-se do Ronaldo e não se referiu à espantosa luminosidade alfacinha nem - e isso é crime de lesa-majestade - aos pastéis de Belém ou ao Benfica. Para uma jornalista é imperdoável ter esquecido estes "detalhes".


Mas Fiona também não viu os muitos buracos "plantados" nas ruas da cidade. Ruas em linha recta que se percorrem em ziguezagues para os carros não caírem neles. Também não deu pelos jardins públicos mal frequentados ou pelos passeios cheios de cocós de cães que os donos se esqueceram de apanhar. Não reparou nas casas fechadas, inabitadas e a cair e nas lojas que estão encerradas, umas a seguir às outras, num cenário desolador. Não ligou igualmente aos muitos carros estacionados em cima dos passeios que impedem os cidadãos de circular livremente. E, inexplicavelmente, não falou nos inúmeros grafites que sujam tudo o que é parede ou paragem de transporte público (há, felizmente, muitas excepções), rabiscos sem qualquer cariz artístico, que são apenas meros actos de vandalismo público. E ela também não se apercebeu dos sem-abrigo que vagueiam pela cidade e que, à noite, se estendem por onde podem.


Não acredito que a jornalista não se tenha apercebido desses pormenores, acho é que ela quis ser gentil connosco. Contudo, numa coisa Fiona Dunlop esteve certíssima: Lisboa é mesmo linda!



terça-feira, fevereiro 04, 2014

A colecção de Miró "herdada" do BPN



Já foi há uns anos. Lembro-me que parámos um pouco junto à Catedral de Barcelona e, ao olhar para uma banca de venda de serigrafias de artistas conhecidos, centrámos a nossa atenção sobre um quadro de Miró. A minha filha, então adolescente mas desde sempre virada para as artes, falava entusiasmada da obra do artista perante a minha manifesta insensibilidade que apenas conseguia visualizar nos quadros do pintor surrealista catalão riscos que poderiam ter sido feitos por crianças de uma pré-primária.


A "discussão" arrastou-se pelo dia inteiro e, apesar da argumentação da filha, não me deixei seduzir pelo traço de um pintor e escultor que foi mundialmente famoso.


Porém, de repente, Joan Miró fez-me despertar. Não que eu tivesse começado a apreciar o seu traço, mas por que, como cidadão, acho questionável a venda das 85 obras do artista, uma das coisas que nos ficaram daquele elefante branco chamado BPN. Venda que, em princípio, vai acontecer hoje e amanhã num leilão promovido pela Christie's, em Londres.


Eu sei que a arte não é um mero activo financeiro mas sei também que o Estado precisa de dinheiro como de pão para a boca e, como habitualmente, dispara em qualquer direcção para sacá-lo. E como viu uma boa oportunidade de vender umas pinturas, desenhos, colagens e guaches de um artista que não sendo de topo é, em todo o caso, reconhecido internacionalmente, vá de pô-los a jeito dos coleccionadores mais endinheirados. Na perspectiva, claro está, de vir a embolsar entre 35,9 e 80 milhões de euros.


Ao que parece esta manobra "atropela" a Lei de Bases do Património Cultural mas, para além disso, a colecção tem, efectivamente, um valor apreciável do ponto de vista artístico e cultural. E é aqui que está o busílis. Será aceitável esta venda para recuperar algum dinheiro do muito que, nós contribuintes, enterrámos na nacionalização (e, depois, na privatização) do BPN? Ou, será mais ajuizado mantermos a colecção de Miró em Portugal como uma mais-valia para a nossa cultura e como pólo de atracção turística, muito embora a indemnização que teríamos que pagar à Christie's (por transportes e seguros) ainda fosse de alguns milhões de euros? Terrível dúvida esta.


Que saudades daquele dia longínquo em que, junto à Catedral de Barcelona, eu e a minha filha discutíamos a arte de Joan Miró.


segunda-feira, fevereiro 03, 2014

"E o burro sou eu?" - onde se divaga sobre o perdão fiscal do Governo




Confesso publicamente que, de há muito, não me tenho em grande conta. E a "culpa", provavelmente, devo-a aos meus pais que me transmitiram valores como a honradez que diziam ser fundamentais numa pessoa de bem. Talvez por isso insisto em pagar a tempo e horas as contas da luz, da água, do gás, dos seguros, do condomínio, do IMI e de tudo o resto que um qualquer cidadão tem a obrigação de pagar. Assim como deve ter sido por causa desses valores que sempre cumpri todas as minhas responsabilidades fiscais mesmo antes do fim dos prazos. Enfim, de uma forma estranhamente parva, nunca fiquei a dever a quem quer fosse. Podia refilar, insurgir-me, dizer mal da vida mas pagava.


Por isso, quando soube que o nosso querido Governo decidiu fazer uma coisa a que chamou "perdão fiscal", senti-me completamente abazurdido. Por outras palavras, achei-me uma completa besta quadrada.


E senti-me dessa forma por ter dificuldade em perceber que àqueles que não pagaram os seus impostos nas datas indicadas, tão-pouco os juros de mora pela falta de pagamento, o Estado os tenha ajudado, arranjando-lhes um modo suave de pagamento (prestações baixinhas, com juros simbólicos e em muitos anos) ou, simplesmente, os tenha incluído no lote dos que beneficiaram do tal perdão fiscal. Então e eu? Então e nós que temos a mania de que as responsabilidades são para serem levadas a sério, o que é ganhámos com isso? Onde ficou a igualdade de tratamento entre cidadãos? É que não ouvi ninguém reclamar contra isso, nem sequer ouvi uma palavra do Tribunal Constitucional.


Claro que os devedores - perdão, os espertos - ganharam com isto. Mas, ao que parece, o Estado também encaixou 1,3 mil milhões de euros. Afinal, antes receber esse dinheiro do que correr o risco de não receber nenhum. Mas, ainda assim, gostaria de saber, tal como o líder do maior partido da oposição, quanto dinheiro foi perdoado aos contribuintes no processo de regularização de dívidas ao fisco. Quanta massa é que, se tivéssemos num país a sério, o Estado teria ido buscar se obrigasse os cidadãos a pagar a que realmente deviam? Como sublinhou António José Seguro "o perdão aplicou-se não apenas aos contribuintes com dívida, mas também aos que, tendo já pago a dívida, tinham ainda em falta apenas os juros. "Há um perdão de juros para quem pagou mas também houve um perdão de 100% para quem só tinha como dívida juros de dívidas anteriores" .


Perante tudo isto, não pude deixar de pensar que se tivesse que responder à célebre pergunta de Scolari "E o burro sou eu?" diria: sim, eu sou o burro. Confesso!